Órfãos
Débeis flores de agora são os frutos do amanhã.
Gemas espalhadas na ganga carnal pelas generosas mãos do renascimento são as
jóias que fulgirão ao sol do futuro.
Raios de luz emboscados em névoa, ao se espraiarem, espalharão claridade na
noite do porvir.
Sutis aromas detidos em toscos vasilhames esperam amplidão para perfumar mais
tarde.
Canoras vozes do céu caladas em instrumentos sem vibração aguardam regentes
amorosos a fim de formarem o coral de exaltação à vida depois.
Companheiro: aguce os ouvidos para registrar-lhes os débeis gorjeios de hoje e
acure a vista para descobri-los no pó da terra!
Órfãos de carinho como órfãos de pais, não são, porém, órfãos do amor de Nosso
Pai, que vela por todos nós.
Escondidos nas pilhas da miséria humana, de roupas orgânicas despedaçadas e sem
os tesouros da alegria, são olhos miúdos e ansiosos que espionam sua casa cheia
de vida e festa, esperando por você...
Sob tetos de injúria e a braços com a criminalidade que os sitia em todo lugar,
são o que deles você tem feito, a seguirem-no de perto...
Você se diz sem recursos, alega cansaço, crê ser inútil fazer algo por eles e
harmoniza a consciência com a voz do egoísmo e da indiferença, seguindo
tranqüilo... Eles, porém, vêm atrás de você.
Faça algo com a moeda-bondade em favor deles.
Se não lhe podem retribuir hoje, aguarde um pouco mais.
Quem veja a sequóia pequenina e frágil não acreditará que ela pode vencer
tranqüilamente três milênios, imperturbável.
Tome essas gemas sem engaste e lapide-as pela educação e pela evangelização,
tornando-as um fulgurante diadema para adornar a humanidade pelos caminhos sem
fim do tempo.
E considere, conforme preceitua o Evangelho Segundo o Espiritismo, “que muitas
vezes a criança que você socorre lhe foi cara noutra encarnação, caso em que, se
pudesse lembrar-se, já não estaria praticando a caridade, mas cumprindo um
dever”.
Amélia Rodrigues