Em Tempo Algum

Caíra a noite e o viajante pedia socorro a Deus. 
Sentia-se doente. 
Longa fora a caminhada. 
Doía-lhe o corpo. 
Estava exausto. 
Orando sempre, encontrou árvore acolhedora que lhe pareceu agasalhante refúgio. 
No pé do tronco anoso, grande cova caprichosamente forrada de raízes era leito ao luar. 
- Oh! - suspirou o viajante fatigado - Deus ouviu-me! Afinal o repouso! 
Ajoelhou-se e ia estender o manto roto no chão, quando verdadeira nuvem de maruins surgiu no assalto. 
Picadas na cabeça, no rosto, nas mãos, nos pés.
E eram tantos os dardos vivos e volantes em derredor que o pobre recuou espavorido, para dormir ao relento, entre pedras e espinheiros da retaguarda. 
De corpo dorido, pensava desalentado: 
- Tolo que sou de acreditar na oração! Estou sozinho! Nada de Deus! 
Na manhã seguinte, porém, retomando a marcha, voltou à árvore do caminho e, somente aí, reconheceu, admirado, que a grande cova de que fora obrigado a afastar-se era moradia de vários escorpiões.
Não descreia da prece em tempo algum. E nos casos em que você encontre empecilhos para possuir o a que mais aspira, guarde, entre aborrecimentos e provações, a certeza de que, muitas vezes, o que lhe parece uma situação invejável não passa de ninho enganador, onde se ocultam os lacraus da morte.


Valérium