As Pesquisas Psíquicas Pós Kardec
(“Vida e morte: o homem no labirinto da eternidade”, tese de
doutorado. Departamento de História do Instituto de Filosofia e Ciências
Humanas, UNICAMP, 1993; pp. 183-190).
Charles Richet, fundador da Metapsíquica, divide a evolução histórica dos
fenômenos parapsíquicos no Ocidente em quatro períodos, a saber:
- Período mítico: se estende da mais remota antiguidade até Mesmer e suas
doutrinas sobre magnetismo animal (1778);
- Período magnético: vai de Mesmer (1778) às irmãs Fox (1847). Mesmer introduz o
‘fluido’ e o sonambulismo artificial (hipnose), primeiras noções da percepção
extra-sensorial;
- Período espirítico: das irmãs Fox (1847) a William Crookes (1872). Com Allan
Kardec surge a teoria do Espiritismo. Ápice do mediunismo. Espiritismo como
sistema filosófico e posteriormente religioso
- Período científico: inicia-se a partir de 1872, com as pesquisas de William
Crookes, subdivididas em: período metapsíquico (1872 a 1930) e período
parapsicológico (de 1930 aos dias atuais).
A comunicação com os mortos vira ciência
Embora o Espiritismo tenha feito muitos adeptos e conversões durante o próprio
séc. XIX e início do séc. XX em diferentes meios sociais, chama a atenção o
fascínio que a nova doutrina parece ter exercido no meio intelectual, artístico
e científico da época, gerando tanto fervorosos adeptos como tenazes
adversários. Arthur Conan Doyle, Victorien Sardou, Victor Hugo, Robert Owen,
Cesare Lombroso, William Crookes, Oliver Lodge, Camille Flammarion, Charles
Richet, entre outros, dedicaram-se a estudar o ‘outro lado’, recuperando o
passado, revendo a religião à luz da ciência e encarando a morte sob novos
aspectos. Grupos de cientistas reuniam-se em torno de médiuns, investigavam,
eliminavam possibilidade de fraudes. Muitas dessas reuniões de estudos
realizavam-se em centros de pesquisas e laboratórios e os convidados eram
pessoas credenciadas pela comunidade intelectual e científica. Um exemplo foram
as 43 sessões organizadas pelo Instituto Geral Psicológico de Paris nos anos
1905, 1906 e 1907, com a médium Eusápia Paladino, que incluíram, na sua
assistência, Bergson, o casal Curie e Debierne, o reitor da Sorbonne. Embora
muitos dos assistentes do meio científico não ficassem convencidos, um grande
número confessou a sua adesão.
Um dos mais importantes convertidos às novas descobertas propostas pelo
Espiritismo foi Camille Flammarion (1842 - 1925), o eminente astrônomo e
cientista do séc. XIX. Tornou-se espírita, amigo pessoal de Allan Kardec, e
pronunciou o discurso fúnebre à beira de seu túmulo, imbuído pelas convicções
doutrinárias espíritas, sobretudo a imortalidade da alma e a visão de que a
morte era uma libertação, uma continuidade para uma nova existência espiritual,
operosa e de estudos.
Os fenômenos espíritas também repercutiram fora da França. Um dos cientistas
mais importantes a dedicar-se ao estudo dos fenômenos foi o inglês William
Crookes, cuja história está relacionada com a da médium Florence Cook e a
materialização do espírito Katie King. Químico e astrônomo, a partir de 1856 fez
parte da Sociedade Real de Londres dedicando-se a trabalhos fotográficos sobre a
lua. Descobriu um processo, a amalgamação do sódio e pela análise espectral
tornou conhecido um novo corpo metálico simples, o tálio. Através de uma série
de experiências bem sucedidas demonstrou com exatidão um quarto estado da
matéria, além do sólido, líquido e gasoso: o da matéria radiante. Com essa
posição intelectual e científica, anunciou que iria se ocupar dos chamados
fenômenos espíritas, com o rigor de um experimentador científico. Em 1874,
publicou os primeiros resultados de suas pesquisa no “Quarterly Journal of
Science”. Em fevereiro de 1897 publicou suas observações sobre os fatos
espíritas.
(...) Os fenômenos observados: levitações, psicografia, telecinesia,
materializações e aparições luminosas de objetos foram colocados como fatos
incontestáveis, que mereceriam uma laboriosa série de experiências e elaborações
teóricas de acordo com as mais recentes descobertas científicas.
Para alguns outros convertidos, como Arthur Conan Doyle, o desabar da muralha
entre o mundo dos mortos e dos vivos; os fatos que comprovam de forma cabal a
sobrevivência após a morte e a comunicação entre mortos e vivos deveriam
conduzir a uma grande transformação e esperança para o gênero humano pela
formação de uma nova e atual expressão religiosa que levasse os homens a uma
existência mais espiritualizada.
Cientistas de renome na Itália também passaram a integrar o conjunto de
estudiosos dos chamados fenômenos psíquicos. Shiaparelli, Chiaia, Brotasi,
Lombroso e Bozzano fizeram parte dessa galeria. Ernesto Bozzano destacou-se
nesse grupo dedicando trinta anos às pesquisas psíquicas. Publicou inúmeros
trabalhos científicos sobre o assunto, expondo os princípios básicos que o
levaram a aderir à hipótese espírita por ser uma “necessidade lógica”.
Uma das conversões mais intrigantes do final do séc. XIX foi a de Cesare
Lombroso, médico, higienista, psiquiatra e antropólogo. Seus famosos estudos
estavam na área da Antropologia Criminal, nos quais revelava sua incondicional
adesão aos de investigação científica positiva de sua época. Estudava homens e
fatos numa mesma perspectiva, como ponto de partida do método experimental.
Estabeleceu uma teoria em que expunha a Gênese Natural do Delito e as bases do
sistema penal positivo, associando Direito Penal e Antropologia Criminal.
(...) Durante muitos anos, negou os fenômenos psíquicos e espirituais como
charlatanice e credulidade simplória. Porém, após assistir a algumas sessões
mediúnicas realizadas por Eusápia Paladino, e verificando a veracidade e
autenticidade da produção dos fenômenos e das manifestações espirituais,
Lombroso começou suas pesquisas.
Em 15 de julho de 1891 foi publicada uma carta onde declarou sua rendição aos
fatos espirituais: Estou muito envergonhado e desgostoso por haver combatido com
tanta persistência a possibilidade dos fatos chamados espiríticos; digo fatos,
porque continuo ainda contrário à teoria. Mas os fatos existem, e deles me
orgulho de ser escravo.
No desenvolvimento de suas observações e estudos, Lombroso caminhou na direção
de aceitar a interferência e influência de seres espirituais sobre as
manifestações e os fenômenos produzidos. Em 1909 publicou “Hipnotismo e
Mediunidade”, onde descreveu, de forma categórica e imbuída do mais ortodoxo
espírito científico, os resultados de seus estudos, diante das hipóteses
espíritas e de sua veracidade e lógica.
(...) Também na Alemanha foram realizadas experiências científicas da
sobrevivência após a morte. Faziam parte do grupo de especialistas, entre
outros, Johann Karl Friedrich Zöllner, professor de física e astronomia da
Universidade de Leipzig e elaborador da hipótese da teoria sobre a quarta
dimensão do espaço; professor Wilhelm Edward Weber, de física e autor da
doutrina da Vibração das Forças; Schneiber, matemático de renome na Universidade
de Leipzig; Gustav Friedrich Fechner, físico e filósofo na mesma Universidade.
Este grupo publicou em 1879 o resultado de suas pesquisas. Para eles tratava-se
de uma Nova Ciência baseada em outra classe de Fenômenos Físicos, provando a
existência e um outro mundo de seres inteligentes. Liderados por Zöllner,
realizaram experiências com o famoso médium americano Henry Slade. Ocorreram
materializações, levitações, aparições, psicografia de mensagens, que foram
meticulosamente observadas, descritas e estudadas. Submetidos a considerações
teóricas, os fenômenos observados revelavam uma dimensão científica e
verdadeira, como um dos elementos fundamentais para a construção da teoria do
espaço em quarta dimensão e da sobrevivência espiritual.
(...) É muito grande a galeria de cientistas ilustres dessa época seduzidos
pelos fenômenos espíritas, realizando estudos, pesquisas, construindo teorias e
revelando sua adesão, em maior ou menor grau, às novas crenças. Em vários países
europeus e do continente americano, esses estudos apontam um mesmo caminho, que
marcou a história do pensamento contemporâneo: a necessidade de comprovar pelos
argumentos científicos aquilo que antes estava no domínio da fé religiosa”.
LIVROS RECOMENDADOS:
1. G. Delanne - O Fenômeno Espírita; O Espiritismo Perante a Ciência; A Alma é
Imortal. Editora: FEB
2. A. Erny - O Psiquismo Experimental. Editora: FEB
3. A. Aksakof - Animismo e Espiritismo. Editora: FEB
4. A. C. Doyle - História do Espiritismo. Editora: Pensamento
5. C. Imbassahy - O Espiritismo à Luz dos Fatos. Editora: FEB
6. W. Crookes - Fatos Espíritas. Editora: FEB
7. E. Bozzano - todos os livros. Editora: FEB
8. C. Flammarion - todos os livros. Editora: FEB.
Eliane Moura Silva