Às vezes, é preciso deixar o bom senso de lado
Existem duas maneiras principais de tornar possível o
impossível. A primeira é ter bom senso. A segunda, acredite, é não utilizá-lo.
Se fizermos a seguinte pergunta: “Qual é a qualidade que poucos possuem, mas que
todos julgam possuir?”, a resposta mais óbvia será: bom senso. Faça uma
pesquisa. Pergunte a dez pessoas do seu relacionamento se elas julgam ter bom
senso. Essa é uma das poucas questões da vida em que há unanimidade nas
respostas. Todos os seus amigos, sem nenhuma exceção, irão dizer a você que são
pessoas de bom senso. Mas, como você os conhece bem, concluirá que não é bem
assim...
Se quiser continuar a pesquisa, faça a mesma pergunta a uma pessoa que você
comprovadamente sabe que, se há uma qualidade que ela não tem, essa qualidade é
o bom senso. Porém, essa pessoa totalmente desprovida de bom senso também dirá
que a possui.
Mas, afinal, o que é uma pessoa de bom senso? É aquela pessoa ponderada. É
aquela que, ao necessitar tomar uma decisão em relação a determinada questão,
sabe ponderar, isto é, tem habilidade para segmentá-la e atribuir pesos
adequados a cada parte da questão em análise.
Na análise de um problema, a pessoa de bom senso enxerga à sua frente uma pizza
fatiada. Cada fatia representa um ângulo do problema a ser analisado. E, assim,
a pessoa de bom senso valoriza cada um dos ângulos e toma a decisão mais
conveniente, que, como qualquer decisão, certamente desagradará a uns e outros
(algo que a pessoa de bom senso tem plena consciência, pois ela sabe respeitar e
entender as diferenças individuais).
A pessoa de bom senso também tem consciência de que, uma vez tomada determinada
decisão, terá que “trabalhar” os descontentes, pois, caso isso não seja feito,
eles poderão influir negativamente no resultado da ação a ser executada.
Sabe a pessoa de bom senso que o descontente em relação a determinada decisão
geralmente torce (muitas vezes de forma inconsciente até) para a ocorrência do
insucesso.
Utilizar o bom senso é a primeira das duas principais maneiras de tornar
possível o impossível. Agora, vamos à segunda e mais importante forma de, neste
tempo de descontinuidade, conquistar o impossível: não utilizar o bom senso.
Não utilizar o bom senso? – Não é paradoxal fazer tal afirmação, uma vez que
contraria o que afirmei logo no início deste artigo?
Acontece que não vivemos mais em um mundo em que as ocorrências seguem uma
lógica linear. Conviver com paradoxos, agir muitas vezes de forma não-lógica
(pelo menos considerando a lógica dos velhos tempos) devem ser características
básicas do líder atual. O líder que sempre segue a corrente simplesmente faz o
que todos fazem. E, quando uma empresa faz o que todas fazem, ela não inova. E
quem não inova não consegue tornar possível o impossível.
Peço especial atenção para a afirmação a seguir: “Não utilizar o bom senso”.
Perceba que não escrevi “não ter bom senso”. Em vez de não ter bom senso,
escrevi não utilizar o bom senso, o que é bem diferente. A pessoa de bom senso
pode, por sua conveniência, não utilizá-lo às vezes.
A pessoa de bom senso precisa ter consciência de que assim como em muitos
momentos basta utilizar o bom senso – como naqueles em que é necessário resolver
problemas, inovar, tornar possível o impossível –, também existirão momentos
outros – em número cada vez mais crescente – em que não utilizar o bom senso é a
melhor saída. É aquele momento em que você se desprende das normas, ignora as
regras, enfim, é o momento em que você contraria o bom senso, deixando-o de
lado.
Tornar possível o impossível é conseqüência da inovação. E a inovação é fruto da
criatividade que, por sua vez, manifesta-se mais facilmente quando utilizamos
uma certa irreverência, isto é, quando nos libertamos de normas e regras. Por
isso é importante deixar o bom senso de lado se quisermos criar um ambiente de
certa irreverência, se quisermos tornar possível o impossível.
Mas, atenção: embora em muitos momentos possamos reprimir o bom senso para que a
criatividade tenha espaço para aflorar e tornar possível o impossível, sempre
devemos solicitá-lo quando precisamos colocar em ação as idéias inovadoras que
nos ocorreram.
Alkindar de Oliveira