O Serviço de Investigação
O investigador policial, a propósito de problemas intrincados, é sempre uma
pessoa que deve educar os olhos para identificar o mal. Nos crimes obscuros, nos
furtos misteriosos, põe-se a campo, em busca dos verdadeiros culpados. Às vezes,
socorre-se da injustiça, até que o delinqüente apareça à luz meridiana,
confessando a própria falta. Seus esforços quase sempre são louváveis;
entretanto, como a justiça do mundo, em muitas ocasiões, é simbolizada por uma
deusa cega, a ternura fraternal não é característica de suas funções. É lógico
reconhecer que a sociedade humana não lhe dispensa o concurso. O “homem-lôbo”
ainda predomina entre as criaturas, depredando e assaltando, arruinando e
destruindo. Compreendemos, desse modo, quanto é imprescindível a fiscalização no
instituto da ordem social. O investigador, porém, a título de exercer fielmente
a missão que se lhe conferiu, timbra em afastar-se da piedade. É preciso
arrancar confissões, corrigir o mal, retificar o desvio e apagar, de vez, a
possibilidade de novos crimes. São atribuições ingratas, mas naturais e humanas,
em face dos desequilíbrios provocados pela perversidade deliberada. Em sã
consciência, o profissional da segurança pública não pode ser criticado, desde
que não procure estancar o sangue, derramando mais sangue, nem reprimir a
violência impulsiva com a violência organizada. O médico também faz amputações
difíceis e dolorosas e aplica o ferro candente a feridas de mau caráter. E as
chagas sociais exigem ânimo forte dos cirurgiões da polícia técnica. Não se pode
curar os golpes fundos da maldade voluntária com perfume de rosas sem espinhos.
Muita vez, é indispensável cortar e ferir, isolar e cauterizar.
Esse é um setor de benemerência da criminologia. Referimo-nos a minúcias
psicológicas do investigador, para demonstrar a elevação de sua tarefa na zona
que lhe é própria, valendo-nos, ainda, do ensinamento para algumas observações,
no serviço da espiritualidade superior.
Quantas vezes os companheiros de luta improvisam investigações, a pretexto de
caridade? Reúnem-se, forçadamente, em torno de médiuns, como detetives
arguciosos, procurando a pretensa maldade. Não lhes criticamos a observação
construtiva, mas lastimamos as péssimas condições de espírito com que recorrem à
experimentarão.
Não seria mais útil o adiamento da tentativa? e não será mais prudente, no
capítulo das gentilezas, que os amigos da doutrina e os médiuns de boa intenção
se abstenham de colaborar nesses intentos prematuros?
É um erro procurar os desencarnados esclarecidos à luz da Revelação Divina,
mantendo no coração propósitos apenas compreensíveis nos investigadores
policiais, que se valem deles, obrigatoriamente, no trato com os criminosos
contumazes.
Todos os que organizam sessões mediúnicas, com o objetivo de satisfazer aos
catadores de delinqüentes, não se acautelam contra os perigos a que se conduzem,
porque no plano invisível existem também entidades perversas, que não perdem
ensejo de participar de condenáveis aventuras; e o trabalho dos Espíritos
Superiores, nessas ocasiões, resume-se, quase, a preservar os pesquisadores
tirânicos da influência de perigosos malfeitores desencarnados, que respondem às
preocupações de ordem inferior que os assaltam.
A reunião mediúnica é também uma visita das almas encarnadas ao plano
espiritual. Elevam-se os companheiros terrestres, através do pensamento, para
que nos encontremos em “algum lugar”. Se o cooperador humano conta com
excelentes relações na esfera invisível, delas recebendo contribuições efetivas
de socorro e iluminação, como submeter os seus benfeitores distantes à
investigação de pessoas, respeitáveis embora pelo trabalho que realizam na
Terra, mas absolutamente despreparadas quanto às responsabilidades do espírito?
Entregaria o homem de bem, ao primeiro desconhecido que lhe visitasse a casa, as
intimidades do santuário doméstico, a pretexto de exemplificar a caridade
evangélica? Como esquecer comezinhos deveres de segurança do bem, se o próprio
Cristo recomendou aos seguidores que não lançassem pérolas a esmo?
É possível que muitos amigos nossos, ainda encarnados, obedecendo a impulsos de
excessiva afetividade, atirem a qualquer aventureiro adornado de títulos
exteriores as jóias da confiança e do otimismo que lhes foram doadas pelas
inteligências que habitam o Plano Divino. Mas nós outros, de olhos abertos e
vigilantes, diante do campo infinito da Vida, não podemos fazer o mesmo.
A caridade é a virtude sublime que salva, aprimora, enaltece e aperfeiçoa, mas a
imprudência, dissimulada por palavras lisonjeiras, não lhe pode arrebatar a
auréola fulgurante.
É razoável que os estudantes do Espiritismo evangélico não desprezem a análise
construtiva. É impossível viver às cegas num terreno tão claro, onde a liberdade
para discernir, como deusa da razão vitoriosa, não permite a soberania das
trevas interiores. Mas que ninguém converta ambiente de legítima fraternidade em
gabinetes policiais, onde os Espíritos Elevados devem comparecer como
delinquentes submissos. Procure-se a companhia desses Benfeitores, tendo o
espírito de alegria, serenidade e amor, com que se buscam as afeições generosas
e dignas da Terra. Os que não puderem proceder assim, adiem o cometimento, ainda
que estejam diante da insistência apressada dos melhores amigos, porque o
pensamento do homem, onde quer que se encontre, emite raios de atração, buscando
receptores adequados, e quem se reúne, procurando malfeitores e criminosos, há
de encontrá-los, tanto aí como aqui.
Irmão X