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Aqueles que dispomos da visão perfeita, com certeza não podemos avaliar a preciosidade que é ter noção de espaço, distâncias, cores. Tudo o que os olhos nos oferecem todos os dias.

Por isso, ouvir o depoimento de uma senhora novaiorquina, cega, que mora sozinha, é emocionante.

Durante todo o inverno, ela ficou dentro de casa a maior parte do tempo. Naquele dia de final de abril, a friagem amenizou e ela sentiu o perfume forte e estimulante da primavera.

Seus ouvidos escutaram o canto insistente de um passarinho do lado de fora da janela. Era como se a pequena ave a estivesse convidando a sair de casa.

Preparou-se, tomou a bengala e saiu. Voltou o rosto para o sol, deu-lhe um sorriso de boas-vindas, agradecida pelo seu calor e a promessa do verão.

Caminhando tranquila pela rua, escutou a voz da vizinha a lhe perguntar se não desejava uma carona.

Não, respondeu ela. As minhas pernas descansaram o inverno inteiro. As juntas estão precisando ser lubrificadas e um passeio a pé me fará bem.

Ao chegar na esquina esperou, como era seu costume, que alguém se aproximasse e permitisse que ela o acompanhasse, quando o sinal ficasse verde.

Os segundos pareceram uma eternidade. E ninguém aparecia. Nenhuma oferta de ajuda. Ela podia ouvir muito bem o ruído nervoso dos carros passando com rapidez, como se tivessem que conduzir os seus ocupantes a algum lugar, muito, muito depressa.

Por um momento se sentiu só, desprotegida. Resolveu cantarolar uma melodia. Do fundo da memória, recordou-se de uma canção de boas-vindas à primavera, que havia aprendido na escola quando era criança.

De repente, ela ouviu uma voz masculina forte e bem modulada.

Você me parece um ser humano muito alegre. Posso ter o prazer de sua companhia para atravessar a rua?

Ela acenou afirmativamente com a cabeça, sorriu e murmurou ao mesmo tempo um sim.

Delicadamente, ele segurou o braço dela. Enquanto atravessavam devagar, conversaram sobre o tempo e como era bom, afinal, estar vivo num dia daqueles.

Como andavam no mesmo passo, era difícil se saber quem era o guia e quem era o guiado. Mal haviam chegado ao outro lado da rua, ouviram as buzinas impacientes dos automóveis. Devia ser a mudança de sinal.

Ela se voltou para o cavalheiro, abriu a boca para agradecer pela ajuda e pela companhia.

Antes que pudesse dizer uma palavra, ele falou:

Não sei se você percebe como é gratificante encontrar uma pessoa tão bem disposta para acompanhar um cego como eu, na travessia de uma rua.

Às vezes, quando nos sentimos sós no Universo, Deus nos manda uma imagem semelhante para diminuir nossa sensação de isolamento e desigualdade.

É sempre reconfortante conseguir perceber que, sejam quais forem as dificuldades e limitações que estejamos atravessando, sobre a Terra, existem outras tantas dezenas ou centenas de criaturas que, como nós, passam por situações semelhantes.

E, o mais importante, lutam e vencem. É a mensagem viva de bom ânimo da divindade para as nossas próprias vidas.


Por: Momento Espírita, Redação do Momento Espírita, com base no livro Pequenos milagres, de Yitta Halberstam e Judith Leventhal, ed. Sextante. Do site: http://www.momento.com.br/pt/ler_texto.php?id=6913&stat=0


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