Ambição Desregrada

Recebi a sua carta,
Meu caro amigo Silvestre,
Você faz uma consulta
Em grave questão terrestre.

Você deseja saber
O que ocorre aos que se vão
Para a vida, além da morte
Em desregrada ambição.

O amigo não desconhece:
Ambição de fazer bem,
Anseio de ser melhor
Não fazem mal a ninguém.

Mas a febre do egoísmo
De quem quer mais, mais e mais
Sem precisão ou proveito
Arrasa as forças mentais.

Nesses casos, a pessoa,
Larga o corpo, exige e erra,
De ilusão para ilusão,
Perambulando na Terra.

Você recorda o Nhô Neca
Que arruinou muita viúva,
Desencarnado é um mendigo
Mas pensa que é manda-chuva.

Depois de morto, o João Panca
Que só queria dinheiro,
Ë vigia de um tesouro
Que enterrou no galinheiro.

Nicão despojava os órfãos
Fosse a cara de quem fosse,
Morreu, mas anda chumbado
Ao sítio do Rio Doce.

Depois de deixar o corpo,
A sovina Dona Bela
É vista à porta dos bancos
E diz que os bancos são dela.

Finou-se a falar em ouro
O nosso Nhonhô da Mata,
Ela agora cata pedras,
Achando que ajunta prata.

Passeando bens dos cegos,
Desencarnou Mano Landi,
Pelo remorso, é um fantasma
Assombrando a Roça Grande.

Tomou muita terra alheia
Nhô Chico do Lavajão,
Desencarnado ele clama
Em sete palmas de chão.

Morreu louco de avareza
O esperto Quinquim de Souza,
Tendo acordado na tumba
Quer vender a própria lousa.

Guarde a certeza, meu caro,
Na trilha da criatura,
Ambição mais ambição,
A soma é sempre loucura.

Louva a paz do necessário
Que o trabalho nos consente,
Tudo aquilo que é demais
É desarranjo na mente.

Você mais cedo ou mais tarde,
Tal qual comigo se deu,
Ressurgirá no outro mundo,
Sozinho como nasceu.


Casimiro Cunha