O Sermão do Monte
"E Ele, abrindo a sua boca, os ensinava...” Mateus - Cap. V -
vers. 2.
Abria a sua boca para ensinar: - era um Mestre.
Nem os poetas do Lácio nem os filósofos gregos deixaram na terra tanta sabedoria
e ternura.
Sua palavra não era como a palavra de todos, que não perfuma sem ferir nem
ampara sem se orgulhar. Ao seu redor - quando Ele falava - surgia aquele
silêncio solene que não se confunde com a ausência do ruído, porque é o silêncio
da alma que escuta e aprende...
Queria falar com todos. Mas os que se assentavam, no banquete da vida, nos
lugares reservados pelas convenções da aparência, temiam ouvi-lo. Fechavam as
portas à sua passagem, não o fitavam nos olhos, gritavam-lhe de longe, numa
reação contínua àquela irresistível e luminosa influência. Sequiosos de
misericórdia, sedentos de paz, infelizes e aflitos, fugiam como inimigos para
não se curvarem diante de seus pés descalços.
Toda Israel nutrira-se da privilegiada esperança de ver chegar o "Príncipe da
Paz", o "Pai do futuro século" - o que traria a espada do Deus dos Exércitos
para definir ao mundo o significado de povo eleito.
Entretanto, Jesus caminhava quase só, incompreendido e evitado.
Isaías, o suave médium, filho de Amos, profetiza com acerto: - "Conheceu o boi o
seu possuidor, o jumento o presépio do seu dono, mas Israel não me conheceu e o
meu povo não entendeu".
O grande Mestre abria a sua boca para ensinar o mistério da vida. Só os humildes
de espírito o ouviam.
Os repetidores dos ensinos de Jesus, enfatuados de orgulho e perdidos no
labirinto das palavras inúteis, não souberam reter-lhes a sabedoria e têm sido
superados pela lógica mais simples.
Porém, as palavras que os quadros naturais e os homens simples da Palestina
receberam dos lábios divinos, ficaram plasmadas na terra modificando-lhe a
estrutura íntima. A força do Verbo Divino alimentou o éter e permaneceu como a
mensagem eterna, ouvida em qualquer tempo, pelos que a buscam diretamente com os
sentidos do espírito.
Senhor, nós, os tímidos cristãos de hoje, quanta vez olvidamos a herança que
deixaste aos que te querem seguir. Também nossa palavra é eterna. É força que
constrói sem interrupção ou fogo permanente que consome. Fomos chamados ao teu
divino colégio para sermos pequeninos verbos da vontade dos céus, porém,
transitando sem pressa das trevas para a luz, produzimos palavras levianas e
malévolas. Felizes em aprender, não abrimos nossa boca para ensinar, do pouco
que sabemos. Vemos o cortejo triste dos corações mortos, dos que agonizam de
fome ou de dor perante nós, dos que morreram de sede ao nosso lado: - não lhes
demos da água viva, não repartimos o pão.
Através dos tempos, na grande Israel que se estendeu sobre o mundo, temos
semeado a revolta, fomentado a intolerância, instigado a incompreensão,
provocado a desarmonia, impedido a união, em teu nome, com as armas da palavra.
Ainda somos dos grandes, dos soberbos, dos que não te fitam de frente recuando à
imperiosidade de curvar diante de teus pés descalços?
Mestre, Santo dos Santos, Sábio dos Sábios, em qualquer tempo, só os humildes te
ouvem até o fim e te compreendem para sempre.
Nancy Puhlmann di Girolamo