A Resina
Eu era - quando pequena – tão conscienciosa e preocupada que a menor tragédia infantil me deixava acabrunhada e doente de escrúpulos.
Um dia,em meio ao verão, caiu uma chuva excepcionalmente pesada,c om uma ventania que carregou tudo em torno da nossa casa.
Quando o tempo melhorou,meu pai convidou-me para dar um passeio e levou-me pela trilha do bosque.
- Repare nestas árvores - disse-me. – Os ramos ficaram partidos de tal forma que é bem possível que elas morram. E agora,examine estas. A tempestade deixou-as intactas.
Observando-as eu me senti mais do que surpresa:estupefata. E meu pai, com sua voz calma de sempre, voltou a me falar:
- Como você vê, há, neste mundo, duas espécies de árvores: as teimosas e as sabidas.As sabidas fabricam a resina para si mesmas e as teimosas não fazem isso.As teimosas conservam os seus galhos hirtos, rígidos.Vem a chuva e acumula a água sobre eles. Vem o vento e, com sua força,o s quebram.E então os ramos não resistem e se quebram. A árvore fica nua, desfigurada e, muitas vezes, morre. Mas as sabidas, estas mantêm a resina circulando como o sangue circula em nosso corpo. Quando o peso da água da chuva é maior do que podem agüentar, limitam-se a afrouxar os ramos, deixando-os pender. E quando o vento as envolve, ficam tranqüilas e permitem que as agitem como quiser. Depois a água cai e o vento acalma. Na manhã seguinte essas árvores estão intactas, como você está vendo.
Ele meditou um instante e depois me disse olhando fundo nos meus olhos:
- Seja como as árvores resinosas, minha filha. Suporte o que você puder e espere que a sobrecarga, como a água, caia. E que o tempo, como o vento, passe. Você conseguirá resistir e continuará vivendo.
Recordando essa comparação, em meio às dificuldades dos anos adultos, foi que eu consegui não ser um dos muitos casos, tão tristes, de neurose humana.
Wallace Leal Rodrigues