Desafios à Fé
A sociedade hedonista atual, vinculada ao consumismo exorbitante, no qual
parece encontrar segurança em relação aos conflitos existenciais, mantém atávica
resistência a todas e quaisquer expressões de fé religiosa, buscando mecanismos
de fuga da realidade, como afirmação de liberdade de expressão e de
autorrealização.
Nada obstante, avança em desabalada correria para as fugas psicológicas,
tombando, não poucas vezes, no vazio existencial, na depressão ou no consumo do
álcool, do tabaco, das drogas ilícitas, dos alucinógenos e dos desvios de
comportamento sexual.
As castrações decorrentes das religiões ortodoxas do passado prosseguem
afligindo-a de tal forma, que a simples lembrança de qualquer expressão
doutrinária indu-la ao pensamento das imposições asselvajadas dos regimes
políticos ditatoriais, ou quando se referem ao Espírito, ressuma inconsciente
aversão, decorrente dos abusos da fé arbitrária dos tempos recuados.
Pensa-se unicamente em viver-se as comodidades defluentes da tecnologia e das
ciências, sem dúvida, portadoras de valores inestimáveis, mas nem por isso,
únicas proporcionadoras de harmonia e de completude.
O ser humano renasce para a conquista da autoconsciência, para a superação dos
arquétipos perturbadores que lhe permanecem no inconsciente impondo diretrizes
de libertação que mais o afligem.
O prazer tornou-se o novo deus, substituindo os deuses de outrora, e os ases dos
esportes, do cinema, da televisão, do poder, dos divertimentos, das fantasias,
tornam-se inspiração para as buscas atormentadoras, gerando mais conflitos que
se tornam epidêmicos.
Eles próprios, os novos centuriões e gladiadores do Panis et circenses da velha
Roma, desfilam nos carros da alucinação e da glória de um dia, logo substituídos
por outros mais audaciosos, inumeráveis deles, porém, portadores de graves
transtornos psicológicos e psiquiátricos, que se opõem à ordem, à beleza, à
estesia, celebrizando-se pelas alucinações e agressões que lhes retratam a
violência e o desconforto interno.
Pergunta-se: - Para onde segue a sociedade?
Os padrões éticos destroçam-se nas aventuras chocantes e desastrosas em que
malogram os novos programadores dos destinos, dando lugar a tragédias contínuas,
à violência e à degradação dos costumes.
A juventude, sem a assistência da família, opta pelo aproveitamento do tempo
para o desordenado jogo do prazer, especialmente quando os pais imaturos
competem com os filhos nos seus campeonatos de insensatez, entregando-se à
exaustão dos vícios, perdendo a infância que cede lugar ao amadurecimento
precoce, invariavelmente resultado da necessidade de competir desde muito cedo
com os mais velhos, aproveitando-se das oportunidades que lhes chegam...
Os tormentos sexuais instalam-se-lhes prematuramente e as experiências dessa
natureza sucedem-se, sem qualquer controle, atingindo níveis de elevada
frustração e de desencanto.
Sem o amparo do lar, os jovens formam clãs primitivos, fogem para as ruas do
desgoverno social, entregando-se, na sua ignorância, curiosidade e inexperiência
a toda sorte de sensações apressadas.
Certamente, existem exceções enobrecedoras, que mantêm o equilíbrio social e
trabalham pelo progresso com elevados sentimentos morais.
Referimo-nos, porém, à devastadora cultura newtoniana e cartesiana estruturada
no conceito da matéria, cuja máquina expressa na organização física dos seres de
todas as espécies, demanda ao aniquilamento, em razão do desconserto de suas
peças.
Como efeito, somente apresenta validade o que pode ser apalpado, medido,
programado, exatamente no momento quando as conquistas da tecnologia avançada
oferecem à reflexão o bóson de Higgs, o mapeamento do DNA ou código da vida, a
visão do universo com os seus bilhões de galáxias, induzindo o pensamento a uma
Causalidade não física ou a uma assinatura de Deus nas expressões mais
extraordinárias da energia.
A alucinação pelo conforto, no entanto, sempre transitório e frustrante, em
razão da sua fugacidade, que logo exige novas expressões mais fortes, deixa o
indivíduo distante dessas referências que induzem ao aprofundamento da mente nas
causas da vida e no seu significado, mantendo-o iludido quanto ao sentido da sua
existência planetária que, não sendo interrompida pela morte, para ela ruma...
Desse modo, quando as forças físicas e mentais, emocionais e estruturais do
corpo diminuem com o advento das enfermidades inevitáveis e da velhice, a
amargura, a revolta ou o desespero mais se insculpem no âmago do indivíduo, que
não se conforma com o aniquilamento, nem a perda dos recursos propiciatórios dos
gozos, agora, mais difíceis...
Para todos os seres humanos, entretanto, existe o Espiritismo com as suas
portentosas demonstrações positivistas em torno da sobrevivência do ser real, em
torno do mundo legítimo e causal, da programática existencial no cômputo das
leis universais perfeitas, elaboradas pela inteligência suprema e causa primeira
de todas as coisas, que é Deus.
Aos espíritas cabe a desafiadora tarefa de apresentar a fé raciocinada e lógica
legada pela codificação do Espiritismo, de maneira a enfrentar o materialismo
nos seus significativos estertores, de maneira a atender a grande massa humana
aturdida por haver perdido o rumo religioso na neblina da ignorância e do
dogmatismo.
Observando-se o interesse dos astrofísicos em constatar a probabilidade de vida
em outros planetas ou quaisquer outros astros do Universo, qual ocorre com as
extraordinárias análises do solo de Marte, ora estudado pelo jipe robô
Curiosity, deve o ser humano reflexionar em torno da vida de maneira mais grave
e não superficialmente com indiferença qual vem ocorrendo com a quase
generalidade.
Breve meditação em torno do ser existencial e logo chega-se à conclusão do
sentido da vida na Terra, do seu magnífico programa educacional e de
desenvolvimento da divina fagulha de que se constitui, despertando-se para os
valores éticos e os objetivos reais, proporcionadores da harmonia interior e do
equilíbrio dos sentimentos com a razão.
A existência terrena é mais do que um licor ou fel para serem tragados pela
imposição nefasta do acaso ou do destino injustificável.
Pode, sim, tornar-se uma e outra coisa dependendo de como se considera a
experiência fantástica do viver, dela fazendo um vale de lágrimas das
ultrapassadas alegorias religiosas ou um paraíso de benesses das utopias
passadistas...
Desse modo, esta filosofia científica, em razão dos seus fundamentos poderem ser
demonstrados nos laboratórios das experiências mediúnicas, que é uma ciência
filosófica, face aos seus paradigmas elucidativos em torno do ser, do destino e
do sofrimento, é, também, uma religião de profundos conteúdos psicológicos e
éticos centrados no amor, na autoconquista, na iluminação interior.
Investigá-la com seriedade sem parcialismo é dever de todo ser inteligente que
anela pela autoconsciência, a fim de viver com discernimento e harmonia.
Vianna de Carvalho