Homo

I
Ao meu tétrico olhar abominável,
O homem é fruto insólito da ânsia,
Heterogeneidades da Substância,
Argamassando um Todo miserável.

Psique dolorosa e inexpressável
Na mais remota epíspase da infância,
Desde a mais abscôndita reentrância
Da sua embriogenia detestável.

Do intravascular princípio informe,
Larva repugnante e vermiforme,
Nos íntimos recôncavos da placenta.

À aquietação dos túmulos inermes,
Era um feixe de mônadas de vermes,
Dissolvidos na terra famulenta.


II
Após a introspecção do Além da Morte,
Vendo a terra que os próprios ossos come,
Horrente a devorar com sede e fome
Minhas carnes em lúbrico transporte,

Vi que o “ego” era o alento flâmeo e forte
Da luz mental que a morte não consome.
Não há luta mavórtica que o dome,
Ou venenada lâmina que o corte.

Depois da estercorária microbiana,
De que o planeta triste se engalana
Nas grilhetas do Infinitesimal,

Volve o Espírito ao páramo celeste,
Onde a divina essência se reveste
Da substância fluída, universal.


Augusto dos Anjos