Amor Filial
Mãe querida: Aqui estou.
A morte abre as portas da vida e a vida, muitas vezes, como a conhecemos na
Terra, é quase sempre a descida para a morte.
A dor, porém, a velha dor que me serviu de pajem, do berço ao túmulo, jamais
escondeu nosso amor à eternidade.
Ainda mesmo no sofrimento, seu carinho ouvia minha voz, e o reino da perfeita
compreensão era o ninho em que habitávamos ambos, constantemente à espera do dia
melhor.
Quando menos aguardava o fim da luta, chamou-me a Vontade do Senhor para outros
climas.
À noite caliginosa da provação terminara e raiou a alvorada nova...
Entretanto, mamãe, que paraíso haveria mais belo e mais doce para mim que o lar
invisível de sua ternura e de seu devotamento?
Que felicidade mais pura existiria para seu filho, que essa de permanecer ao seu
lado, escutando-lhe os cânticos do coração?
Por isso mesmo, fiquei e sigo-lhe os passos com a alegria constante de quem não
deseja aparta-se do seu tesouro maior.
Através de todos os recursos ao meu alcance, busco fazer-me ouvido por sua alma
incorporada ao santuário de minhas indeléveis recordações.
Em suas noites de angústia, tento acender estrelas de esperança no firmamento de
sua fé; e nos dias atribulados, quando os espinhos se multiplicam, em derredor
de seus passos, procuro ser intangível bordão de arrimo para que seu espírito
afetuoso e, tanta vez, incompreendido, não se desequilibre na marcha.
Tenho tido a felicidade de contemplar a sua confiança em Deus a ergue-se sempre
mais alto, convertendo pesares em alegrias, sombras em luzes, ofensas em
benefícios e derrotas aparentes em triunfos reais para a vida eterna.
Continue, de animo firme, buscando a vanguarda espiritual dos trabalhadores
incansáveis do Evangelho da Redenção.
Nas linhas da retaguarda jazem sonhos mortos em nossos ídolos esfacelados,
aspirações superficialmente frustradas e enganos sepultos na poeira de
construtivos desencantos.
A sementeira da experiência e os temporais da ingratidão passaram violentamente
sobre o nosso roteiro, entretanto, acima de todos os escombros de nossos
desejos, arde à chama divina do amor que nos imanta as almas para sempre...
Não desfaleçamos...
Para quem se eleva aos cimos da espiritualidade bendita, a experiência é
doloroso processo de acrisolamento e regeneração.
Aceitemos a prova e a luta por instrutores de nossa peregrinação, no rumo de
mais altos destinos.
Fácil é o repouso.
Agradável parece à estagnação.
Contudo, o descanso pode ser deplorável ociosidade mental e a demora, em certos
campos de aprendizagem, habitualmente significa atraso na jornada evolutiva.
O seu exemplo e a sua bondade, ainda e sempre, representam os alicerces de nosso
equilíbrio.
Deus lhe abençoe todos os propósitos de renovação, conduzindo-lhe os passos para
o serviço maior, junto da Humanidade. Pelos fios luminosos da inspiração
segui-la-emos, cada dia, na justa planificação do porvir.
Anjo dos meus dias de reajuste, jamais olvidarei a renúncia com que me
acompanhou, noite a noite, até que o Dia Abençoado de minha ressurreição
surgisse brilhante...
Em razão disso, estaremos sempre mais juntos, passo a passo, até que no Templo
da União Divina, possamos agradecer à dor o patrimônio de alegrias com que nos
enriqueceu a caminhada para o Mundo Maior.
De pensamentos entrelaçados, jamais conheceremos a separação.
Beija-lhe o coração abnegado, o filho que a segue de perto com vigilante amor.
Paulo