Reflexões Sobre a Mediunidade

Sabiamente, o emérito Codificador do Espiritismo constatou que a mediunidade é uma faculdade orgânica inerente a todos os seres humanos. Nada obstante, o fato de ser-lhe portador, não implica necessariamente em ter que a exercer quando não se apresente com um caráter ostensivo.

A faculdade natural é uma predisposição do organismo, que tem suas raízes no Espírito, como parte do seu processo evolutivo, adquirindo mais complexidade e enriquecimento das funções que o conduzem à transcendência.

Podendo manifestar-se na infância ou em qualquer período da existência física, merece estudos cuidadosos, de modo a atender a finalidade para a qual a Divindade a criou.

Nada obstante, todo aquele que pretenda educar as suas faculdades mediúnicas, deve antes aprofundar reflexões no estudo do Espiritismo, a fim de esclarecer-se sobre os valores reais da existência humana, a sua finalidade e os métodos mais compatíveis para desincumbir-se dos compromissos que foram assumidos antes da reencarnação.

O exercício de qualquer função requer esforços bem direcionados, de modo a adquirir a consciência em relação à mesma, do que resultarão os salutares efeitos em torno do empreendimento.

No que diz respeito à mediunidade que é em si mesma, amoral, será o comportamento do indivíduo que contribuirá para sua maior e melhor qualificação.

Quando os fenômenos não são expressivos, tendem a desaparecer, porque nem todos se encontram assinalados pela responsabilidade que o seu ministério exige.

Causa estranheza, não poucas vezes, que pessoas destituídas dos tesouros éticos recomendáveis recebam comunicações edificantes provenientes dos Benfeitores espirituais. É muito fácil, porém, entender-se o que ocorre. Desde que escasseiam aqueles que dispõem de mais amplas possibilidades, são usados os que as possuindo, lamentavelmente não se instrumentalizaram como deveriam.

Em uma emergência, em qualquer circunstância, à falta de servidores especializados, são usados quaisquer uns que possam contribuir em favor do bem-estar geral.

De maneira equivalente ocorre nas tarefas espirituais, nas quais, os Guias da humanidade aguardam melhores condições para interferir de maneira mais vigorosa em beneficio de todos.

Fundamentalmente, a mediunidade tem por objeto desvelar o mundo espiritual, a sua constituição, como são as condições ambientais, mas, por excelência, confirmar a imortalidade da alma e o que ocorre após a desencarnação e reflete-se em colheita no comportamento mental, emocional e moral vivenciados.

De resultados altamente relevantes para os seus portadores que, em geral, são Espíritos muito comprometidos com as Soberanas Leis, o seu exercício com abnegação oferece-lhes resistência contra as más inclinações que neles se demoram, ao tempo em que conquistam os tesouros do amor e da caridade que esparzem com os seus irmãos espirituais.

Sempre presente na história da humanidade desde priscas eras, foram os próprios imortais que a desvelaram aos deambulantes carnais, na intimidade das cavernas ou nos grandiosos mistérios dos templos de iniciação esotérica, sendo ocultada por fórmulas cabalísticas e rituais para a massa destituída de compreensão, portanto, exotérica.

Os livros sagrados de todas as doutrinas religiosas referem-se-lhe com denominações específicas, desde ontem como hoje, ornada de referências especiais, porém, com o mesmo significado e conteúdo.

Em especial a Bíblia, tanto no Velho como no Novo Testamento, apresenta-a de maneira clara e inequívoca, em momentos grandiosos, a partir dos extraordinários fenômenos produzidos por Moisés, desde o Egito antes de libertar o seu povo, como no deserto, no Monte Sinai, ao receber o Decálogo...

Todos os profetas eram médiuns portadores de alta inspiração, embora as paixões nacionais que aturdiam a alguns, culminando em Joel (2:28-29), quando afirmou: Acontecerá depois que derramarei o meu Espírito sobre toda a carne; vossos filhos e vossas filhas profetizarão, os vossos anciãos terão sonhos, os vossos mancebos terão visões; e também sobre os servos e sobre as servas naqueles dias derramarei o meu Espírito.

Posteriormente, Lucas, em Atos dos Apóstolos (2:17-18), repete as sábias palavras do venerando profeta.

Transcorridos dezenove séculos após a assertiva do amado discípulo de Paulo ao referir-se à mediunidade dignificada, Allan Kardec, o admirável codificador do Espiritismo, informou que a faculdade mediúnica se radica no organismo, confirmando a sua presença na carne, portanto, na constituição física de que se utiliza o Espírito imortal.

Se evocarmos o diálogo entre o rei Saul e a pitonisa do Endor em transe, o nobre Juiz repreende-o por havê-lo evocado por fútil motivo, em torno da guerra, a esse mesmo Saul, atormentado por Espíritos infelizes, que se acalmava ouvindo o canto e a música de Davi, voltando-se contra ele, em plena obsessão, violentamente, em razão da sua mediunidade atormentada e carregada de culpas... (I Samuel 28: 15 e ss)

Durante toda a trajetória no deserto, acostumados aos fenômenos no Egito, os judeus dedicavam-se a evocações frívolas e descontroladas, vendo-se Moisés compelido a proibir tal comportamento irregular, conforme se encontra exarado nas referências bíblicas. Não se tratava de impedimento das manifestações, mas do caráter das mesmas, que não devem ter finalidade vulgar, mas sim, revestir-se de caráter sério, quando ele próprio convocou setenta anciãos para ouvir o Senhor.

Nesse ínterim, conforme Números 11:26 a 29, dois homens na aldeia, Eldade e Medade, sentiram a presença do Espírito e começaram a profetizar, mediunizados.

De imediato, foi apresentada queixa a Moisés sobre essa prática e solicitação para que a proibisse, e o grandioso condutor, respondeu: Tens tu ciúmes por mim? Oxalá que do povo do Senhor todos fossem profetas, que o Senhor pusesse o seu espírito sobre eles!

Não bastassem esses fatos, e veremos o grande orientador aparecer ao Mestre, na inolvidável transfiguração no monte Tabor, (Mateus, 17:1 e ss, Marcos, 9:2-8, Lucas, 9:28-36) dialogando demoradamente, sendo visto e ouvido pelas testemunhas (Pedro, Tiago e João), assessorado por Elias, o inesquecível profeta, que houvera subido ao Céu em uma carruagem de fogo... (2 Reis 2-11)

Nas inesquecíveis pregações do apóstolo Paulo, o estoico divulgador de Jesus, o mesmo refere-se com segurança: Ora, há diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo. E há diversidade de ministérios, mas o Senhor é o mesmo. E há diversidade de operações, mas é o mesmo Deus que opera tudo em todos. A cada um, porém, é dada a manifestação do Espírito para o proveito comum. Porque a um, pelo Espírito, é dada a palavra da sabedoria; a outro, pelo mesmo Espírito, a palavra da ciência; a outro, pelo mesmo Espírito, a fé; a outro, pelo mesmo Espírito, os dons de curar; a outro a operação de milagres; a outro a profecia; a outro o dom de discernir espíritos; a outro a variedade de línguas; e a outro a interpretação de línguas. Mas um só é o mesmo Espírito que opera todas estas coisas, distribuindo particularmente a cada um como quer. Porque, assim como o corpo é um, e tem muitos membros, e todos os membros do corpo, embora muitos formam um só corpo, assim também é Cristo. (I Coríntios, 12:4-12)

Eis exarada uma página que parece haver sido retirada de O Livro dos médiuns, de Allan Kardec, quando estuda a diversidade das expressões mediúnicas, de efeitos intelectuais assim como de efeitos físicos.

É sempre o Espírito imortal que se manifesta sob a vontade do Senhor Jesus Cristo que administra o orbe terrestre.

Seja, porém, qual for a faculdade mediúnica, o seu exercício, por tratar-se de coisa santa, santamente, respeitosamente, deve ser executado com dignidade, a fim de atender aos elevados objetivos a que se encontra destinada.

Para ser logrado o mister básico da função mediúnica, a transformação moral do servidor toma-se essencial, trabalhando-se conscientemente para adaptar-se às injunções austeras que se fazem imprescindíveis para o desempenho feliz, a fim de lograr o estágio do mediunato.

A disciplina moral e a abnegação em todos os momentos tornam-se linhas de comportamento saudável para estar sempre às ordens do seu Guia espiritual, que conhece a programação traçada para o êxito da reencarnação.

A mediunidade, portanto, é um nobre investimento da Vida a benefício do Espírito reencarnado, que mais facilmente pode desenvolver as percepções da transcendência, sendo inspirado a desejar alcançá-la embora os percalços da jornada carnal.

O discernimento em torno das comunicações, a aceitação das mensagens, primeiro para si mesmo antes que para os outros, o reconhecimento de que, sendo médium, é apenas instrumento e não autor dos conteúdos que exterioriza, o bom senso para não se permitir envaidecer ou deslumbrar pelas mensagens de que se faz portador, tendo o cuidado de vigiar as nascentes do coração, são compromissos morais que ajudam a impedir as fascinações muito agradáveis ao ego.

O médium deve evitar a autopromoção através da faculdade, reconhecer a própria fragilidade e os riscos a que se encontra sujeito, em razão da delicadeza de que se reveste o ministério em que se encontra localizado.

A gratuidade dos labores mediúnicos é de capital relevância, a fim de atrair os Espíritos superiores, que se não subordinam aos favores materiais nem se sentem na obrigação de retribuir à clientela os benefícios monetários ou outros que sejam conferidos ao médium.

Na sua Primeira Epístola, no capítulo IV, versículo 1, adverte João Evangelista: Meus bem-amados, não creiais em qualquer Espírito, experimentai se os Espíritos são de Deus, porquanto muitos falsos profetas se têm levantado no mundo.

É meritório desconfiar-se sempre dos Espíritos que se apresentam pomposamente, ditando mensagens esdrúxulas e em tons proféticos, ou elogiosos ao círculo no qual se manifestam ou que se recusam e se negam à análise das suas mensagens, apresentando-se como seres inatingíveis... Tais são características de Espíritos que falseiam a verdade.

De igual maneira, cuidar-se para que as comunicações tenham sempre caráter universal e conteúdo moral relevante, evitando detalhes desnecessários nas suas informações, sempre objetivando o bem comum.

A perseverança no trabalho contínuo e sem aplausos, mantendo a simplicidade, tanto material do ambiente como espiritual do servidor, é essencial ao êxito do compromisso abraçado.

Médiuns pomposos são dignos de Espíritos semelhantes, que lhes insuflam a presunção, como se fossem indispensáveis à humanidade, que sempre tem vivido sem a sua presença.

Jesus, o Excelente Filho e Médium de Deus, apagava-se, a fim de que o Pai através dEle se fizesse conhecido, tornando-se-Lhe o Caminho para O encontrar.

A mediunidade, de acordo com o nível de consciência em que o seu portador se encontra, pode apresentar-se como verdadeiro tormento, tornando-se uma provação, mediante a qual o devedor expungirá os delitos do passado. É, portanto, muito natural que nas manifestações iniciais, o fenômeno seja perturbador, assinalado pelas presenças espirituais infelizes e odientas, que geram transtornos de comportamento e facultam estágios de obsessão.

A mediunidade será, então, de prova para o Espírito, que se deve enriquecer de valores morais, para poder saldar os débitos anteriores através da paciência, da conduta correta, da ação da benevolência e da caridade, inclusive em relação àqueles que se comprazem em inquietá-lo.

Noutras vezes, após a cuidadosa terapia espírita, a mediunidade em casos dessa natureza desaparece, porque a sua foi uma finalidade moral de aprimoramento para o indivíduo, e não um instrumento para continuada realização.

Médiuns há desde a infância, que requerem conveniente assistência dos pais, que lhes devem explicar, de maneira própria para o pensamento infantil, o de que se trata e como proceder, para evitar a criação de imagens mentais perturbadoras e fantasias, em vãs tentativas de eliminar os fenômenos, quase sempre inquietantes.

Não é conveniente tentar trabalhar a faculdade mediúnica nesse período da existência, antes, porém, aplicar as terapias fluídicas, especialmente da oração, da água fluidificada e dos passes, bem como do diálogo com os perturbadores desencarnados, obviamente sem a presença do infante, para auxiliá-lo, jamais levando-o a participar de reuniões especializadas em busca de soluções rápidas e improfícuas.

Pode ocorrer o desaparecimento da faculdade, à medida que há o desenvolvimento físico e emocional do paciente, sendo essa fase de ajustamento do ser reencarnante no corpo, em grande parte convivendo simultaneamente no mundo espiritual.

De igual maneira, não é lícito conduzir-se portadores de obsessões às sessões mediúnicas, na expectativa de que, através desse procedimento se torna mais fácil a recuperação do enfermo.

Melhor ter-se em vista que o mesmo necessite da enfermidade para readquirir a paz íntima que ficou ferida no passado. O atendimento deve ser orientado no sentido da sua transformação moral para melhor, com participação nas elucidativas palestras de orientação, conforme o esclarecimento doutrinário, a fim de que bem entenda o que lhe ocorre.

Instrumentalizado pelo conhecimento, de mais hábeis recursos dispõe o obsidiado para a convivência com o seu perseguidor, sua vítima de antes, auxiliando-o no procedimento do perdão e da reconciliação de grandíssima utilidade para ambos os litigantes enfermos.

Seriedade e edificação no trato com a mediunidade constituem elementos básicos para uma existência saudável e uma edificante maneira de atender aos compromissos programados pelos Mentores espirituais.

Sem qualquer tinta de sobrenatural ou mágica, o fenômeno mediúnico tem finalidade superior que não deve ser menosprezada.

O prazer em exercer a faculdade na charrua do bem faculta ao servidor a conquista da simpatia dos Espíritos nobres, que mais o assessoram, porque sabem que podem contar com a sua espontânea cooperação sempre quando for necessária.

Ponte entre o mundo físico e o espiritual, a mediunidade conduzida com responsabilidade proporciona bem-estar, alegria de viver, certeza da imortalidade e antecipada visão daquilo que espera mais tarde o seu possuidor.

Ao relatar as próprias experiências, os Espíritos comunicantes advertem gentilmente, quando explicam o que lhes ocorreu após a desencarnação, maneira feliz de ensinar com sabedoria o que se deve esperar após o portal do túmulo.

A desconsideração em torno da mediunidade apresenta vários riscos de natureza emocional, física e psíquica no seu portador.

O conhecimento do Espiritismo dá-lhe direcionamento seguro e estabilidade.

Alta responsabilidade, pois, cabe ao médium no desempenho da tarefa que lhe diz respeito, pela honra de conhecer a realidade da vida, ao conviver nas duas faixas vibratórias do mundo: o espiritual e o material.

Consciente da relevância do compromisso submete-se-lhe com imensa alegria, por saber que o sentido da reencarnação é a conquista da autoiluminação, seguindo os passos do Mestre e Senhor a quem tem a glória de servir.


Manoel Philomeno de Miranda