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Estirado no leito bem cuidado coração em angústia, o médium Ramires Castro extravasava suas mágoas em sofrida oração:

“Senhor Jesus! Derrama sobre meu espírito o bálsamo dor'>consolador! Alivia, por piedade, os tormentos de minha’ma! O Espiritismo é luz bendita a inspirar-me o sagrado idealismo de viver consoante os princípios de teu Evangelho! Empolga-me o desejo de seguir teus passos, Mestre! Viver na pureza e simplicidade! Amar o semelhante! Cultivar a virtude! Mas, Celeste Amigo, o mundo é tão perverso!... Sinto-me cercado de iniqüidade, e sombras espessas ameaçam, por vezes, precipitar-me no torvelinho da perturbação... Não me compreende a esposa... não correspondem aos meus esforços os filhos... são ingratos os amigos... Nas tarefas da mediunidade esbarro em obstáculos insuperáveis, pois os companheiros não me favorecem com vibrações de simpatia e ajuda... percebo em cada um o crítico sempre pronto a considerar, intimamente, fruto de minha imaginação as mais singelas manifestações.”

Empolgado pelas próprias lamentações, na superexcitação do sentimento, continuava, banhado em lágrimas:

“Oh! Senhor! Como anseio por libertar-me das grades mundanas! Habitar planos mais altos, onde estejam erradicadas a incompreensão e a maledicência, a falsidade e a criminosa irresponsabilidade! Onde a fraternidade reine sem oposição! Que ventura não sentir o assédio das sombras nem a influência do mal escondido em alheios corações! Que alegria desenvolver as tarefas espirituais sob o amparo de coletividades sintonizadas com teu Amor!”

Perdido nestas cogitações, Ramires dormiu e, sob influência de benfeitores espirituais, seu Espírito passou a viver experiências intensas que permaneceriam registradas no resumo das imagens oníricas.

Sonhou que aportava em planeta distante, onde paisagens deslumbrantes, sem similar na Terra, faziam, o encanto de seus olhos.

— Seja bem-vindo ao nosso orbe! — disse-lhe delicado recepcionista. — Jesus, o Divino Amigo, sob cuja amorosa tutela também permanecemos, decidiu conceder-lhe a graça de viver neste mundo superior, distanciado das misérias e infortúnios terrestres.

Emocionado, incapaz de conter as lágrimas, o medianeiro prosternou-se e agradeceu ao Senhor. Agora, sim, serviria fielmente, aproveitaria plenamente suas possibilidades mediúnicas, viveria seu ideal: encontrava-se entre verdadeiros cristãos!

Ante os imperativos do aprendizado a que era submetido, esquecera familiares problemas humanos, empolgando-se com as perspectivas de aproveitamento das lições, qual aluno aplicado na escola perfeita.

Em breve, porém, desiludiu-se, e eis que, procurando o dedicado instrutor que atendia à tarefa de orientação mediúnica, externou suas queixas:

— Imploro-lhe, generoso amigo, ajuda para meu espírito atribulado. Almejo servir a Jesus nas tarefas da mediunidade, mas não creio que isso seja possível aqui. Vejo-me envolvido pelas mesmas influências desequilibrantes que me afligiam na Terra. Pensamentos confusos vibram em meu cérebro e sou assaltado por crises de angústia e desalento... Os companheiros recebem-me com aparente bondade; todavia, parecem demasiado imperturbáveis. Quando lhes relato meus problemas, sorriem, aparentando complacência, qual se estivessem diante das birras de uma criança, confundindo-me com exortações sobre o trabalho, como se eu não conhecesse suficientemente bem os meus deveres... Percebo em muitos a falsidade e a hipocrisia. Infelizmente, ainda não encontrei o clima ideal para que eu possa viver, integralmente, a mensagem cristã.

O sábio mentor ouviu, atento, enquanto Ramires, com a segurança de quem, pronuncia um’ discurso muitas vezes repetido, desfiava o rosário das queixas. Afinal, o Orientador, benevolente, tomou a palavra:

— Filho, tuas mágoas são as mesmas de quando estavas na Terra; entretanto, aqui elas não têm razão de ser. Dizes-te perturbado, ante o assédio de forças malfazejas; no entanto, em nosso orbe Espíritos encarnados e desencarnados vivem para o Bem, sem cogitações inferiores. Proclamas a incompreensão dos companheiros e usas adjetivos fortes; todavia, nestas paragens ninguém busca ventura maior que a de amar e servir. Falas de intraduzíveis amarguras íntimas, quando estagias em mundo superior onde reina, soberana, a harmonia. Não percebeste, ainda, que todos esses males são interiores e não exteriores. Permanecem dentro de ti e não no próximo ou na paisagem. Por não teres compreensão, julgas-te incompreendido... Por não cultivares a fraternidade, acreditas que te desprezam... Alimentas desajustes e imaginas que te assediam... Asilas o mal e o enxergas onde ele não existe... Buscas o ambiente ideal, mas nunca o encontrarás enquanto não o edificares no próprio coração.

Ante a surpresa de Ramires por aquelas advertências inesperadas, o mentor acentuou, delicado:

Em lugar algum do Universo, nem junto de Jesus estarás livre dos espinhos que te torturam, fruto da semeadura de desajustes e desatinos no passado distante, a não ser que te proponhas a orientar a vontade na direção do Bem verdadeiro, que não julga nem critica, não reclama nem condena, não esmorece nem desanima, não ambiciona nem exige — apenas serve! A Terra é a melhor escola para as tuas necessidades atuais. Nas mesmas regiões onde delinqüiste, mais fácil será reajustares o destino. Lá, as fraquezas de teus irmãos te alertarão quanto às próprias deficiências e seus erros ajudar-te-ão a distinguir o caminho certo. Conviverás com vitimas e verdugos do passado, muitas vezes ligado a eles pelos laços da consangüinidade, a fim de aprenderes a conjugar os verbos amar e perdoar.... E, para que sejas sempre forte e perseverante na luta, modifica a concepção de que o planeta terrestre é palco de tragédias, onde imperam o crime e o vício, e reconhece que, antes de mais nada, o mundo onde nasceste é oficina bendita de Deus, onde edificarás o futuro de bênçãos.

Sob forte impressão, ante aquelas exortações inesquecíveis, Ramires acordou. Em seus ouvidos ressoavam, ainda, como se viessem de muito longe, as últimas palavras:

Não esqueças, filho, a recomendação de Jesus: “Buscai o Reino de Deus dentro de vós!


Por: Richard Simonetti, Caso tenha ou possua, envie-nos a referência desse texto.


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