Ensinar, por Espíritos Diversos
Não acredito na virgindade de Maria
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Antes mesmo de você começar a vociferar contra mim, sugiro que
me acompanhe nos próximos três ou quatro artigos, onde procurarei fazer um
estudo sobre a origem do equívoco que verificaremos na associação do sexo ao
pecado, na elaboração de uma cultura de culpa, tendo a sexualidade como vilã.
Onde tudo para ser limpo precisava estar apartado do ato sexual.
Basearei minhas considerações nos extraordinários estudos da História de
Voltaire Shilling, buscando os seus apontamentos e me servindo sempre da Ciência
como fato gerador do conhecimento e da verdade, como instrumento de libertação,
como, aliás, o próprio Cristo vaticinara.
Controle um pouco o seu preconceito e me acompanhe.
Impressionados pela liberalidade sexual e vocação orgiástica da elite
greco-romana, ainda majoritariamente não-cristã, tendo como fundo de verificação
as tradicionais bacanais (culto pagão em comemoração ao deus Baco), geradoras de
todo o tipo de orgias, os apologistas cristãos daqueles primeiros tempos
precisavam fazer uma grande ruptura de valores sociais-pagãos, a fim deixar
bastante claro que a propositura daquela nova ordem moral (não religiosa –
registre-se) deixasse clara uma distância em relação aos deuses e ritos pagãos e
inspirados pelos solitários "homens do deserto", eremitas e anacoretas, tidos
como sábios e acima das iniqüidades humanas. Inauguram uma política de completo
repúdio ao sexo. Esse radicalismo - enfatizado pelas epÍstolas Paulinas -
acentuou-se pela prática da abstinência carnal, transformando-se num atrativo
tão forte para novos seguidores como o martírio dos crentes nas arenas romanas.
Enquanto estes davam suas entranhas para as feras devorarem, outros abandonavam
as práticas sexuais para sempre. O martírio e a castidade eram faces diferentes
da mesma moeda: demonstrar a sua conversão e evidenciar a sua força de adesão,
através do controle absoluto da sua vontade e disciplina em se buscar “o puro”.
Havia muito simbolismo atrás disso tudo. Não só a busca da perfeição atrás do
"coração simples", mas uma nova visão do ser humano, na qual ele somente poderia
se manter na pureza com que saiu das mãos do Criador permanecendo “limpo” ou
intocado.
Existia uma grande propaganda do ascetismo - uma forma peculiar de manifestar
abertamente seu protesto e desprezo pela época em que viviam, por sua excessiva
conscupsciência, sua impiedade, libertinagem e crueldade pagã. Ser asceta
significava estar acima da sujeira humana, onde tudo se escondia de maligno: Era
indispensável uma nova ordem de valores, que distinguisse o antes e o depois do
Cristo. Ainda que em nenhum momento Jesus fez qualquer menção ao sexo como
“pecado”, muito pelo contrário, deixando claro no episódio da mulher adúltera a
sua compaixão para com os que caem, desafiando, inclusive, aos que se julgavam
sem pecado a atirarem a primeira pedra.
Parte II
Propus a você no artigo anterior a me acompanhar nas digressões acerca da
leitura que o sexo passou a ter depois da partida de Jesus, apoiando-me na
História por Schilling.
Vimos que o principal motivo para se criar uma moral diferente era o de se
estabelecer uma forte ruptura com os padrões sociais pagãos tão em voga na
maioria não cristã.
Busca-se o ascetismo.
O domínio da sexualidade é comparável ao enfrentamento com as feras nas arenas
romanas.
Surge, neste momento, no entanto, um grande problema: como enfrentariam os
pregadores da nova fé a necessidade de manter um dos princípios básicos do
cristianismo aceitos na forma do "crescei e multiplicai-vos" sem considerar a
atração ou o prazer sexual?
Passam-se cerca de quatro séculos, onde a pregação era mantida, de louvação à
pureza do corpo, como reflexo da alvinescença da alma. Todavia as discussões
prosseguiam, sempre.
Tentando resolver esse conflito S. Agostinho, bispo de Hipona, no norte da
África, terminou por gerar sua doutrina sobre o casamento, o sexo e a privação
carnal. Donde viria, indagava ele, essa miséria que nos cerca, essa corrupção,
essas heresias e a crassa maldade? Existia na sociedade, concluiu ele, uma
mancha inapagável motivada pelo pecado original, advindo do impulso sexual, que
atormentava o homem até a morte. Essa era a maldição que acompanhava Adão e Eva
e seus descendentes desde a queda do Paraíso.
Santo Agostinho afirmava que deveríamos tentar voltar à situação paradisíaca,
onde não havia tensão entre o impulso e o ato sexual. Foi a partir da danação
dos nossos pais primevos que essa desgraça começou. Aqui me permito pontuar que
a Doutrina Espírita não concebe Adão e Eva como os primeiros seres humanos, mas
como uma raça que veio para este Planeta Terra, pois não estava conseguindo
acompanhar a evolução do seu próprio mundo.
Se após Caim ter matado Abel, só ficaram Adão, Eva e Caim, que mulher é aquela
com quem teve um filho e que população é aquela para quem fundou uma cidade, já
que a Bíblia diz que o primeiro casal foi Adão e Eva, e não há relato de mais
outras pessoas nessa época? (Gênesis 4-5)
Voltemos a Santo Agostinho, parecia-lhe que o casamento, a relação sexual e o
Paraíso eram incompatíveis. Desse modo, a sexualidade permanecia como o
indicador da queda do homem, do seu triste declínio da anterior situação
angelical, fazendo com que deslizasse para baixo, para a natureza física, e
desta para a sepultura. Está certo que os casais deveriam se preocupar em gestar
filhos, mas que o fizessem conscientes de que estavam cometendo um ato de
rebaixamento. Era algo necessário, porém degradante, que deveria ser praticado
sob os acordes de uma intensa melancolia.
Santo Agostinho é considerado um dos maiores teólogos da Igreja Católica, logo
os seus princípios e fundamentações estão ecoando até hoje, influenciando os
menos avisados a uma postura meramente passiva, na absorção de conhecimento que
vai até ao famigerado “mistérios da fé”. Ou seja o que não se entende, aceita-se
e pronto. Não.
Parte III
Vimos no artigo anterior que Santo Agostinho foi fator decisivo para se associar
a idéia de pecado ao sexo. Ele próprio sofreu frustrações amorosas; talvez tenha
sido isto. Somos produtos das nossas vivências e experiências. "Assim, Agostinho
introduziu entre os cristãos uma definitiva nódoa de consciência culpada quando
faziam sexo ou tinham sentimentos e impulsos prazerosos. Trouxe para dentro dos
lares e para os leitos conjugais uma sombra de coisa maligna, de impureza,
perversão e vÃcio, que arruinou a vida de incontáveis casais, para quem o sexo
passou a ser associado a um "presente do demônio", ou um discordium malum, um
princípio de discórdia alojado no interior de cada um desde a Queda. Opôs
definitivamente a Carne a Deus!" como bem afirmou Schilling.
Talvez uma das maneiras de se entender essa verdadeira perseguição ao sexo por
Santo Agostinho, seja o seu pessoal trauma na vivência da sexualidade, isto
porque ele foi um renegado do erotismo, como disse acima. Foi abjurado das suas
paixões sensuais pregressas, votou intenso ódio ao que, no passado, o atraiu,
lamentando ter desperdiçado nele tanta energia. Ele mesmo não negou ter sido
dominado na sua juventude por uma intensa voluptuosidade, pela lascívia, a ponto
de que, em determinado momento, quando pediu a Deus que o fizesse casto,
acrescentou... "mas não ainda". E foi mais longe: "A presença do impulso sexual
nos seres humanos era a marca da corrupção da nossa natureza. Tratava-se de uma
perversidade intrínseca que, tal uma erva daninha espalhada numa pradaria,
jamais poderia ser removida de todo.
Santo Agostinho explicava a maldade como resultante desse tumor sensual e
dissoluto existente em todos nós, provocador de uma desordem crônica nas nossas
relações, que o tempo inteiro nos perturba com suas poluções, com seus sonhos
inconvenientes, incestuosos, inconfessáveis. Não havia dieta ou jejum que nos
salvasse ou nos libertasse dele, acompanhando-nos até na velhice e no
encarquilhamento, como uma cicatriz não sarada do nosso passado libidinoso e
pecador".
Ora, toda a história antiga dos princípios doutrinários católicos se estribaram
exatamente nesta renegação do sexo, logo nada mais justificável que desassociar
a mãe de Jesus, do Messias, desta "pocilga" de volúpia, de depravação, sob esta
ótica distorcida, de quem, naturalmente, se via enclausurado nos seus próprios
desajustes sexuais.
Santo Agostinho é dos pais e timoneiros do corpo doutrinário da Igreja de Roma,
considerado até hoje um Doutor da Igreja. Quem dentro dela, então, rejeitaria
tais considerações? Surge Juliano, bispo de Eclanum, que considera o trabalho de
Agostinho um desserviço à causa da Igreja, do sexo e do casamento, assentados na
busca do equilíbrio.
Parte IV
Houve chilique de toda natureza, ataques pessoais e ao que faço, incentivos,
estímulos... Ocorreu de tudo, mas o importante é a minha consciência tranqüila,
pois exerci, respaldado no Artigo V, da Constituição Federal, em seu Item IV –
“é livre a manifestação do pensamento, ...”, bem como no seu item VI: “- é
inviolável a liberdade de consciência e de crença, ...”, o meu direito a
discordar de um dogma religioso.
Registre-se, por oportuno, a ratificação do caráter democrático e isento da
linha editorial de A TARDE que, em momento algum, me recomendou seja o que for.
Aprendi com a vida e com o tempo que homens com argumentos discutem idéias e
conceitos, mas quem não os tem combate, agride pessoas, deixando à mostra os
seus desencontros íntimos, interiores.
Todavia, reafirmo com todas as letras que a doutrina Kardecista, que é calcada
em uma fé raciocinada, não comunga, não aceita o caráter virginal da concepção
de Jesus, pois fere todo o princípio humano natural da vida na Terra.
Levanto ainda o condicionamento oferecido por Agostinho: “Se com o nascimento de
Jesus se houvesse corrompido a integridade da mãe, não haveria nascido de uma
virgem, e portanto, toda a Igreja professaria falsamente que havia nascido de
uma virgem". Cientificamente, é possível uma concepção virginal, mas e depois do
nascimento?
São sete os textos de Novo Testamento que mencionam irmãos de Jesus: Mc 6,3; Mc
3, 31-35; Jo 2, 12; 7, 2-10; At 1, 14; Gl 1, 19; 1Cr 9,5. Chamavam-se, conforme
Mc 6,3; Mt 13, 55s: Tiago, José, Judas e Simão.
Jesus ainda afirma em Mt, 5, 17-18: “Não penseis que eu tenha vindo destruir a
lei ou os profetas, não os vim destruir, mas cumpri-los.”. Ora, Jesus aí fala em
duplo sentido: um em relação a Moisés, mas o outro, seguramente, em direção à
própria vida, com a sua lei natural. Assim, Jesus se fez homem como qualquer um
de nós, logo não desqualificou a forma natural de vir a este Mundo, pois
demonstrou inclusive no local de seu nascimento que queria ser um simples, um
humilde homem.
Absolutamente, não vejo demérito algum em Maria ter concebido Jesus de um ato
sexual natural, com muito amor, com o seu esposo, companheiro. Penso ai estar a
sua magnanimidade, pois mulher comum, destaca-se com tamanha grandeza ao ponto
vir a ser oferecida, por Jesus, como mãe da humanidade.
Caro leitor, guardando as devidas diferenças, mas quem não vai ter em sua doce
mãe desta Terra um símbolo de abnegação, luta, ternura, amor, mesmo tendo ela
feito sexo com os nossos pais? Onde o sujo, o pecaminoso de nossas mães? A minha
foi um exemplo de tudo, meu ídolo.
O que santificou Maria não foi o seu estado físico, mas a sua pureza de alma, a
sua virgindade de maus sentimentos. Fez-se Senhora de todos nós pela essência de
sua alma, grandeza do seu ser espiritual, angelitude de seus ideais.
O ser não se torna especial porque veio de maneira especial. Não. O ser se torna
especial, pois se destaca do comum, arrebatando-se a si mesmo de fulgurante
amor, a ponto de se doar a uma causa, de fazer a diferença com o seu pensar,
falar e agir.
Ave Cristo, salve Maria
Por: José Medrado, Caso tenha ou possua, envie-nos a referência desse texto.
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