Ensinar, por Espíritos Diversos
O Faroleiro Desprevinido
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O soldado Teofrasto, homem de excelente coração, fora nomeado faroleiro por
Alcebíades, na expedição da Sicília, a fim de orientar as embarcações em zona
perigosa do mar.
Por ali, rochedos pontiagudos esperavam sem piedade as galeras invigilantes.
Ainda mesmo fora da tempestade, quando a fúria dos deuses não soprava sibilante
sobre a Terra, derribando casas e arvoredo, os pequenos e grandes barcos eram
como que atraídos aos penhascos destruidores, qual ovelhas precipitadamente
conduzidas ao matadouro.
Quantos viajantes havia já perdido a vida e os bens na traiçoeira passagem?
Quantos pescadores incautos não mais regressaram à benção do lar? Ninguém sabia.
Preservando, porém, a sorte de seus comandados, o grande general situou
Teofrasto no farol que se erguia na costa, com a missão de iluminar o caminho
equóreo, dentro da noite.
Para garantir-lhe o êxito, mandou-lhe emissários com vasta provisão de óleo
puro. O servidor, honrado com semelhante mandato, permaneceria no ministério da
luz contra as trevas, defendendo a salvação de todos os que transitassem pelas
águas escuras.
De início, Teofrasto desenvolveu, sem dificuldade, a tarefa que lhe competia.
Findo o crepúsculo, mantinha a luz acesa, revelando a rota libertadora.
Quando os vizinhos, porém, souberam que o soldado guardava um coração terno e
bondoso, passaram a visitá-lo, amiúde. Realmente estimavam nele a cordialidade e
a doçura, mas o que procuravam, no fundo, era a concessão de óleo destinado às
pequenas necessidades que lhes eram próprias.
O soldado, a breve tempo, era cercado de envolventes apelos.
Antifon, o lavrador, veio pedir-lhe meio barril do combustível para os serões de
sua fazenda.
Eunice, a costureira, rogou-lhe duas ânforas cheias para terminar a confecção de
algumas túnicas, além das horas do dia.
Embolo, o sapateiro, alegando que o pai agonizava, implorou-lhe a doação de
alguns pratos de azeite, a fim de que o genitor não morresse às escuras.
Crisóstomos, o fabricante de ungüentos, reclamou cinco potes destinados à
manipulação de remédios. Cor Ciro, o negociante, implorou certa cota mais
elevada para sustento de algumas tochas.
Todos os afeiçoados das redondezas, interessados em satisfazer as exigências
domésticas, relacionaram solicitações simpáticas e comoventes.
Teofrasto, atingido na sensibilidade, distribuiu o combustível precioso pela
ordem das rogativas.
Não podia sofrer o quadro angustioso, afirmava. As requisições, no seu parecer,
eram justas e oportunas.
Assim foi que, ao término de duas semanas, se esgotou a reserva de doze meses.
O funcionário não pôde comunicar-se facilmente com os postos avançados de
comando e, tão logo se apagou o farol solitário, por várias noites consecutivas
os penhascos espatifaram embarcações de todos os matizes.
Prestigiosos contingentes de tropas perderam a vida.
Confiados pescadores jamais tornaram ao ninho familiar.
Comerciantes diversos, portadores de valiosas soluções e problemas inquietantes
da luta humana, desceram aflitos ao abismo do mar.
Alcebíades, naturalmente indignado, exonerou o servidor do elevado encargo,
recomendando-lhe fosse aplicado às penas da lei.
O médium cristão é sempre um faroleiro com as reservas de óleo das
possibilidades divinas, a benefício de todos os que navegam a pleno oceano da
experiência terrestre, indicando-lhes os rochedos das trevas e descerrando-lhes
o rumo salvador: todavia, quantos deles perdem a oportunidade de serviço
vitorioso pela prisão indébita nos casos particulares que procedem geralmente de
bagatelas da vida?
Por: Irmão X, Do livro: Contos e Apólogos, Médium: Francisco Cândido Xavier
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