Imortalidade
No justo momento em que a técnica atinge as culminâncias, e o
homem sofre aflições sem termo, somos convidados a recordar Jesus-Cristo
exclamando: “Eu venci o mundo!”
A ciência vaticinou, para o século corrente, a morte das doutrinas
espiritualistas, tendo em vista a marcha natural do progresso intelectivo.
E em verdade, até à metade do século passado, a filosofia espiritualista não
passava de um amontoado de informação místicas e de arranjos dogmáticos
incapazes de competir com os sistemas filosóficos vigentes, resistindo aos
descobrimentos da ciência investigadora.
Coube a Allan Kardec a inapreciável tarefa de demonstrar, pela pesquisa
experimental, a realidade do fenômeno da imortalidade da alma. E, graças a isso,
o Codificador da Doutrina Espírita se destaca entre os vates do pensamento
universal, pelo gigantesco empreendimento de positivar, consoante os dados
oficiais da indagação, a continuação da vida além da morte.
A tarefa era, a princípio, sob todos os aspectos intratável, considerando-se a
posição da ciência ante os rudimentos da nascente Psicologia.
De um lado, o cientificismo pontificava arbitrário, e o empirismo, no outro
extremo, ditava leis falseadas sobre a verdade.
Kardec, porém, embrenhou-se no matagal das informações.
Não foi somente um coligidor dos informes dos Espíritos. Foi, antes de tudo, um
admirável garimpeiro da verdade, separando da ganga o ouro rebrilhante, na
mensagem eterna.
De 1854 a 1869, pesquisou, selecionou, reparou, fez acréscimos, sopesou e
apresentou uma doutrina que pudesse enfrentar o materialismo, justamente no
momento em que Engels e Marx iriam desdobrar os conceitos hegelianos,
favorecendo os aspectos dialético e histórico, já que o materialismo mecanicista
não podia resolver o problema fundamental da imortalidade por lhe faltarem os
elementos basilares para destruir a realidade da alma.
Com Hegel, o pensamento passou a ser uma função do cérebro, cuja atividade era
pensar, controlando as manifestações nervosas da vida.
Allan Kardec se distinguiu pela tarefa de demonstrar que o pensamento não é
apenas uma função do cérebro, sendo este a conseqüência de um pensamento
anterior que nele atua através de um outro cérebro mais sutil, comando geral e
força dinâmica mantenedora do equilíbrio: o psicossoma.
E acolitado por figuras da enfibratura de Crookes, Zölner, do caráter de
Lombroso e de Lodge que vieram a público, posteriormente, apresentar o resultado
das suas pesquisas, Kardec demonstrou, à saciedade, o sentido incontroverso da
imortalidade da alma, em experiências que se tornaram notáveis, realizadas mais
tarde, com o curso de médiuns do quilate de Florence Cook, Eusápia, Daniel Home...
A tarefa se avultava por estarem em jogo os sistemas do monismo e do dualismo.
Allan Kardec demonstrou também que o homem não é constituído apenas de duas
peças: o corpo e alma. Mas é formado por uma tríade de elementos: o espírito,
perispírito e matéria, sendo o perispírito encarregado de funções específicas na
engrenagem harmoniosa da vida hominal.
E quando o materialismo ateu, no seu aspecto dialético, veio a campo combater a
Doutrina Espírita, o Espiritismo, como escola filosófica, na sua feição
dialética, apresentava “O Livro dos Espíritos” como protesto nobre ao abuso e à
arbitrariedade das informações hegelianas, às doutrinas nele inspiradas, bem
como às velhas fisolofias espiritualistas sem fundamentação científica.
E a previsão da ciência, que aguardava para o século presente a morte das
doutrinas espiritualistas, faliu, porque o século XX, com os seus valiosos
descobrimentos e tirocínios, não pode retificar um único conceito da doutrina
postulada pelo gigante lionês que, na atualidade, se faz o maior antídoto aos
grandes males que afligem a Humanidade.
Como o materialismo é um veneno letal, o Espiritismo é o seu anticorpo,
preparado para diminuir ou dirimir os efeitos terríveis dos ódios organizados
secularmente e agora disseminados pelo ateísmo existencialista.
Enquanto o homem avança pelas trilhas do prazer, outros homensaparecem como
exegetas do trabalho e apóstolos da caridade, formando a mentalidade para o
Terceiro Milênio que colocará bem alto o estandarte da luz cristã refletida na
mensagem nobre da Doutrina Espírita.
E embora se previsse o soçobro das religiões no século XX, Allan Kardec,
semelhante a Copérnico, que veio por cobro às fantasias a respeito do sistema
solar, por também termos às superstições a respeito da imortalidade da alma,
arracando-a do sobrenatural e do dogma, retificando a sua feição mística, graças
à documentação experimental de que a bibliografia espírita é farta, enriquecendo
a ciência espiritualista para competir e esclarecer a ciência atual, ajudando-a
na busca da verdade.
Ante as dores que se acumulam inevitáveis para os próximos tempos, sem nos
desejarmos transformar em Parcas a tecerem a túnica mortuária da Civilização, o
Espiritismo é a grande esperança, porque afirma não ser a morte mais do que uma
grande transição para o despertamento na verdadeira vida: a Vida Imortal.
Pontifiquemos, desse modo, com Nosso Senhor Jesus-Cristo, o herói da sepultura
vazia, atendendo o programa da solidariedade universal, transferindo o sangue
novo da fé para os corações esfacelados pelo medo e acendendo em toda a parte a
lâmpada da convicção imortalista. Sigamos a trilha da verdade, cumprindo o nosso
dever para, vitoriosos, atingirmos o porto da nossa gloriosa Imortalidade.
Vianna de Carvalho