Coro de Preces

A pobre homem que desanimara
E se pusera, à beira do caminho,
Contando pedra, nuvem, charco, espinho,
Enrodilhado a pensamento vão,
O Céu determinou que ouvisse a Natureza,
E ele escutou, de alma surpreendida,
Vozes a sussurrar, entre as forças da vida,
Elevando-se a Deus em forma de oração.

Dizia a Luz, do Cimo Resplendente:
- Pai da Eterna Bondade,
Sinto a luta abismal das vastidões soturnas,
Trago em mim o clamor dos que gemem
Nas furnas...
Do sereno esplendor da altura a que me levas,
Envia-me, Senhor, a dissipar as trevas!...

O Vento anunciou, traspassando a ramagem:
- Deus da Piedade Imensa,
Vejo, ao longe, a aflição de enorme caravana,
Encharcada de pó na canícula insana...
Envia-me, Senhor, a envolve-la, de perto,
Desejo amenizar o calor do deserto.

A Fonte murmurou, no ápice de um monte:
- Pai de Infinito Amor,
Dói-me fitar no solo aspereza e secura
Comunicando fogo à lavoura insegura...
Envia-me, Senhor, dos cárceres da serra,
Para descer ao vale e defender a terra...

A Pedra suplicou, de elevada montanha:
- Pai de Misericórdia,
Observo, da rocha a que me agarro,
Homens construindo, em vão, sobre
Leitos de barro...
Comove-me anotar tanto esforço infecundo,
Envia-me, Senhor, a cooperar no mundo!...

A Árvore pedia
Para seguir além, nos próprios frutos,
De maneira a servir, dia por dia,
Tanto à fome dos bons, quanto à gana dos brutos...

Sentindo em si que toda a Natureza
Era um hino ao trabalho,
Entretecendo paz, alegria e agasalho,
A consumir-se em preces de louvor,
O pobre homem que desanimara
Sentiu sede de agir e transformar-se
Em centelha de amor...
Então, voltou à fé, alçando a fronte,
E, contemplando os Céus, de horizonte
a horizonte,
Gritou forte e feliz: Envia-me, Senhor!...


Maria Dolores