A Última Viagem
Era tarde da noite, quando o taxista recebeu o chamado. Ao chegar, ele pensou
em buzinar e aguardar. Mas imaginou que alguém que chamasse o táxi, tão tarde,
poderia estar com alguma dificuldade.
Saiu do carro, foi até a porta e tocou a campainha.
Uma senhora idosa, pequena, franzina, com um vestido estampado, abriu a porta.
Equilibrava-se em uma bengala, e, na outra mão, trazia uma pequena valise.
Ele olhou para dentro e percebeu que todos os móveis estavam cobertos com
lençóis.
Ele apanhou a mala e ajudou a passageira a entrar no táxi. Ela forneceu o
endereço e perguntou:
Podemos ir pelo centro da cidade?
Mas o caminho que a senhora sugere é o mais longo, observou o taxista.
Não tem importância, afirmou ela, resoluta. Não tenho pressa. Desejo olhar a
cidade, pela última vez.
Estou indo para um asilo, porque não tenho mais família e o médico me disse que
morrerei breve.
O taxista, que começara a dar partida, desligou o taxímetro, sutilmente. Olhou
para trás, fixou-a nos olhos e perguntou:
Aonde mesmo a senhora gostaria de ir?
Ele a levou até um prédio, na área central da cidade.
Ela mostrou o edifício onde fora ascensorista, quando jovem.
Depois, foram a um bairro onde ela morou, recém-casada, com seu marido. Apontou,
mais adiante, o clube onde dançou, com seu amor, muitas vezes.
De vez em quando, ela pedia que ele fosse mais devagar ou parasse em frente a
algum edifício.
Parecia olhar na escuridão, no vazio. Suspirava e olhava.
Assim, as horas passaram e ela manifestou cansaço:
Por favor, agora estou pronta. Vamos para o asilo.
Era uma casa cercada de arvoredo e, apesar do horário, ela foi recepcionada, de
forma cordial por dois atendentes.
Ela se despediu do taxista.
Quanto lhe devo?
Nada, disse ele. É uma cortesia.
Você tem que ganhar a vida, meu rapaz!
Há outros passageiros, respondeu ele.
Sensibilizado, a envolveu em um abraço afetuoso. Ela retribuiu com um beijo e
palavras de gratidão:
Você deu a esta velhinha um grande presente. Deus o abençoe.
Naquela madrugada, o taxista resolveu não mais trabalhar. Ficou a cismar: E se
ele apenas tivesse tocado a buzina duas ou três vezes e ido embora?
E se tivesse recusado a corrida, pelo adiantado da hora?
E se tivesse querido encerrar o turno, de forma apressada, para ir para casa?
Deu-se conta da riqueza que é ser gentil.
Dois dias depois, retornou à casa de repouso. Desejava saber como estava a sua
passageira.
Ela havia morrido, na noite anterior.
Por vezes pensamos que grandes momentos são motivados por grandes feitos.
Contudo, existem coisas mínimas que representam muito para uma vida.
O importante é estar atento, a fim de não perder essas ricas oportunidades de
dar felicidade a alguém.
Mesmo que seja um simples passeio pela cidade, uma ida ao cinema, uma volta pelo
jardim, um bate-papo num final de tarde, atender um telefonema na calada da
noite.
Estejamos atentos para as coisas mínimas, os gestos quase insignificantes.
Eles podem representar, para alguém, toda a felicidade.
Momento Espírita