Choras Teus Mortos?
Permitiu Deus que te libertasses antes de mim e eu disso me não poderia
queixar sem egoísmo, porquanto fora querer-te sujeito ainda às penas e
sofrimentos da vida. Espero, pois, resignado, o momento de nos reunirmos de novo
no mundo mais venturoso no qual me precedeste.
O Evangelho Segundo o Espiritismo, cap. XXVIII, item 63.
Sim, naturalmente, a morte dos seres queridos tem o poder de transtornar os
sentimentos humanos.
Evidentemente, o fenômeno da morte, ou desencarnação, ainda prova no mundo
incomensuráveis padecimentos, que costumam hebetar a pessoa, mormente quando
ela, não dispondo dos conhecimentos da Vida Imperecível, imagina seja a morte o
fim absoluto da querida convivência dos que se prezam, dos que se amam.
Muito embora a lágrima sentida ocupe o seu lugar, quando desses transes
difíceis, faz-se necessário atentar para os excessos, que são, sem dúvida,
expressões da mente bloqueada ou da alma emparedada em ignorância
desarticuladora, impedindo-se de pensar mais alto.
Há familiares que se desesperam de tal modo, ante a morte, que mais parecem
descarregar as quotas de remorsos para com o desencarnado, do que propriamente
saudade ou ternura.
Há casos de tamanha revolta, diante da lei que não tem exceção, que passam a
acusar, sem que se apercebam, os afetos trespassados, como responsáveis por seus
sofrimentos.
Há situações em que familiares e amigos, num processo inconsciente de
autopiedade, valem-se do passamento dos entes caros, a fim de exteriorizar a
carência afetiva que os caracteriza. Não pensam claramente no morto, mas, em si
mesmos, elastecendo o sofrimento, atraindo para si as atenções e cuidados
gerais.
Pára e pensa, pois, nessas questões.
Não obstante a morte imponha amargura e dor, frustração e lágrimas naqueles que
ficam, nas lides da atividade carnal, vale a pena estejas vigilante, para que o
egoísmo milenário, mimético e torpe, não se imiscua nos teus sentimentos
verdadeiros.
Cultiva, então, o bom senso.
Sofre e chora sem que o teu sofrimento perturbe os outros, e sem que tuas
lágrimas traiam teus desejos íntimos de afago, na descompensação em que te
achas.
Aprende a sofrer retirando bom aproveitamento do padecer, amadurecendo,
superando-te, para que as tuas provações ou expiações humanas, de fato, façam-te
avançar para Deus, e não te aguilhoem aos postes morais do indivíduo
espiritualmente pigmeu.
Choras por teus mortos? Então, faze desse pranto um aceno de ternura e um
bilhete de paz, onde tu digas aos amores desencarnados:
Até breve; que Deus te abençoe, ser querido!
Camilo