Nunca, a Sós
Não poucas vezes, no turbilhão da vida moderna de hoje, qual
aconteceu na monotonia dos dias transatos, a criatura humana tem a impressão de
que se encontra a sós, lutando contra a correnteza dos acontecimentos, que a
leva inapelavelmente na direção do abismo.
Falta de estímulo para continuar na faina pela conquista do pão, desinteresse
por si mesma, sofrimento interior sem aparente explicação, ausência de
compreensão dos amigos, frustração ante as ocorrências que esperava lhe fossem
favorecer com plenitude ou paz, tormentos íntimos perturbadores, são fenômenos
do dia-a-dia na agenda de incontáveis criaturas, que se sentem desamparadas e
solitárias...
A ausência de uma fé religiosa robusta que possa apontar o rumo da imortalidade,
abre espaço para comportamentos inquietadores, empurrando para a depressão e
para a revolta surda, silenciosa.
As aspirações materialistas, trabalhadas pelos conceitos de felicidade sem jaça
e de harmonia sem desafios, transformam-se em desencanto, gerando cepticismo a
respeito de qualquer conquista que possa equacionar esses transtornos,
submetendo-a ao açodar de ressentimentos da existência e das pessoas à sua
volta.
Enquanto o vozerio do prazer enganoso e a gargalhada estentórica da alucinação
no gozo imediatista, dominam as paisagens humanas, convidando ao afogamento dos
conflitos no mar tumultuado da embriaguez dos sentidos, mais aflição desencadeia
em quem se encontra em angústia por ausência de objetivo existencial.
Sucede que o homem da atualidade, após as conquistas externas que persegue, não
se preocupou quanto deveria pela autopenetração, descobrindo os valores que se
lhe encontram ínsitos, desenvolvendo-os e harmonizando-os com as aquisições de
fora. Priorizou demasiadamente a face material em detrimento da realidade
espiritual, agonizando, agora, nos favores do poder e do prazer, sem
preencher-se de paz, porquanto lhe ocorrem saturação e cansaço, enquanto
permanece com sede de realização íntima e de maior contato com a Vida em si
mesma.
Confundindo a transitoriedade do corpo com a eternidade do Espírito, desfruta
das sensações e das emoções do primarismo orgânico, sem as correspondentes
expressões da emotividade superior.
A arte, a cultura, a tecnologia, o pensamento filosófico, vinculados ao
impositivo de oferecer respostas imediatas, perdem em beleza o que adquirem em
agressividade, expressando o momento moral do planeta, conduzindo à excitação e
logo depois à exaustão, sem contribuírem com harmonia, esperança, alegria ou
paz.
Não se trata de uma observação pessimista, mas de uma constatação de resultados,
contabilizando-se a hediondez do crime e da violência que se multiplica em toda
parte, em prejuízo da cultura e da civilização.
No passado, quando a Humanidade estorcegava sob a chibata do Império Romano, que
dominava praticamente o mundo, e o abuso do poder aliado à desgovernança moral
dos indivíduos, fomentavam o sofrimento de milhões de outros, veio Jesus, que
inaugurou a Era da esperança, prometendo jamais deixar a sós quem quer que nEle
confiasse ou que se entregasse a Deus.
A partir de então, ninguém mais ficou em solidão.
Maria, a pecadora arrependida, que se Lhe dedicou, experimentou vicissitudes
diversas, mas nunca ficou ao desamparo.
Pedro, reconhecendo a loucura momentânea da negação, prosseguiu sem desânimo, e
jamais deixou de receber-Lhe a presença.
Saulo, tocado pela Sua misericórdia, transformou-se, tornando-se-Lhe arauto
incomparável, que O levou a quase todo o mundo do seu tempo.
João, que Lhe permaneceu fiel, prosseguiu amparado, e narrou-Lhe a saga
incomparável, visitado pelo Seu psiquismo afável e inspirador.
Mais tarde, Agostinho, travando contato com o Seu pensamento, renovou-se, e
fez-se piloti de segurança da Sua mensagem.
Francisco Bernardone, fascinando-se pelo Seu convite, experimentou padecimentos
incessantes, nunca, porém, a sós...
Terezinha de Lisieux, tocada pela Sua palavra, dedicou-Lhe a rápida juventude,
experimentando o Seu apoio.
Tereza de Calcutá, em Sua homenagem, tomou a cruz dos sofrimentos humanos e
carregou-a nos ombros frágeis até o fim da existência, sentindo-Lhe a força
revigorante.
... E milhares de outros exemplos, que se Lhe vincularam, conseguiram enfrentar
todas as vicissitudes, sem perder o entusiasmo ou jamais recear, com a Sua
companhia.
Experimenta, por tua vez, identificar-te com Jesus, penetrar-lhe os
ensinamentos, reflexionar nele, assimilá-los, aplicando-os ao comportamento, e
verificarás que uma transformação vigorosa se operará em teu ser interior,
propiciando-te coragem e valor para prosseguires sem qualquer desânimo ou
perturbação.
E quando te advierem as lutas e os testemunhos, que são inevitáveis na economia
espiritual de todos os seres que rumam na direção do Infinito, e que não te
pouparão, nEle encontrarás amparo e estímulo para o prosseguimento com incomum
alegria, aquela que caracteriza todo aquele que se encontra viajando na direção
do Grande Lar, e esperam o momento da chegada feliz.
Desse modo, não fujas do mundo nem te atires a ele, buscando soluções que nessa
conduta não encontrarás.
Reconsidera, portanto, as tuas atuais atitudes, e experimenta renovação com
Jesus, facultando-te uma nova oportunidade para enriquecer-te de alegria de
viver e poderes expandir o teu pensamento e as tuas realizações.
Quem O visse na cruz, naquela tarde funesta e tenebrosa, entre dois ladrões e
sob a zombaria dos trêfegos e aturdidos do mundo, pensaria que estava diante de
um vencido e abandonado, que a morte logo iria colher. No entanto, Ele estava em
vinculação estreita com Deus, muito além das percepções humanas, cercado por
legiões de cooperadores espirituais do Seu reino, preparando-Se para a
libertação, a fim de logo mais retornar em gloriosa ressurreição, demonstrando a
Sua e a imortalidade de todas as criaturas.
Desse modo, quando te sintas em abandono, aparentemente desamparado e sem
amigos, sob sofrimentos e angústias, pensa em Jesus, e jamais experimentarás
solidão.
Joanna de Ângelis