Ante o Divino Mestre
Senhor Jesus!
Grandes reformadores da vida religiosa passaram no mundo antes de ti.
Sacerdotes chineses e hindus, persas e egípcios, gregos e judeus referiam-se à
Lei, traçando diferentes caminhos às cogitações humanas.
Um dos maiores de todos, Moisés, viveu entre príncipes da ciência, fez-se
condutor de multidões, plasmou sagrados princípios de justiça e, após sofrer as
vicissitudes de sua época, expirou no monte Nebo, contemplando a gleba farta que
prometera ao seu povo.
Outro Senhor, o grande Siddharta, converteu-se em arrimo dos penitentes da
Terra, ensinando a compaixão, depois de renunciar, ele próprio, o
Bem-aventurado, às alegrias do seu palácio, para morrer, em seguida a sublimes
testemunhos de simplicidade e de amor, entre flores de Kucinagara...
Todos eles passaram, induzindo os homens à solidariedade e ao dever, exalçando o
coração e purificando a inteligência.
Profetas hebreus numerosos antecederam-Te os passos, esboçando o roteiro da
luz...
Alguns deles encontraram o escárnio e a flagelação em lutas enormes, confinadas,
porém, ao âmbito particular do povo a que serviam.
Nenhum, no entanto, acendeu tantos conflitos com o mandato de que se faziam
intérpretes, quando confrontados contigo, a quem se negou um lar para nascer.
Por onde passaste extremavam-se as paixões.
Contrapondo-se ao carinho que Te consagravam as almas simples de Cafarnaum,
recebeste o ódio gratuito dos espíritos calculistas de Jerusalém.
Em Tua entrada, aglutinaram-se a fraqueza e a ingratidão, a crueldade e a
secura, tecendo a rede de trevas na qual Te conduziram à cruz entre malfeitores.
Em oposição à tranqüilidade silenciosa que se estendeu sobre a morte dos grandes
enviados do Céu que Te precederam, de Teu túmulo aberto ergueu-se a mensagem da
eternidade, gritante e magnífica, pela qual os Teus seguidores experimentaram a
perseguição e o sacrifício, em trezentos anos de sangue e lágrimas nos cárceres
de martírio ou na humilhação dos espetáculos públicos...
É que não apenas ensinaste a bondade, praticando-a impecavelmente, mas revelaste
os segredos da morte.
Conversaste com as almas desencarnadas padecentes, através dos enfermos que Te
procuravam, transfiguraste as próprias energias no cimo do Tabor, dando ensejo a
que se materializassem, diante dos discípulos extáticos, Espíritos gloriosos de
Tua equipe celeste.
Reabriste os olhos cadaverizados do filho da viúva de Naim e trouxeste de novo à
existência o Espírito de Lázaro que se achava distanciado do corpo inerte,
encarecendo e exaltando a responsabilidade da criatura, que receberá sempre de
acordo com as próprias obras.
Agarrados à posse efêmera da estação terrestre, os homens não Tr perdoaram a
Revelação inesquecível e Te condenaram à morte, buscando sufocar-Te a palavra,
olvidando que a Tua doutrina, marcada de amor e perdão, já se havia incorporado
para sempre aos ouvidos da Humanidade. E, retomando-lhes o convívio,
ressuscitado em Tua forma sublime, mais lhes aumentaste o espanto da consciência
entenebrecida.
Desde então, Senhor, acirrou-se a antinomia entre a luz e a treva...
Os Teus apóstolos exibiam fenômenos mediúnicos maravilhosos, arrebatando a
admiração e o respeito da turba que os cercava, mas bastou que no dia de
Pentecostes transmitissem os ensinamentos dos desencarnados, em diversas
línguas, para que fossem categorizados por ébrios que o vinho fazia desvairar.
Enquanto Paulo de Tarso, inspirado, se detinha na Acrópole sobre os grandes
temas do destino, conquistava a atenção dos atenienses ilustres, mas bastou que
aludisse à ressurreição dos mortos, para que fosse abandonado por todos eles à
zombaria e a solidão.
E ainda hoje, Mestre, anotamos por toda a parte o terror da responsabilidade de
viver.
Quase todos os homens aceitam o apoio da religião, sempre que se lhes lisonjeie
a inferioridade e se lhes endossem os caprichos no culto externo, prestigiando
as autoridades de superfície que lhes desaconselhem pensar.
Acreditam comprar o Céu a preço de oferendas materiais ou de atitudes estudadas
na convenção e imaginam que esse ou aquele inimigo está reservado aos tormentos
do inferno. Entretanto, se alguém lhes recorda a realidade, mostrando a morte
como prosseguimento da vida, com a exação da Lei que confere a cada criatura o
salário correspondente aos próprios atos, azeda-se-lhes o fervor, passando a
abominar quantos lhes sacodem a mente entorpecida. E agora, como antigamente,
associam rebelião e vaidade para asfixiar o verbo revelador onde surja.
Improvisam tentações e pavores ao redor daqueles que se dedicam à verdade, e, se
esses lhes não caem nas armadilhas e se lhes não temem as ameaças, empreendem
campanhas lamentáveis, em que a difamação e o ridículo funcionam por golilhas
atrozes nas gargantas que desferem a palavra divina do Teu Evangelho Libertador.
Aos espíritas, Senhor, que Te exumam as lições do acervo de cinzas do tempo,
cabe agora o privilégio de semelhantes assaltos. Porque se reportam à
responsabilidade da criatura, no campo da vida eterna, e porque demonstram que a
sepultura é portal da imortalidade, são conduzidos ao pelourinho da execração,
caluniados e escarnecidos.
Como se lhes não possa interromper a existência, a fio de espada,
emudecendo-lhes a mensagem de luz, pisa-se-lhes o coração na praça pública com
as varas da mentira e do sarcasmo, para que o desânimo e o sofrimento lhes
apressem o fim.
Mas sabemos que tu, Senhor, és hoje, como ontem, o Herói do Túmulo Vazio...
Aqueles que Te colocaram suspenso na cruz, por Te negarem residência na Terra,
não sabiam que Te alçavam mais alto a visão para que lhes observasses os
movimentos na sombra.
Mestre Redivivo, que ainda agora enches de terrível assombro quantos estimariam
que não tivesses vivido entre os homens, fixa Teu complacente olhar sobre nós e
aparta-nos da treva de todos os que se acomodam com a saliva da injúria! E
revigora-nos a consolação e a esperança, porque sabemos, Senhor, que como
outrora, antes os discípulos assustados, estarás com os Teus aprendizes fiéis,
em todo instante da angústia, exclamando, imperturbável:
- “Tende bom ânimo! Eu estou aqui.”
Irmão X