Jesus
O Império Romano alargara demasiadamente as suas conquistas, avançando,
triunfalmente, na direção da África do Norte, ambicionando a fascinante terra
dos Faraós.
O Primeiro Triunvirato, composto por Júlio César, Pompeu e Marco Licínio Crasso,
estabelecido no ano 59 a. C., em plena República, pretendia manter o controle
absoluto sobre todo o mundo conhecido que se encontrava sob a dominação de Roma.
Para assegurar a aliança, Júlia Cesaris, filha de Júlio César, casara-se com
Pompeu, então, no seu quarto consórcio, resultando em muitos dramas e vindo a
desencarnar de parto, o que debilitaria a união com o nobre triúnviro.
Pompeu não era muito bem aceito pelo Senado, que lhe negava ancestralidade de
nobreza, enquanto Crasso era portador de expressiva fortuna.
As lutas políticas, porém, travadas internamente e as brigas contínuas
terminaram por enfraquecer a união e criar graves embaraços no relacionamento
dos triúnviros.
Enquanto isso, Júlio César conquistou o Egito e submeteu ao talante de Roma o
imenso reino.
A sua governanta, Cleópatra Thea Philopator, nascida no ano 69 a. C. disputara o
trono com os seus irmãos, com um dos quais casara-se, conforme a tradição
egípcia, mas que mandara matar depois, assim como aqueles que lhe poderiam tomar
a coroa.
Submetida, agora, a Roma, receando que seria aprisionada e conduzida à capital
da república, em condição infamante, teve a ideia original de mandar informar a
César que o brindaria em sua galera com um tapete raro. Astutamente, com a
cooperação de um escravo, enrolou-se na peça valiosa de que, ao ser aberta
diante do conquistador, saiu triunfante, arrebatando o atormentado César, que
era casado, em Roma, com Calpúrnia.
Da convivência tiveram um filho, que herdou o nome do genitor, acompanhou o
conquistador a Roma, e quando, nos idos de março de 44 a. C., César foi
apunhalado na escadaria do Senado, o jovem descendente evadiu-se da cidade,
retomando a Alexandria.
O fracasso do Primeiro Triunvirato, embora as conquistas de César, que se
atribuiu o epíteto de Divino, foi devastador.
No ano 43 a. C., organizou-se o Segundo Triunvirato, gerado mediante a Lei
Títia, com o objetivo de organização do povo, sendo constituído por Marco
Antônio, Octávio, filho de César, que contava com 20 anos, e Lépido.
Octávio era um grande guerreiro, assim como Marco Antônio, que voltou ao Egito,
sendo seduzido pela soberana, com a qual teve gêmeos e mais um filho,
esquecendo-se da governança do Império e vivendo fascinado com a luxúria e o
prazer...
Enquanto isso, as conquistas de Octávio tornavam-no poderoso e, na batalha de
Ácio, contra Antônio, este último considerando-se perdido, no ano 31 a. C. fugiu
para Alexandria e suicidou-se vergonhosamente, sendo acompanhado pela soberana,
com quem se teria casado...
Cleópatra, que chegara a ser aclamada como a rainha dos reis, tornou-se a última
mulher a governar o Egito, encerrando-se o período dos Ptolomeus.
Enquanto isso, numa relativamente pequena faixa de terra, quase uma extensão da
Síria, governada pelo senador Públio Suplício Quirino, Israel estorcegava-se sob
as garras impiedosas de Herodes, o Grande. Idumeu de origem, era detestado pelos
judeus aos quais odiava. Firmando-se na governança arbitrária, casara-se com a
princesa idumeia Mariane, com a qual teve vários filhos.
Psicopata, antissocial, perverso, mandou matar os irmãos, receando que os mesmos
lhe tomassem o trono e, mais tarde, mandou assassinar a esposa, acusando-a
injustamente de adultério, continuando os crimes, agora contra os filhos que com
ela tivera, receando que, oportunamente, eles desejassem fazer justiça pelo
odiento uxoricídio...
Subalterno totalmente a Roma, que o protegia, desencarnou em situação
deplorável, apodrecido antes da morte, graças às enfermidades venéreas e outras
que lhe consumiram o corpo abominável.
Antes, porém, conhecendo a indignidade dos filhos, dividiu Israel em
tetrarquias, oferecendo a Galileia e a Pereia a Antipatro ou Antipas, região em
que viveria Jesus; a Galonítida e a Bataneia a Filipe, que perdeu a esposa
Herodíades para o irmão Antipas e, por fim, Jerusalém a Arquelau, de quem fez
etnarca.
Foi, no entanto, um grande construtor: embelezou o Templo de Jerusalém, edificou
uma cidade em homenagem ao imperador e helenizou, quanto possível, o reino de
Israel.
Deixou um imenso tesouro para o imperador e sua mulher.
Arquelau herdou o trono do pai e, na sucessão dos tempos, o mesmo passou para
Pilatos...
Foi nesse báratro político, social e econômico, no qual os vândalos
assassinavam-se reciprocamente e todos disputavam o poder, quais abutres ante os
cadáveres em decomposição, que nasceu Jesus.
Desdenhando a pompa e o poder terrenos, Ele optou por humilde berço em contato
com as bênçãos da Natureza estrelada, entre animais domésticos, em meio à
população simples e sofrida, a indicar o ministério para o qual viera...
Elegeu a Galileia, região pobre e rebelde, onde, periodicamente, a insatisfação,
defluente da miséria em crescimento como decorrência dos impostos absurdos e
injustos, a todos reduzia à ruína, dando margem a que líderes ansiosos
pretendessem expulsar o romano explorador e aniquilar o rei iníquo.
Divididos em facções que se detestavam, os filhos de Israel perdiam -se entre os
fariseus hipócritas, preocupados apenas com a aparência dos trajes e a
memorização dos textos ditos sagrados, formais, pusilânimes e gozadores; os
saduceus igualmente ateus e desfrutadores; os zelotes fanáticos e homicidas; os
inclementes cobradores de impostos; e o povo abandonado, a maioria transformado
em escória e desprezo...
Nesse caldo de cultura fermentado pelos ódios e ambições terrificantes, em que a
religião, para os fariseus e o sacerdócio explorador e impenitente, era um meio
de satisfazer ambições subalternas, Jesus proclamou a necessidade do respeito a
Deus e ao culto do Seu amor na simplicidade que reunia os infelizes nos braços
da misericórdia, concedendo- lhes o reiterado direito à vida.
Vivendo com as massas sofredoras, compreendendo o orgulho e o degredo dos filhos
da Samaria, proclamou o amor como o libertador de consciências e o forte élan de
ligação com Deus.
A Sua voz, dúlcida como um perene canto, proclamou os direitos humanos,
antecipando em inúmeros séculos a civilização ética, facultando esperança e
alegria de viver.
Taumaturgo por excelência, ensinou a vida gloriosa, mudando as condições da
miséria orgânica, moral e mental dos infelizes, oferecendo-lhes a visão
antecipada do poder de Deus, de que Ele era investido.
Por onde passava, permaneciam as marcas inconfundíveis da compaixão e da
misericórdia, alterando o status quo de maneira irrefragável.
Com um pequeno grupo escreveu nas páginas vivas da História o estatuto da
felicidade e imolou-se em nome do ideal a que se entregou.
Jamais houvera sucedido algo semelhante ao que Ele fazia e que nunca se
repetiria na Humanidade.
Dividiu os fastos históricos e promoveu o ser humano a um patamar não imaginado
no Seu tempo.
A partir dEle, as leis tornaram-se mais benignas, a justiça tem procurado tirar
a venda dos olhos e as tentativas em favor de um mundo melhor têm comandado
vidas que se lhe entregam em regime de totalidade.
Jesus!
Passam os séculos e o Seu brado de amor, emoldurado pelo sacrifício da própria
vida, ainda sensibiliza a sociedade, vinte séculos depois, trabalhando em favor
da plenitude das ovelhas que veio reunir em um só rebanho.
Até quando se demorará a instalação do Seu Reino?
Não importa o tempo que transcorra na espera, nem as circunstâncias deste como
de outros momentos... O certo é que Jesus continua esperando e doando-se por
todos nós.
Vianna de Carvalho