Porquê?

Enquanto o ônibus deslizava de Nova Iorque para Miami, Adolph Hunt, proprietário de extensos pomares da Flórida, dizia para o companheiro de poltrona.

- Imagine você, Fred, que andam veiculando por aí supostos recados do Espírito de meu pai, falando em virtude e regeneração... Aperfeiçoamento é negócio de tempo. Hoje em dia, qualquer menino sabe o que vem a ser evolução... Ora, se ninguém pode tirar a obra gradativa do progresso, para que essa máquina aparatosa de Espíritos e médiuns, fenômenos e mensagens que o Espiritismo pretende acionar, no mundo, em nome de Deus e de imaginários Mensageiros Divinos? Pode você dizer-me o que Deus tem lá com isso? Ou, ainda, que têm conosco os chamados Amigos Espirituais?

- O interlocutor, encorajado pela atenção de outros ouvintes, gargalhava irônico e chancelava:

- Eu também creio assim... Estamos com Deus ou com a evolução... Mediunidade é balela. Nem Deus e nem Espíritos interferirão com as leis da vida...

A conversa alongou-se, nesse tom, quando Adolph, chegado ao ponto de destino, veio a saber por um amigo que a sua maior estância havia sido varrida por violento furacão...

De pronto, valeu-se do automóvel e tocou para o sítio indicado e oh desolação! Centenas de árvores frutíferas, notadamente as laranjeiras de classe, jaziam mutiladas ou retorcidas, exigindo cuidados imediatos.

Terrivelmente surpreendido, ele, que acima de tudo amava o enorme pomar, convocou os filhos ausentes e os empregados de sua organização a trabalho reparador e, durante quatro dias compridos, nos quais ele próprio não descansou, a enorme chácara recebeu socorro e restauração.

Na quinta noite, após o desastre, quando pôde enfim entregar-se ao repouso, sonhou com o pai, a dizer-lhe com benevolente sorriso:

- Meu filho, se você, meus netos e os nossos cooperadores de serviço, imperfeitos como ainda são, se empenharam, com tanto carinho, pela salvação de um laranjal, porque negar a Deus, nosso Pai de Infinito Amor e aos Bons Espíritos, nossos Irmãos Maiores, o direito de se interessarem pela melhoria da Humanidade?

Adolph Hunt retomou o corpo físico e prosseguiu escutando a voz paterna a se lhe entranhar na acústica da alma:

- Porquê? Porquê, meu filho?


Hilário Silva