Ensinar, por Espíritos Diversos
Criatividade ou Rebeldia
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Fizeram-me, esta pergunta, outro dia, junto à perspectiva de um desafio. O que é melhor para o jovem espírita: ser um rebelde ou ser alguém criativo, interessado em educar seus anseios diante do mundo, porém sem perder a gana e a vontade de mexer nas estruturas possíveis dentro de seu tempo histórico?
Excelente proposta de reflexão. Mas, vamos pensar um pouco mais... quem sabe alteramos o rumo da reflexão. Parece-me que a oposição apresentada entro rebeldia e criatividade não se sustenta por muito tempo, diante de uma análise mais consistente.
Não vejo os dois aspectos como excludentes, dicotômicos. Entendo exatamente o
contrário. Dependendo da forma como se analisa, a rebeldia é precisamente o
elemento que permite ao homem expressar, rio máximo de suas alternativas, a
criatividade que deve marcar sua, presença no mundo.
Rebelar-se é ter a capacidade de lutar contra a injustiça. É uma qualidade
distintiva dos seres humanos, O rebelde defende uma visão da vida e da
sociedade, profundamente convencido da importância dessa visão para si e seus
companheiros. Ao pensar e agir dessa forma, ele acaba por sacudir os costumes
estabelecidos o a ordem rígida de seu meio. Refiro-me, neste trabalho, ao
rebelde, e não ao revolucionário. Este luta mais pelo poder, num esforço muitas
vezes externo a suas próprias necessidades de transformação pessoal. O rebelde,
não. Ele não busca o poder como um fim em si, demonstra, inclusive, pouca
disposição em usá-lo; é propenso a repartir o seu poder.
Conforme explica Rollo, May*, em uma análise da relação complexa entre opressão
e liberdade, o escravo que mata o seu amo é um exemplo de revolucionário. Outros
acabarão por tentar matá-lo, em busca do poder que ele acabou amealhando. O
rebelde faz diferente - percebe que seu amo é tão escravo quanto ele, rebela-se,
pois, contra o sistema que permite a existência de escravos e senhores. A sua
rebelião, desta forma, se for coroada de êxito, acaba por salvá-lo e também a
seu amo, da indignidade de possuir escravos.
É por isso que temos em nosso favor a admiração e o respeito por grandes
rebeldes, que marcaram a história com soas atitudes de inconformismo o desejo
inarredável de mudança definitiva das estruturas arcaicas e ultrapassadas.
Jesus, modelo e guia da humanidade, é o rebelde por excelência. Ouvistes o que
foi dito... afirmava o Senhor, reconhecendo a importância da Lei antiga, mas ao
sentenciar vos digo, o Mestre proponha a superação (pacífica, diga-se de
passagem), dos modelos antigos de interação social e a adoção do amor como
elemento fundamental para as novas relações entre os homens.
Sócrates não fugiu também da necessidade de rebelar-se contra a estrutura e a
estabilidade social de sua época, 400 anos antes de Jesus. Ao negar a fuga aos
amigos que lhe traziam a chance de deixar a cadeia, após ter sido condenado como
corruptor da juventude, o filósofo grego optou por permanecer sem liberdade
externa, porém com independência e fidelidade interna aos ideais. Foi por esse
ato de libertadora rebeldia que, elo provou â Humanidade que seus valores eram
universais e não se aplicavam somente a si, mas também aos outros, inclusive
seus inimigos.
É por isso que o rebelde tem como característica essencial a capacidade para
transcender seu próprio orgulho ferido. Ele despreza a vingança pessoal; não
alimenta sentimentos de rejeição; não encontra justificativa ética para
imaginar-se no direito de exigir vingança. Ele, aliás, não tem nem tempo para
isso, empenhado que está em identificar-se com as pessoas que sofrem,
profundamente necessitadas de seu apoio, força esta que pode aliviar-lhes o
sofrimento.
Voltemos à pergunta inicial. O que é melhor, rebeldia ou criatividade? Que tal
optarmos pelas duas! Combinadas com equilíbrio e bom senso, cremos que elas
podem fazer do jovem espírita um ser com o sangue fervoroso de um trabalhador,
inconformado com o apego a tudo o que retrata o homem velho e as paixões do
passado, e, ao mesmo tempo, uma criatura que reconhece valor até na própria
autoridade contra a qual luta. Necessitamos da autoridade na medida em que nos
rebelamos contra ela. Isto não acontece em nossos lares, quando revoltamo-nos
contra nossos pais, ao mesmo tempo em que os amamos?
O fio suave, em que, se revela a harmonia intima, nasce encontro sereno da
rebeldia bem compreendida (muito clara em artistas - rebeldes e criativos: por
natureza), com a obediência implícita à ordem natural das coisas, onde reina a
paz de Deus.
Em suma, é, fundamental rebelarmo-nos com nobreza e maturidade de coração contra
o que precisa ser transformado, para nossa felicidade pessoal e coletiva, a fim
de adaptarmo-nos definitivamente à transparência calma e cristalina da Lei de Amor.
Por: Carlos Augusto Abranches, Jornal Universo Espírita – julho/1999
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