Pensamentos de Kardec

Em documento localizado entre os papéis deixados pelo Codificador Allan Kardec, e posteriormente publicado no livro Obras Póstumas (1), com o título Fora da caridade não há salvação, encontramos:
Estes princípios, para mim, não existem apenas em teoria, pois que os ponho em prática; faço tanto bem quanto o permite a minha posição; presto serviços quando posso; os pobres nunca foram repelidos de minha porta, ou tratados com dureza; foram recebidos sempre, a qualquer hora, com a mesma benevolência; jamais me queixei dos passos que hei dado para fazer um benefício; pais de família têm saído da prisão, graças aos meus esforços. Certamente, não me cabe inventariar o bem que já pude fazer, mas, do momento em que parecem esquecer tudo, é-me lícito, creio, trazer à lembrança que a minha consciência me diz que nunca fiz mal a ninguém, que hei praticado todo o bem que esteve ao meu alcance, e isto, repito-o, sem me preocupar com a opinião de quem quer que seja.
A esse respeito trago tranqüila a consciência; e a ingratidão com que me hajam pago em mais de uma ocasião não constituirá motivo para que eu deixe de praticá-lo. A ingratidão é uma das imperfeições da humanidade e, como nenhum de nós está isento de censuras, é preciso desculpar os outros, para que nos desculpem a nós, de sorte a podermos dizer como Jesus-Cristo: "atire a primeira pedra aquele que estiver sem pecado". Continuarei, pois, a fazer todo o bem que me seja possível, mesmo aos meus inimigos, porquanto o ódio não me cega. Sempre estenderei as mãos, para tirá-los de um precipício, para se se oferecer oportunidade.
Eis como entendo a caridade cristã. Compreendo uma religião que nos prescreve retribuamos o mal com o bem e, com mais forte razão, que retribuamos o bem com o bem. Nunca, entretanto, compreenderia a que nos prescrevesse que paguemos o mal com o mal.
Tais pensamentos revelam a nobreza de alma do grande pensador. Allan Kardec entregou sua vida a esses princípios, vivendo-o integralmente e tais princípios revelam a alma do Espiritismo, pois que a prática da caridade (aí compreendidos a benevolência ao próximo, o perdão das ofensas e a indulgência para com as fraquezas alheias) é a bússola que deve guiar o comportamento humano. E esta consciência deve conduzir-nos a aliviar as dificuldades alheias, fazendo o que estiver ao nosso alcance para fazer o bem.
Esta a proposta espírita, que aliada à renovação interior de cada um, trará reflexos a toda a sociedade que atualmente sofre os efeitos desastrosos do egoísmo e da indiferença. Somente a solidariedade será capaz de "consertar" tal estado de coisas. É isso que ainda não percebemos.

(1) páginas 337 e 338 da 21ª edição FEB


Orson Carrara