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O diálogo, à noite, entre as duas senhoras, continuava na copa:

– Você, minha filha, deve perdoar, esquecer... Lá diz o Evangelho que costumamos ver o argueiro no olho do vizinho, sem ver a trave dentro do nosso...

– Mas, mamãe, foi um insulto! O moço parou à frente da janela, viu as minhas estatuetas e atirou a pedra!

E Dona Balbina, senhora espírita de generoso coração, prosseguia falando à filha, Dona Rogéria:

– Ele é um pobre rapaz obsediado.

– História! É uma fera solta, isto sim!

– Mas Dona Margarida, a mãe dele, foi sempre amiga...

– Isso não vem ao caso... Cada qual é responsável pelos próprios atos. A senhora sabe que ele é maior.

– Precisamos perdoar para sermos perdoados...

– Ser bom é uma coisa, e outra coisa é ser tolo! Darei queixa à polícia... Somente não queria fazê-lo sem ouvi-la; contudo, Fábio e eu estamos decididos. Meu Fábio já anda cansado do volante...

Pobre marido!... Dinheiro cavado em caminhão é duro de ganhar...

– Meu conselho, filha, é desculpar e desculpar...

– Mas o prejuízo é de dois mil cruzeiros, além da injúria!

– Mesmo assim, o perdão é o melhor remédio.

– Ah! Que será do mundo, assim, sem corrigenda, sem justiça?

Nesse instante, alguém bate à porta.

Ambas atendem.

O portador comunica:

– Um desastre! O senhor Fábio trombou uma casa e a parede caiu! Mãe e filha correm para o local, que se encontra entulhado de multidão, e veem a casa acidentada. É justamente a moradia de Dona Margarida, a mãe do rapaz que atirara a pedra. O caminhão, num lance estouvado, derribara uma parede lateral e penetrara, fundo, inutilizando todo o mobiliário da sala de refeições.

Apagara-se a luz no quarteirão e as duas, sem que ninguém as reconhecesse, podiam escutar Dona Margarida, que sustentava uma vela acesa, diante do guarda de trânsito:

– Peço-lhe – dizia ao fiscal – não abrir processo algum. Não quero reclamações.

– Mas, Dona Margarida – insistia o funcionário –, a senhora vai ter aqui um prejuízo para mais de quarenta contos!

– Não importa. Deus dará jeito. “Seu” Fábio e Dona Rogéria são meus amigos de muito tempo.

As duas senhoras, porém, não puderam continuar ouvindo, pois a voz irritada de Fábio elevou-se da multidão e era necessário socorrê-lo, porque o infeliz estava ébrio.


Por: Hilário Silva, Do livro: O Espírito da Verdade, Médium: Francisco Cândido Xavier


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