As Sementes da Vida
- Jardineiro – disse-me o “rishi” – onde estão as tuas flores?
Chegou a primavera e teu jardim está sem vida... Não plantaste novas sementes?
- Plantei, mas não brotaram. Veio a larva e as devorou uma por uma.
- Então não sabes, Jardineiro, que as larvas nascem do descuido? Os jardins são
como os corações, necessitam de cuidados constantes... Se não forem regados com
as águas do amor, se não o adubarmos com a seiva da virtude, não terão vigor
para brotar, e serão crestados pelas larvas da cupidez, ganância e corrupção,
tudo pela nossa imprevidência.
- A terra parecia fértil e boa, mas enganou-me. Sempre a cultivei sem adubá-la.
Foi a primeira vez que não me deu flores na primavera. Até os gerânios
pereceram...
- Jardineiro, nós é que falhamos ao julgar pelas aparências. Não foi a terra que
te enganou; ela deu-te aquilo que possuía... Antes de plantar é preciso revolver
a terra, penetrá-la intimamente até onde alcançarem as raízes do nosso bom
sendo. Do contrário será inútil todo esforço, e vã a sementeira.
- O calor do verão tirou-me o ânimo de trabalhar a terra. Apenas semeei na
superfície. Com isso, evitava também calejar as mãos.
- O mesmo acontece aos corações, Jardineiro. Como podemos censurar-lhe erros e
falhas, se não soubemos dizer não ao que acreditávamos justo e razoável, embora
não fosse correto e direito? Como colher gerânios na primavera, se não soubemos
bem cultivar na época do plantio?... Se permitimos que as larvas, em sua
voracidade e ignorância, destruíssem as sementes da vida em nosso jardim?...
Dize-me, Jardineiro, que farás agora do teu jardim?
- Voltarei a ele, mestre... Afastarei dos canteiros as larvas e ervas
daninhas... Devolverei à terra a pureza e a benignidade de quando a recebi,
adubada pela sabedoria e experiência dos semeadores da Natureza.
- Sim, Jardineiro... volta ao teu jardim. Cultiva-o com carinho e prudência,
para que na próxima primavera tua colheita seja um poema de cores, perfumes e
luz, encantando a terra e os céus.
Dolores Bacelar