Outro Dia

Afirmas, coração, que tudo te falhou:
Felicidade, amor, confiança, promessa...
Rogas socorro e amparo de alma opressa
Para esquecer o fel que te agonia!...
Recordemos, no entanto, a natureza,
Tudo espera por Deus: o céu, a vida, o solo,
Ante a luz matinal que aclama, polo a polo:
- Outro dia, outro dia!...

Calamidades surgem...Terremotos
Lançam em torvo abismo as obras do homem,
Não se enumera as glórias que consomem
Na desordem sombria!...
Passada a convulsão, a gleba se renova,
E, enquanto ouves canções de tratores e enxadas,
Dizem rosas nas sebes orvalhadas:
- Outro dia, outro dia!...

Pensa no campo, à noite, em tempestade,
Verga-se a planta em furacão violento,
A galharia estala em desalento,
Mas o tronco porfia...
Garante os ninhos frágeis que agasalha
E, quando a aurora se desencastela,
Entoa a passarada a oração doce e bela:
- Outro dia, outro dia!...

Cai pesada barranca sobre a fonte,
Enodoa-lhe a face alegre e pura...
A fonte acolhe e abraça a lama escura
Que a deslustra e injuria,
Vence, calma, o tropeço que a constrange
E em vez de revoltar-se, agitando a corrente,
Trabalha e canta em paz, seguindo para a frente:
- Outro dia, outro dia!...


Assim no mundo, coração cansado,
Se a dor te busca, amargurosa e austera,
Nunca te desanimes!...Sofre, espera,
Lua, serve, confia!...
E escutarás na fé que te abençoa,
Sem que a palavra humana logre formulá-la,
A eterna voz de Deus que te levanta e fala:
- Outro dia, outro dia!...


Maria Dolores