Em Louvor da Caridade, por Fabiano de Cristo
Notícias de Jonas
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Jonas o profeta, descansava, enfim, na deleitosa paisagem.
Levantara cabana tosca, a oeste de Nínive, e ali, diante do céu e da natureza,
preferia o silêncio ao burburinho dos homens.
Sentia-se triste, desenganado, e ruminava impropérios contra o próprio Senhor.
Contemplando o casario distante, na aragem do crepúsculo, recordava o início do
ministério em que se presumia fracassado.
Vivia calmo - pensava, vivia calmo e sem atrito. Adorava as oliveiras do velho
sítio, tangia, feliz, seu rebanho de cabras. O anonimato garantia-lhe o sossego
do prato sem problemas.
O Senhor, porém, surgira-lhe à visão e tudo se alterara. A palavra dele
irrompia-lhe nos ouvidos, em qualquer lugar e a qualquer hora. Se fosse apenas o
prazer de ouvi-lo... Mas o Senhor queixava-se de Nínive e incumbia-o de severa
advertência. Cabia-lhe a obrigação de avisar os ninivitas de que lhes destruiria
a cidade, como se ateia fogo num campo invadido de pragas. Que Jonas falasse,
gritasse, anunciasse, predissesse. A medida poderia afastar os moradores que
desejassem purificar o coração e melhorar a vida. Entretanto, ele, Jonas, não
ignorava que o Senhor sempre fora profundamente compassivo. Conquanto lhe
respeitasse as determinações, temia interferir em assunto assim tão grave. E se
houvesse contra-ordem? E se alguma deliberação nova poupasse os condenados?
Melhor a indicação de outra pessoa. Alguém de caráter maleável, sem brio
suficiente para sofrer com a probabilidade do retrocesso. Receando
desmoralizar-se, fugiu, resoluto. Desceu para Jope e tomou embarcação para
Társia, mas, em viagem, sobreviera a tempestade e temera. No auge da tormenta,
declarou aos tripulantes que, decerto, estaria na presença dele a causa do
temporal que parecia inamainável. Desobedecera à voz do Alto. Fizera-se passível
de austera punição. Amedrontados, os remadores atiraram-no às ondas.
Debatendo-se no abismo, arrependera-se da deserção e prometeu cumprir o mandato
com rigor. Veneraria a benignidade do Trono Eterno e transmitiria a mensagem
fielmente. O Senhor escutou-lhe a petição e despachou recursos que o salvassem.
Vira-se arrebatado ao torvelinho voraginoso e conduzido à praia com segurança.
Renovado e confiante, efetuara três dias de marcha laboriosa e, alcançando
Nínive, entregou-se aos sombrios vaticínios. Mais quarenta dias e a cidade seria
aniquilada. O povo ninivita acreditou nele e, a partir dos maiorais,
penitenciou-se em pranto de sincera compunção, suplicando socorro à Bondade
Celestial. Preces coletivas e piedosas realizações foram feitas. O Senhor
enternecera-se e, tomado de compaixão, absolvera a cidade, conferindo-lhe aos
habitantes novos recursos de trabalho e corrigenda.
Justamente por isso, achava-se, ali, sozinho e desapontado.
Ferido no amor próprio, demandara o retiro agreste para forrar-se ao sarcasmo da
via pública.
Tanto chorou, naquele ocaso cinzento, confessando a si mesmo invencível
desânimo, que o Senhor se dispôs a visita-lo e, ao vê-lo moralmente surdo e cego
de indignação e amargura, brindou-lhe a choça com uma semente de aboboreira.
A breve espaço, Jonas descobriu a plantinha nascente e embeveceu-se.
Consagrou-se a ela com paternal carinho. A trepadeira cresceu, viçosa, e
abraçou-lhe o casebre. Assemelhava-se a bela coroa verde a defende-lo contra o
sol, fazendo-o esquecer todas as mágoas.
No entanto, quando o profeta se revelava mais devotado ao seu passatempo, surge
o imprevisto. Grande rato dilapidou as raízes do lindo ornato e as ramas
secaram-se, de chofre.
Jonas, irado, afundou-se no desespero.
Amava a planta, dedicara-se inteiramente a ela. Porque a destruição, porque a
ruína?
Arremessando os punhos na própria cabeça, esbravejava contra a canícula e,
afagando folhas mortas, perguntava, em lágrimas: “porquê? porquê”?
Foi então que o Senhor lhe apareceu, plenamente materializado, e falou, conciso:
_ Ah! Jonas, consideras-me covarde, por exercitar a misericórdia, e
apaixonas-te, desta forma, por uma aboboreira, da qual desconheces a formação,
em cujo desenvolvimento não trabalhaste, que nasceu numa noite e que, num dia,
pereceu? Choras amargamente por um simples vegetal, tentando recupera-lo e não
me permites qualquer compaixão por Nínive, onde estão mais de cento e vinte mil
homens, ainda fracos e ignorantes, e que, por enquanto, não sabem discernir a
mão direita da mão esquerda?
Assim termina a saborosa narração do Velho Testamento. E, ao relê-la, pensamos
em muitos religiosos da Terra que se fazem censores dos irmãos em dificuldades
para assimilar os talentos da fé, a exigirem que o Senhor lhes destrua a
existência, mas profundamente agarrados às suas comodidades e às suas abóboras.
Por: Irmão X, Do livro: Contos Desta e Doutra Vida, Médium: Francisco Cândido Xavier
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