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Você, meu caro, assevera que se vê fatigado consigo mesmo.

As imperfeições, as nossas velhas imperfeições!...

Diz você que acaba de ler um volume edificante e articula promessas de melhoria, ouve uma preleção nobre e reafirma votos de elevação... Horas depois da expectativa brilhante, ei-lo que se estira no erro ou na negação de tudo o que assegurou a si próprio em matéria de burilamento moral. Em seguida, a exagerada noção de inferioridade pessoal, as ideias de culpa e, com isso, os sofrimentos íntimos e as aflições vazias.

O tempo que poderia despender em atividades úteis se lhe foge das mãos, inaproveitado. E você pergunta o porquê de semelhante antagonismo. De um lado, a santidade do intento; de outro, a impossibilidade da execução.

Entretanto, meu amigo, esse conflito nos pertence a todos, a todos nós, os espíritos em evolução e acrisolamento no regaço maternal da Terra, - desde milênios.

Contra o pingo de esforço que sustentamos a favor do auto-aperfeiçoamento, surpreendemos o caudaloso rio de nossos impulsos instintivos que nos arrastam para a animalidade de que somos egressos.

A necessidade de paciência até mesmo conosco se nos patenteia, no clima da vivência comum, em qualquer parte. Paciência de repetir pequeninos gestos de tolerância e diminutas renunciações, hora por hora, dia por dia, manejando incessantemente o buril da disciplina sobre a pedra de nossas qualidades virtuais, de modo a nela esculpir a individualidade que aspiramos a ser.

Creia que isso ocorre à maioria das criaturas em estágio educativo no Planeta, estejam ou não vinculadas à carteira do corpo físico. Escalamos o monte da sublimação, a passo e passo, muita vez de coração agoniado e pés sangrentos.

A nosso ver, não padecem guerra íntima ùnicamente aqueles que se anestesiam, de maneira temporária, em superioridade falsa, acreditando-se realizadas em paraísos de ilusão, copiando a convicção das crianças que se admitem habitando castelos em suas construções de papel ou de areia.

Essa terrível disparidade entre o que ainda somos e o que devemos ser é peculiar a todas as criaturas que despertam para as exigências da ascensão espiritual. O próprio Paulo de Tarso, refletindo sobre semelhante problema, declara no versículo 19 do capítulo 7, de sua Epístola aos Romanos: “Não faço o bem que desejo; contudo, o mal que não quero, esse faço”.

A propósito, no entanto, confortemo-nos com a certeza de que, apalpando as nossas chagas morais, formamos mais seguro conhecimento de nós mesmos, o que é muito importante.

Conta-se que Israel ben Eliezer, apelidado por Baal Shem-Toy, nome comumente abreviado por Besht, renomado pensador judaico do século XVIII, foi procurado por certo devoto, que a ele se queixou, amargamente confessando:

- Mestre, que será de mim? Entreguei-me fervorosamente ao serviço do Senhor, por longos anos, e, depois de tanto tempo, reconheço hoje que não melhorei... Continuo a ser um homem imperfeito e ignorante...

O Besht, porém, sorriu e respondeu, compassivo:

- Se chegaste, meu filho, a compreender que és imperfeito e ignorante, isto representa, por sí só, um progresso admirável.

Reflitamos, desse modo, em nossas fraquezas, sem autocondenação. Não adianta cobrir-nos de cinzas, ao verificar nossas faltas. Vale enfrentá-las e corrigi-las à custa de nossa própria retificação.

Que somos espíritos endividados, perante as Leis Divinas, é uma realidade, e que precisamos servir ao próximo com esquecimento de nós mesmos, para dissipar as trevas do egoísmo que ainda nos envolvem a alma, é nossa obrigação. Observando, assim, com o escalpelo do raciocínio próprio, as deficiências e desequilíbrios que ainda nos pesam no ser, estamos naturalmente curando nossa multimilenária cegueira de espírito e, com isso, meu caro, já nos cabe render graças a Deus.


Por: Irmão X, Do livro: Estante da Vida, Médium: Francisco Cândido Xavier


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