A Colheita de Amanhã

Aquele homem de cabelos brancos, trazendo no rosto as profundas marcas que o tempo esculpiu, certamente tinha acumulado muitas experiências, no decorrer de tantos anos.

Difícil calcularmos quantos sorrisos, quantas lágrimas haviam contemplado aquele velho rosto cansado e quase sem expressão.

Empregara seu tempo de juventude construindo o futuro e amparando a esposa e os filhos. Agora, que suas forças físicas estavam diminuindo e o corpo quase não obedecia aos comandos do cérebro, ele foi viver com um dos filhos, a nora e o neto de seis anos de idade.

Sentia-se um intruso naquele lar. Tinha saudades da esposa, que havia retornado ao mundo dos Espíritos, há alguns anos.

Nos primeiros dias, o vovô se sentava à mesa para fazer as refeições junto com os familiares. Mas a nora não estava gostando que aquele velho de mãos trêmulas derramasse alimentos sobre a mesa e no chão.

A visão embaralhada e as mãos que tremiam deixavam rolar algumas ervilhas, derramavam o leite do copo, sujavam a toalha, emporcalhavam o assoalho.

Não suportando o que qualificaram como uma grande sujeira, o filho e a nora providenciaram uma mesa pequena e a colocaram no canto da sala.

Ele deveria comer lá, sozinho, pois, além de tudo, o barulho das suas mastigadas rudes também incomodava o jovem casal.

O velho homem havia quebrado dois pratos e, por isso, passou a comer numa tigela de madeira, por ordem do seu filho.

O neto era a única pessoa que se aproximava do avô e só ele percebia que, vez em quando, uma lágrima rolava discretamente daqueles olhos que, a cada dia, mais perdiam o brilho.

Apesar da pouca idade, o garoto sentia que as lágrimas eram por causa do abandono e da solidão e tentava animá-lo, com sua alegria infantil.

Numa noite, em que o casal conversava na sala de jantar, o pai notou que o menino lidava com pedaços de madeira e outras sucatas jogadas no chão, e lhe perguntou interessado:

Filho, o que você está fazendo com essas madeiras?

O filho respondeu com a doçura e a inocência de sua pouca idade:

Estou fazendo duas tigelas de madeira. Uma para você e outra para a mamãe. Quando eu crescer e vocês forem morar comigo, precisarão delas.

As palavras do garoto foram um golpe para os pais, que ficaram mudos por alguns minutos.

Depois, entenderam a lição e grossas lágrimas rolaram dos seus olhos.

Naquela mesma noite, na hora do jantar, o marido foi buscar seu velho pai e o trouxe para se sentar à mesa e usar talheres e pratos como eles mesmo.

Sem entender o que estava acontecendo, aquele homem de cabelos brancos e rosto marcado por dores da alma, pôde novamente, fazer parte da família, apesar das mãos trêmulas e da visão embaralhada.

Os pais são espelhos vivos dos filhos, que neles buscam um norte para suas vidas.

Lembremos sempre de que eles nos observam e seguem as nossas pegadas.

Por essa razão, vale a pena deixar marcas de luz e exemplos dignos de serem seguidos.

Pensemos nisso.


Momento Espírita