Lutas da Irritação

Em carta você pergunta,
Prezada Rita Frazão,
Como se anotam no Além
As lutas da irritação.

Pode crer. A irritação
Quando envolve a criatura,
Ë um pedaço de caminho
Para a morte prematura.

A cólera é sempre um mal
Embora pareça um bem,
Espinheiro de azedume
Não dá proveito a ninguém.

São muitos os casos graves,
Que a fúria estende por si,
Tanto nos atos da Terra
Quanto nos fatos daqui.

Tanto se irava por nada
Nhô Totico das Candeias,
Que se matou sem querer
Trancando o sangue nas veias.

Enraivecido, Nhõ Juca,
Na Roça dos Enjeitados,
Morreu grudado na chusma
De espíritos atrasados.

Enfurecia-se à-toa,
O nosso Carlos Monteiro...
Ao irar-se no volante
Rolou no despenhadeiro.

Gritando desorientado
Contra tia Felisbela,
Nhô Ramos morreu de um bife
Engastalhado na goela.

Recorde o caso sabido
De Aninha de Nhô Vicente,
Caiu e morreu com raiva
Num tacho de água fervente.

Outra história muito triste
A morte de Adão Galeno,
Cego de raiva trocou
Sal amargo por veneno.

Sempre irritado na praça,
Tião do Sítio da Lua,
Fazendo compras na loja,
Morreu de briga na rua.

Outro caso doloroso
O de Chiquinha dos Matos,
Afogou-se na cisterna,
Querendo bater nos gatos.

Nhá Tina em fúria constante
Na Tapera do Riacho,
Quando surrava um cachorro,
Finou-se de escada abaixo.

Derrame acabou com Júlio
Na Fazenda da Floresta...
O pobre espantava as moscas
Com murros na própria testa.

Tenha calma e tolerância,
Não siga impulso violento,
A cólera, em qualquer parte,
É chuva de sofrimento.

Irritação? Fuja disso,
Não se esqueça, minha irmã,
Ante os entraves de hoje
Que a vida volta amanhã.


Cornélio Pires