Passe Diferente
Indispensável estudar o Espiritismo. A Doutrina Espírita,
síntese da Religião, é sagrado binômio de evolução psíquica, cuja dinâmica
poderemos conceituar como: Jesus iluminando o coração e Kardec ilustrando o
raciocínio.
Vez por outra, porém, repontam teorias de arribação.
No campo do passe, a exemplo, muitos corações já foram assaltados por inusitadas
e alienígenas informações, estranhas à simplicidade profunda da Doutrina
Espírita.
Produzem estas inquietudes:
- Na doação de energias aos que sofrem, na operação de substituir a molécula
malsã por uma sã, estaríamos operando com o passe magnético ou espiritual? Que
categoria de passes serviria a este ou àquele enfermo? Quem transmite passe ao
adulto, poderá fazê-lo à criança?
O impasse poderá levar-nos a titubear.
Em verdade, contudo, no Espiritismo sempre foi muito claro que a transfusão
ocorrida num passe é sempre de natureza fluídica. E o fluido e o elemento
primitivo do corpo carnal e do perispírito, os quais são simples transformações
dele" (1).
A ação magnética ou espiritual provém de uma só fonte.
Há, no mundo, reprisamos, um único elemento primitivo, o fluido universal, sendo
todos os corpos, todas as formas vivas ou inanimadas, todas as manifestações de
vida, mera variedade de condensação ou coesão da mesma energia.
A própria Ciência, hoje energética, consagra a unidade.
No considerar o tema, em "A Gênese", Kardec desce a detalhes, esclarecendo que a
ação do passe pode produzir-se de muitas maneiras. Alinha as três fundamentais:
Pelo próprio fluido do passista;
Pela atuação direta de um Espírito, sem o concurso do passista (beneficiando
todos os necessitados, independentemente de sua crença religiosa, de seu grau
evolutivo, inclusive sem o conhecimento e o reconhecimento dos beneficiários);
Pelos fluidos que os Espíritos derramam sobre o passista, imprimindo ao fluido
natural do passista qualidades de que ele carece.
Na falta do termo passista, tão comum na atualidade espírita brasileira, Kardec
os denominava magnetizadores, a fim de diferenciá-los dos médiuns de cura. A
mediunidade de cura é "o dom que possuem certas pessoas de curar pelo simples
toque, pelo olhar, mesmo por um gesto, sem o concurso de qualquer medicação"
(2).
Hoje, os magnetizadores são chamados passistas.
Observemos, ainda, que a participação de um Espírito, na doação do passe, não se
reconhece pela sua manifestação ostensiva, isto é, pela precipitação do fenômeno
de incorporação ou de psicofonia ou de efeito físico. A participação é esse
"derramar de fluidos, imprimindo ao fluido natural do passista as qualidades de
que ele carece".
Ainda em "O Livro dos Médiuns" (3), Kardec formula nove questões, cujas
respostas aclaram definitivamente o tema. Dentre elas, destacamos apenas uma:
Entretanto, o médium é um intermediário entre os Espíritos e o homem; ora, o
magnetizador, haurindo em si mesmo a força de que se utiliza, não parece que
seja intermediário de nenhuma potência estranha.
R. É um erro; a força magnética reside, sem dúvida, no homem, mas é aumentada
pela ação dos Espíritos que ele chama em seu auxílio. Se magnetizas com o
propósito de curar, por exemplo, e invocas um bom Espírito que se interessa por
ti e pelo teu doente, ele aumenta a tua força e a tua vontade, dirige o teu
fluido e lhe dá as qualidades necessárias.
A clareza, aí, é gritante!
O passe é sempre o passe.
Gestos, postura física, ginásticas rítmicas, rituais na operação do passe, são
meros hábitos alimentados pelos passistas ou pelos que os instruíram.
Originam-se da superstição que "pode emprestar virtudes quaisquer a certas
palavras (ou atos) e somente Espíritos ignorantes ou mentirosos podem alimentar
semelhantes idéias, prescrevendo fórmulas" (4). O parêntese é nosso.
Uma classificação de passes, para atender este ou aquele enfermo, físico ou
espiritual, só seria possível se conhecêssemos e pudéssemos manipular a "química
dos fluidos". Quem, porém, entre nós, se aventuraria a afirmar conhecer a
natureza intrínseca dos fluidos, a ponto de combiná-los, alterá-los,
transubstanciá-los, se deles só sabemos que existem por seus efeitos?
Serão bons ou maus, de acordo com nossos pensamentos.
Nenhum de nós, todavia, vai além dessa noção rudimentar, embora preciosa. Não
que estejamos proibidos de pesquisar. Ocorre que estamos impedidos, nesse campo,
pelas atuais limitações de nossos sentidos e por falta de aparelhagem apropriada
para suprir-nos as deficiências da espécie.
Salvo fantasias primárias, de extremo mau gosto, nunca deveremos repletar esse
belo departamento do Espiritismo com afirmações apressadas, levianas até,
querendo criar escolas à parte, tão-somente pelo prazer de passear nossa vaidade
entre os homens.
Sendo a essência da constituição infantil exatamente a mesma da do homem adulto,
todo argumento que se articule para justificar a existência de 'F passistas
infantis" e um artificialismo próprio de quem ignora ou faz ignorar as leis
espirituais que Kardec examinou e reexaminou, no contexto da Codificação.
A mãe, acariciando o filho, transmite-lhe fluidos, da mesma forma que ao
acariciar o companheiro de sua caminhada terrena.
Poderemos ter preferência pelas crianças, num atendimento de tendências
pessoais; nunca, porém, porque os fluidos que se destinam à infância sejam,
fundamentalmente, diversos dos que se canalizam para o adulto.
O passista não possui poderes mágicos.
Se algumas vezes, por intuição do Espírito que nos orienta no passe, somos
informados do órgão enfermo, não se faz necessário que saiamos da simples
imposição da mão. No centro do cérebro localiza-se a glândula chamada epífise, o
leme da alma, que reabastece e mantém o equilíbrio fluídico de todos os
departamentos do organismo. Envolvê-la nas radiações fluídicas equivale a
aplicar uma injeção, cujo líquido circulará por todo o corpo, através das
correntes sangüínea, até atuar sobre a parte' desequilibrada.
O efeito salutar do passe - é desnecessário encarecer, por muito conhecido de
todos fica sempre na dependência do quadro espiritual do assistido. Ele, o
assistido, é quem determina, não raro contra a boa vontade do agente
transmissor, a renovação ou a repulsão dos fluidos.
É uma questão de afinidade.
Jesus, definindo tal dependência e alertando-nos de que a regeneração física ou
psíquica da criatura é obra dela mesma, embora com o amparo de outros', diante
de cada cura operada enunciava com clareza e convicção:
- A tua fé te salvou.
Não era uma afirmação convencional de humildade.
Sabia o Mestre, esclarece-nos o Espiritismo, que sem um campo propício para
restabelecer-se, criado pela mente do enfermo, nenhuma regeneração se opera.
Vale, sempre, reler Kardec.
Não deveremos tornar obscuros princípios claros.
A beleza da Doutrina reside no seu retorno à verdade do Evangelho,
desvestindo-se das alfaias humanas e rompendo com os elos que nos escravizavam
ao primarismo espiritual milenar.
Toleremos as teorias diferentes, mas não vivamos com elas.
Bibliografia
"A Gênese", de Allan Kardec, cap. XIV, item 31.
"O Livro dos Médiuns", Allan Kardec, questão 175.
'Idem, ibidem questão 176.
Idem, Ibidem, questão 176, item 9.
(Passe e Passista – Ed. Luz no Lar)
Roque Jacintho