O Assalto da Lisonja
Em sua residência no Méier, Manuel Quintão, que era, ao tempo,
vice-presidente da Federação Espírita Brasileira, recebia a visita de um
companheiro que se autobiografava, a cada instante:
– Como você sabe – dizia ele agora –, quando eu fundei a casa espírita a que nos
referimos, todos me aplaudiram... Minha conferência foi muito bem comentada...
Minha opinião, no assunto, foi um sucesso... Os jornais pediram meu parecer e
fiz o que pude pela Doutrina Espírita, com a aprovação de todos...
De quando em quando, mergulhava a ponta do charuto no cinzeiro e continuava:
– Todos estão satisfeitíssimos comigo... Sinto-me plenamente apoiado...
Quintão, depois de ouvir longo tempo, falou sério:
– Sim, meu caro, Deus o conserve assim festejado; entretanto, não nos
esqueçamos... A lisonja, em qualquer situação, é uma pedra de tropeço...
O companheiro apanhou-se em falta, ante a delicada observação, e ficou
procurando algum ponto no ambiente para não dar a perceber o seu verdadeiro
estado de alma.
Vagueando o olhar, notou, em vaso próximo, que linda begônia de Dona Alzira, a
dona da casa, estava sendo atacada por enorme lagarta.
Encontrou a motivação que buscava e falou :
– Sem dúvida... (e mostrando a larva) a lisonja em nós é tal qual essa lagarta
na planta...
Quintão sorriu, expressivamente, e, fazendo menção de libertar a begônia daquela
indesejável presença, disse, com firmeza:
– Meu amigo, o homem não pode evitar o assalto da lisonja, mas aquele que
conserva semelhante praga consigo, decerto caminha para a sua própria
destruição.
Hilário Silva