Ensinar, por Espíritos Diversos
Grande Além
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Nos mais estranhos lugares do mundo, todas as pessoas trazem o passaporte
invisível para o Grande Além. O esquimó e o europeu, o hotentote e o americano
encaminham-se, diariamente, para o mesmo fim.
Em algumas antigas regiões asiáticas, a roupa velha dos viajantes, que
atravessam as fronteiras da morte, é confiada aos abutres famintos, e, nas
cidades supercivilizadas dos tempos modernos, as vestes rotas dos que demandam o
invisível são consumidas no forno crematório ou abandonadas à cinza do sepulcro.
Todos seguirão.
Testas coroadas deixam o trono e o cetro aos aventureiros; filósofos e sábios
costumam legar tesouros aos estúpidos; legisladores e estadistas entregam suas
obras aos caprichos populares; os amantes afastam-se do objeto de sua adoração,
atirando-se à grande experiência. Não valem as lágrimas da dor, nem os
argumentos da Ciência. Não prevalecem as invocações do sangue ou da condição.
Partem os algozes e as vítimas, os bons e os maus. Sócrates, condenado à cicuta,
apenas antecede os seus juízes. Dario e Alexandre, fulgurantes de armaduras,
põem-se a caminho, seguidos de todos os vassalos. Nero determina o flagelo dos
circos, aciona a maquinaria do martírio e da destruição, fazendo igualmente a
grande viagem, através de terríveis circunstâncias.
Quem escapará?
Magos de todas as épocas intentam descobrir o vinho miraculoso da eterna
mocidade do corpo físico. Desejando fugir aos imperativos: da consciência, tenta
o homem esquecer os seus títulos de imortalidade espiritual, com que receberá
sempre de acordo com as suas obras, procurando perpetuar o baile de máscaras,
onde estima a opressão e disfarça o vício. Entretanto, por mais que sonde os
segredos da Mãe Natura, descobrindo rotas aéreas e caminhos subterrâneos, não
conseguirá improvisar a invulnerabilidade dos ossos com que se materializa, por
tempo determinado, na Terra, atendendo a místicos desígnios da esfera superior.
A enfermidade segui-la-á, de perto; se persevera no desequilíbrio, a luta
vergastá-lo-á, todos os dias ; a morte espera-o, em cada esquina da precipitação
ou da imprudência. As vacilações alegres da infância exigir-lhe-ão os graciosos
ridículos do princípio e as dolorosas hesitações da velhice reclamarão dele os
detestáveis ridículos do fim.
Há sempre, em cada existência, o período de aproveitamento, onde a criatura pode
revelar-se. Alguns homens, raros embora, valem-se da ocasião para o esforço
supremo da tarefa a que foram chamados a cumprir. A maioria, como deuses caídos,
entrega-se às dissipações da prodigalidade, aproveitando o tempo de ser-viço em
banquetes de criminosos prazeres.
Do nascente orvalhado ao poente sombrio, o Sol brilha apenas algumas horas, em
cada dia do ano. Do berço risonho à sepultura tenebrosa, a vida de um homem
fulgura apenas por limitado tempo, no curso da existência que é um dia da
eternidade. Vieira faz alguns sermões e desaparece do cenário. Pasteur sofre
pela Ciência e termina a missão que o trouxe.
Todos conhecem a verdade da morte. O índio sabe que abandonará sua tribo, como o
cientista reconhece que não escapará do último dia do corpo. Todos demandarão a
pátria comum, onde o criminoso encontrará o seu inferno e o santo identificará o
céu que construiu com o sacrifício e a esperança. Nesse infinito país, existem
vales escuros de condenados e montanhas gloriosas onde respiram os justos. Há
liberdade e asfixia, luz e treva, alegria e dor, reencontro e separação,
recompensa e castigo, júbilo e tormento, novas esperanças e novas desilusões.
Ninguém ignora que haverá continuidade de lutas, modificação de aspectos,
extinção da oportunidade; no entanto, em toda parte, pulsam rígidos corações de
pedra, que reclamam irresponsabilidade e indiferença. Querem a morfina dos
prazeres fáceis, com que abreviam a morte.
De quando em quando, rajadas de extermínio cruzam a atmosfera planetária,
multiplicando gemidos de angústia e tentando acordar as almas adormecidas na
carne. Bocas de fogo precedem o bico de corvos famulentos. Jardins
transformam-se em ossuários. A realidade terrível do ódio faz cair as máscaras
diplomáticas, a fim de que os agrupamentos humanos se mostrem tais quais são.
Milhares de criaturas acorrem ao Grande Além, reconhecendo, mais uma vez, que o
sílex e a baioneta, a catapulta e a granada são filhos da mesma ignorância
primitivista, em que se mergulham voluntàriamente as criaturas da Terra, há
milênios numerosos.
Continuará o seio da vida alimentando a Humanidade sobre milhões de túmulos, e
escancarada permanecerá a porta da morte, esperando todos os seres.
Ninguém fugirá.
Mães e filhos, jovens e velhos, ricos e pobres estarão de partida, a qualquer
momento. Todos guardam o passaporte final, com que regressam ao país de que
procedem. Hóspedes temporários da carne, voltam ao lar comum, onde colherão, de
acordo com a semeadura. No pórtico, entre os dois planos, movimenta-se a
alfândega da Justiça, que confere asas divinas à consciência reta para os vôos
do cimo resplandecente e verifica as algemas pesadas escolhidas pelos criminosos
para o mergulho no precipício das sombras.
Grande Além!... Grande Além!... Onde estão na Terra os homens que te recordam?
Entretanto, na fronte de todos eles permanece o sinal de teu invisível poder!
Por: Irmão X, Do livro: Lázaro Redivivo, Médium: Francisco Cândido Xavier
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