Para Conquistar a Verdadeira Liberdade

No belo livro “Jesus no Lar”(1) Neio Lúcio relata-nos acontecimentos da intimidade de Jesus com os discípulos, em casa de Pedro, no seu humilde lar de Cafarnaum.
No episódio narrado em seu Capítulo 3, “Sara, a esposa de Benjamim, o criador de cabras”, apresenta ao Mestre uma questão que interessa a todos nós:

“— A idéia do Reino de Deus, em nossas vidas, é realmente sublime; todavia, como iniciar-me nela?(...)
Eu desejaria ser fiel a semelhantes princípios, mas sinto-me presa a velhas normas. Não consigo desculpar os que me ofendem, não entendo uma vida em que troquemos nossas vantagens pelos interesses dos outros, sou apegada aos meus bens e ciumenta de tudo o que aceito como sendo propriedade minha. (...)

—Sara, qual é o serviço fundamental de tua casa?

—É a criação de cabras — redargüiu a interpelada, curiosa.

—Como procedes para conservar o leite inalterado e puro no benefício doméstico’

—Senhor, antes de qualquer providência, é imprescindível lavar, cautelosamente, o vaso em que ele será depositado. Se qualquer detrito ficar na ânfora, em breve todo o leite se toca de franco azedume e já não servirá para os serviços mais delicados.

Jesus sorriu e explanou:

—Assim é a revelação celeste no coração humano. Se não purificamos o vaso da alma, o conhecimento, não obstante superior, se confunde com as sujidades de nosso íntimo (...).

—O orvalho num lírio alvo é diamante celeste, mas, na poeira da estrada, é gota lamacenta.” (...)

Valorizamos o asseio exterior: água limpa; alimento lavado; roupa imaculada; casa varrida e arejada. Certamente que o asseio exterior é agradável e necessário.
Mas, e o nosso íntimo? E os nossos maus hábitos físicos e mentais?
Para limpar o primeiro e renovar os últimos, é indispensável esforço diário: lavar pensamentos; corrigir sentimentos; substituir maus hábitos por outros saudáveis; adquirir virtudes; praticar ações nobres e alimentar sadias aspirações.
Nós nos dizemos cristãos, mas não estudamos os ensinos de Jesus. Muito menos buscamos vive-los. Temos posição acomodatícia e superficial, relativamente à religião, qualquer que seja aquela que dizemos professar. Essa forma de pensar e agir nos tem mantido jungidos aos sofrimentos, em muitas encarnações, escravos de paixões e deslizes, pelo descumprimento das Leis de Deus.

“Roteiros não nos faltam para conquistarmos a verdadeira liberdade. Ela se dará, efetivamente, através da reforma íntima — tarefa inadiável, que compete exclusivamente a nós”

Em nossas vidas há muitas doenças, físicas ou mentais, que existem em função dos maus hábitos alimentares ou de pensamentos. Por isso, em certos casos, os remédios não nos curam.
Emmanuel (2) nos lembra:
“A maioria das moléstias procede da alma, das profundezas do ser. Não nos reportando à imensa caudal de provas expiatórias que invade inúmeras existências, em suas expressões fisiológicas, referimo-nos tão somente às moléstias que surgem, de inesperado, com raízes no coração.
Quantas enfermidades pomposamente batizadas pela ciência médica não passam de estados vibratórios da mente em desequilíbrio?
Qualquer desarmonia interior atacará naturalmente o organismo em sua zona vulneráveL Um experimentar-lhe-á os efeitos no fígado, outro, nos rins e, ainda outro, no próprio sangue.
Em tese, todas as manifestações mórbidas se reduzem a desequilíbrio, desequilíbrio esse cuja causa repousa no mundo mentaL” (Grifamos.)
É ainda o amoroso Mentor espiritual quem nos admoesta:
“(...) Sem que teu pensamento se purifique e sem que a tua vontade comande o barco do organismo para o bem, a intervenção dos remédios humanos não passará de medida em trânsito para a inutilidade.”
A evolução é, pois, competência nossa. E é um processo de duração ilimitada. Não se dá aos saltos, nem por ações dos outros. Se nos empenhamos, podemos acelerá-la, queimando etapas e evitando quedas desnecessárias; se nos acomodamos, mantemo-nos na retaguarda; e a dor — aguilhão que é argumento irretorquível — incumbe-se de nos retirar do círculo vicioso de erros e expiações dolorosas, buscando compelir-nos à caminhada.
Para evoluir conscientemente e assumir a direção de nosso destino, é fundamental o estudo e a vivência das lições de Jesus. Dizemo-nos cristãos, mas não nos aplicamos a conhecer sua doutrina de amor. Não buscamos vivê-la.
Desde o século passado, conta­mos com a Doutrina Espírita, manancial de luz — Consolador prometido pelo Mestre —, reavivando seus ensinamentos, traduzindo-os em linguagem moderna, de cristalina clareza. Aqueles que a conhecemos e estudamos, não teremos de que nos queixar nem justificativas a apresentar quando prestarmos contas de nossas vidas, se permanecermos escravos das paixões, dos vícios, e omissos diante da urgente tarefa a realizar: a reforma de nós mesmos.
Devemos estabelecer metas: para um semestre, para um ano. Por exemplo: neste mês, vou cuidar de eliminar tal defeito e de adquirir tal virtude.
Olivro “Manual Prático do Espírita” registra considerações importantes do autor, Ney Prieto Peres (4), relativas à reforma íntima:

1. O que é Reforma Intima? É um processo contínuo de autoconhecimento (...) modelando-nos progressivamente na vivência evangélica (...).

2. Por que a Reforma Íntima? Porque é o meio de nos libertarmos das imperfeições (...).

3. Para que a Reforma Intima? Para transformar o homem e, a partir dele, toda a humanidade (...).

4.Onde fazer a Reforma Íntima? (...) dentro de nós mesmos (...).

5.Quando fazer a Reforma Íntima? O momento é agora e já; não há mais o que esperar.

6. Como fazer a Reforma Íntima? (...) um dos meios mais efetivos é o ingresso numa Escola de Aprendizes do Evangelho (...).

Enumera, ainda, nas páginas 185-186, uma série de virtudes que devemos adquirir, em contraposição a vícios que devemos extirpar de nosso íntimo. O livro é, realmente, autêntico manual de reforma íntima e, assim, merece ser lido, estudado, vivido.
Na resposta à Questão 919 de “O Livro dos Espíritos”, Agostinho nos dá um roteiro de como estabelecia, diariamente, suas metas de melhoria íntima, avaliando-se, ao findar de cada dia.(5)
Roteiros, portanto, não nos faltam para conquistarmos a verdadeira liberdade. Ela se dará, efetivamente, através da reforma íntima — tarefa inadiável, que, repetimos, compete exclusivamente a nós.
Mãos à obra, pois o Mestre espera por nós há mais de dois mil anos... Até quando o faremos esperar?

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1 — “Jesus no Lar”, Neio Lúcio/Francisco C. Xavier, Cap. 3, pág. 23, 20ª ed. FEB.
2 — “Vinha de Luz”, Emmanuel/Francisco C. Xavier, Cap. 157, pág. 329, 13ª ed. FEB.
3 —“Pão Nosso”, Emmanuel/Francisco C. Xavier, Cap. 51, pág. 114, 16ª ed. FEB.
4 — “Manual Prático do Espírita”, Ney Prieto Peres, págs. 19-20, 8ª ed. Pensamento.
5 — “O Livro dos Espíritos”, Allan Kardec, Parte 3ª, Cap. XII, pág. 423, 76ª ed. FEB.


Gebaldo José de Souza