A Criança Ante o Futuro
Todos somos unânimes em afirmar que a criança de hoje é o futuro da
Humanidade. Nada obstante, a jornada educacional da criança é, em especial, a
grande saga de libertação da ignorância e construção da plenitude.
Na história da educação a criança tem sido o laboratório onde se operam os
métodos psicopedagógicos mais valiosos, resultado natural da experiência e dos
estudos sobre o ser em formação.
No passado, algo remoto, a criança era considerada um adulto em miniatura.
Não merecendo cuidados especiais, com exceção da fase inicial da existência, era
tratada com desprezo e má vontade.
Nas famílias possuidoras de recursos pecuniários era entregue a famílias que se
encarregavam de cuidá-la e devolvê-la após o período de formação, quando poderia
auxiliar no trabalho.
Sua indumentária e comportamento eram semelhantes aos do adulto, não poucas
vezes, sendo assassinada pelos genitores que a faziam sucumbir como se fosse de
maneira natural, escapando facilmente às leis muito benignas em relação ao
infanticídio.
Muitas eram asfixiadas no leito de dormir, como se houvesse sido um fenômeno
natural.
O Estado e a Religião dominante contribuíam de forma significativa para a
manutenção da hediondez.
Pouco antes do século X, percebeu-se que a fragilidade e a inocência da criança
deveriam ser preservadas, poupando-a dos vícios e da degradação vigentes em toda
parte.
Posteriormente, o eminente pedagogo checo Jan Comenius lutou estoicamente para
demonstrar que a criança é um ser em formação, que necessita de amparo e de
cuidados muito especiais para formação da sua fase juvenil e adulta.
Dedicando-se a defender o infante das armadilhas da vida adulta, foi
praticamente o primeiro defensor do amparo e zelo pelo ser em desenvolvimento,
trabalhando-lhe o íntimo de modo a desenvolver os germes de sabedoria que lhe
jaziam adormecidos, desse modo preparando-a para a vida no futuro.
Mais tarde, Johann Heinrich Pestalozzi dedicou a existência a orientar a criança
de maneira especial, despertando-lhe os tesouros íntimos, que se enfloresceriam
e dariam frutos de beleza e de harmonia.
Afinal, a criança, pelo fenômeno natural se transforma em adulto, conduzindo os
valores que tenha acumulado nas fases anteriores do seu desenvolvimento
intelecto-moral.
Dignificando-a com o seu exemplo de ternura e a sua abnegação natural,
respeitava-lhe o estágio, estimulando os seus interesses na aprendizagem e
enriquecimento pessoal para os enfrentamentos do porvir, enquanto abria espaços
mentais para a plenitude da futura sociedade.
Logo após ou concomitantemente, Jean-Jacques Rousseau passou a considerar de
vital importância o investimento na educação infantil por meio de significativa
contribuição pedagógica e psicológica.
No século XIX Fröebel, o sensível mestre alemão iniciou os excelentes labores
dos Jardins de Infância e propiciou cuidados especiais na formação do caráter e
da personalidade da criança, enquanto ofereceu educação e instrução conforme a
sua capacidade de absorção psíquica e emocional.
Contribuições valiosas do ponto de vista fisiológico no século anterior, por
meio de Pavlov, facultaram modificações profundas nos programas educacionais.
A Dra. Maria Montessori logo depois iniciou o seu precioso labor na Casa dei
Bambini e nossos horizontes abriram-se para trabalhos fecundos quais os de
Anísio Teixeira, Piaget e iluminados mestres, que culminaram com Delors e a sua
proposta sobre o conhecimento.
Vivem-se na atualidade recursos extraordinários de educadores, alguns inspirados
como Paulo Freire, enquanto a sociedade distraída das suas responsabilidades
morais, destrói os lares e atira a criança a lamentável orfandade de pais vivos
e fornecedores de objetos tecnológicos, de modo a abandoná-los à própria sorte.
Nesse estado psicológico de abandono, o educando amadurece e experimenta
múltiplas agressões no santuário do lar, enquanto participa dos conflitos dos
pais nos relacionamentos apressados, sem estrutura afetiva, padece insegurança e
medo que o empurram na direção dos vícios consumptores entre os quais o sexo
irresponsável e a drogadição infame.
A educação, sob qualquer aspecto considerado, é um ato de amor que começa na
gestação e se prolonga indefinidamente.
Exige seriedade e investimento afetivo, embora os métodos e técnicas utilizados
se baseiem no exemplo de conduta dos pais e educadores, que plasmarão no caráter
em formação os pródromos do bem viver e do respeito à vida.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o extraordinário educador polonês Janusz
Korczak informava: Nós pagamos para formar o espírito da criança. O que acontece
com o seu coração?
Ele o demonstrou com a própria existência, cuidando das crianças que se
encontravam em abandono pelas ruas de Varsóvia.
Quando em agosto de 1942 as suas crianças foram condenadas aos fornos
crematórios pelos nazistas, ele as guiou, a fim de que tivessem confiança e
adentrou-se com elas no campo de extermínio, embora a sua vida pudesse ser
poupada, e deu-a aos educandos para que tivessem dignidade mesmo no momento da
morte cruel.
O seu amor e a sua fé, embora não fossem totalmente de alguém que se envolvesse
com dogmas e postulados religiosos, levaram-no a educar e exemplificar como o
mais importante dever do cidadão.
O materialismo disfarçado que vige em quase toda parte faculta o campo do prazer
em vez do dever do recato e da dignificação humana, abre o campo do prazer de
todos os matizes, para que as criaturas humanas, aturdidas e irresponsáveis,
atirem-se à caça do gozo sem restrição nem equilíbrio.
Nesse contexto, é inegável a necessidade da mudança ético-moral e de
comportamento, conforme a Doutrina de Jesus-Cristo, atualizada e vivida pelos
Seus discípulos verdadeiros, hoje renascidos na Doutrina Espírita, a fim de que
se perceba que Ele prossegue como o Educador por excelência, que ampara a
criança e a atrai ao Seu regaço com respeito e ternura.
Igualmente, Seu discípulo Allan Kardec viveu a educação e, mediante o pensamento
espírita, oferece o legado que constitui um profundo respeito pela vida
infantil, utilizando-se das condições hábeis para construir a sociedade feliz de
hoje e do futuro.
Vianna de Carvalho