Evocar ou Invocar
As duas palavras que intitulam a presente matéria não formam sinônimos
perfeitos, embora tenham a mesma raiz, vocare, que é igual a chamar. Ambas
sofreram algum desgaste de uso popular, distorcendo o intercâmbio com os
espíritos, embora sua nobre significação. O dicionário1 as definem como: a)
evocar: chamar de algum lugar, trazer à lembrança; b) invocar: chamar em seu
auxílio por meio de orações, de súplicas; implorar a proteção de; Nota-se pelas
definições a importância de ambos os verbos, que definem o relacionamento com
Deus e os espíritos, de forma geral.
Em síntese, para fácil entendimento, a invocação está no pensamento, a evocação
é um ato. Como exemplo, portanto, podemos dizer que a prece é uma invocação e o
ato em si dessa invocação é a própria evocação, que normalmente define o
destinatário da petição, a quem se dirige a invocação. A palavra correta, pois,
é evocação. Invocação é genérico. Evocação é com endereço determinado, mesmo que
também dirigido genericamente aos Espíritos Superiores, por exemplo.
Com a prática das reuniões mediúnicas de intercâmbio dos espíritos, nem sempre
orientadas pelo pensamento espírita, ambas as palavras sofreram pequeno desgaste
por quem desconhece a nobreza das significações, bem como suas ideais condições
de uso.
Por esta única razão o tema permanece muito atual, solicitando estudo para real
compreensão, afastando tentativas de misticismos ou de máculas em torno do
assunto, sempre presente nas práticas, diálogos no ambiente espírita ou mesmo
fora dele.
Em O Céu e o Inferno2, no capítulo X da primeira parte, encontramos precioso
material de orientação para espíritas ou não, grupos, expositores e dirigentes
espíritas. Para avaliarmos a extensão da importância que o assunto enseja,
transcrevemos alguns trechos dos itens 9 e 10 do referido capítulo:
“(...) Hoje sabemos que os Espíritos são as almas dos mortos e não os evocamos
senão para receber conselhos dos bons, moralizar os maus e continuar relações
com seres que nos são caros 3. Eis o que diz o Espiritismo a tal respeito:
10 – Não podereis obrigar nunca a presença de um Espírito vosso igual ou
superior em moralidade, por vos faltar autoridade sobre ele; mas, do vosso
inferior, e sendo para seu benefício, consegui-lo-eis, visto como outros
Espíritos vos secundam. (O Livro dos Médiuns, 2a parte, cap. XXV).4
– A mais essencial de todas as disposições para evocar é o recolhimento, quando
desejarmos tratar com Espíritos sérios. Com a fé e o desejo do bem, mais aptos
nos tornamos para evocar Espíritos superiores. Elevando nossa alma por alguns
instantes de concentração, no momento de evocá-los, identificamo-nos com os bons
Espíritos, predispondo a sua vinda. (O Livro dos Médiuns, 2a parte, cap. XXV)4
– Nenhum objeto, medalha ou talismã tem a propriedade de atrair ou repelir
Espíritos, pois a matéria ação alguma exerce sobre eles. Nunca um bom espírito
aconselha tais absurdos. A virtude dos talismãs só pode existir na imaginação de
pessoas simplórias (O Livro dos Médiuns, 2a parte, cap. XXV)4.
– Não há fórmulas sacramentais para evocar Espíritos. Quem quer que pretendesse
estabelecer uma fórmula, poderia ser tachado de usar de charlatanismo, visto que
para os Espíritos puros a fórmula nada vale. A evocação deve, porém, ser feita
sempre em nome de Deus. (O Livro dos Médiuns, 2a parte, cap. XXV)4.
– Os Espíritos que prefixam entrevistas em lugares lúgubres, e a horas
indevidas, são os que se divertem à custa de quem os ouve. É sempre inútil e
muitas vezes perigoso ceder a tais sugestões; inútil, porque nada se ganha além
de uma mistificação, e perigoso, não pelo mal que possam fazer os Espíritos, mas
pela influência que tais fatos podem exercer sobre os cérebros fracos. (O Livro
dos Médiuns, 2a parte, cap. XXV)4.
– Não há dias nem horas mais especialmente propícios às evocações: isso, como
tudo que é material, é completamente indiferente aos Espíritos, além de ser
supersticiosa a crença em tais influências. Os momentos mais favoráveis são
aqueles em que o evocador pode abstrair-se melhor das suas preocupações
habituais, calmo do corpo e de espírito. (O Livro dos Médiuns, 2a parte, cap.
XXV)4.”
O assunto é tão vasto e importante que Allan Kardec dedicou um capítulo inteiro
em O Livro dos Médiuns e intitulado Das Evocações. É o capítulo XXV, fonte das
informações trazidas pelo Codificador em O Céu e o Inferno e ora parcialmente
transcrito nesta matéria. É no citado capítulo que o estudioso atento encontrará
as informações que precisa para orientar e orientar-se, já que precisamos nos
entender na questão do próprio vocabulário e mais: estarmos doutrinariamente
preparados para a questão. Para evitar decepções, não denegrir as palavras em
si, manter o respeito que a Doutrina Espírita merece de todos nós e transmitir
conhecimentos através das incessantes oportunidades disponíveis.
1Conf. Grande Dicionário da Língua Portuguesa, edição Novo Brasil Edit. Ltda.
2páginas 142 e 143 da 32ª edição FEB, setembro de 1984, Rio (RJ), tradução de
Manuel Quintão.
3Destaque do autor.
4Notem os leitores que cada item assinalado propicia amplos estudos. A indicação
do capítulo XXV, de O Livro dos Médiuns, consta na edição de O Céu e o Inferno.
Artigo originariamente publicado na RIE – Revista Internacional de Espiritismo,
edição de abril de 2003.
Orson Carrara