Allan kardec - o Educador
Perguntas me inquietam ao tentar compreender o Espiritismo. O que levou o
educador Allan Kardec a desenvolver pesquisas psíquicas e lançar as bases do Espiritismo? Por que a sua obra diferencia-se de todas as outras obras
espíritas?
Hippolyte Leon Denizard Rivail nasceu em Lion, França, em 1804. Dos 10 aos 15 anos estudou em Yverdon, Suíça, no célebre instituto do professor-filantropo Johann H. Pestalozzi. Frases de Pestalozzi sugerem que o ambiente em que Rivail consolidou sua personalidade, valorizava o sentimento e a educação integral através da prática, da observação e da convivência. “O principal do que digo, eu vi. E muito do que aconselho, eu fiz... Tudo o que digo repousa... em minhas experiências reais”, “A manifestação do amor é a salvação do mundo!... é o fio
que liga o globo terrestre... que liga Deus e o homem”. “A educação (provém)...
do reconhecimento das imutáveis leis da nossa natureza... o objetivo final da
educação não é o de aperfeiçoar as noções escolares, mas sim o de preparar para
a vida; não de dar o hábito da obediência cega... mas de preparar para o agir
autônomo”.
Convicto do poder da educação e com forte senso de obrigação social, Rivail
realizou intensa e precoce atividade literária e pedagógica. Chegou a Paris em
1820, se pôs a lecionar e a traduzir obras inglesas e alemãs. Lançou seu
primeiro livro em 1823, com 18 anos. Até 1850 publicou 22 obras de ensino
pré-universitário sobre pedagogia, mitologia, física, química, astronomia,
fisiologia, aritmética, cálculo e gramática. Em 1825, com 20 anos, começou a
dirigir uma “Escola de Primeiro Grau”. Em 1826 fundou o instituto técnico
“Instituição Rivail”. Com 24 anos, escreveu em seu Plano para a Melhoria da
Educação Pública: “A educação exige um estudo especial... conhecimento profundo
do coração humano e da psicologia moral... a educação não se limita apenas à
instrução... todas as partes... são... estreitamente ligadas...” “A grande
diferença entre um professor (se limita a ensinar) e um educador (encarregado do
desenvolvimento inteiro do homem)”. “Educação é o resultado do conjunto de
hábitos adquiridos... resultado de todas as impressões que os provocavam”. “A
inteligência deve ser desenvolvida desde cedo, como a moral, e não é
sobrecarregando a memória... mas enriquecendo a imaginação de idéias justas...”
Complementa em 1834: “Tudo é intelectual, tudo é moral”. “Conheça o movimento
dos astros e seu espírito penetre no espaço; tudo isso está ao alcance... da
adolescência. Então, não será, como um bruto, indiferente a tudo o que maravilha
seu olhar; então não mais acreditará em almas do outro mundo, nem em fantasmas;
não mais tomará fogos-fátuos por espíritos; não mais acreditará nos ledores de
sorte... seu espírito se alargará contemplando o espaço imenso e sem limites”.
Em 1857 volta a lançar livros, agora sobre Espiritismo, com o pseudônimo de
Allan Kardec. Até seu desencarne, em 1869, publicou, pelo menos, 8 obras
espíritas. Dos aproximadamente 188 textos que Kardec insere entre as perguntas
dO Livro dos Espíritos, 39 estão diretamente relacionadas à educação. Qual força
foi capaz de transformar o jovem Rivail, cético do mundo espiritual, no grande
codificador do Espiritismo aos 53 anos?
Com intensa atividade intelectual e confiança na ciência para alcançar a
verdade, em 1823, com 19 anos, iniciou seus estudos sobre o magnetismo. Ao longo
de sua vida associou-se a 12 Academias científicas. Até meados do século XIX a
ciência não era uma atividade profissional, e criavam-se academias para debater
e aprimorar estes conhecimentos.
Rivail nos define a educação como um ato moral de argumentação racional. Sua
confiança no método científico o fez mudar de paradigma, aceitou a existência
dos Espíritos desencarnados, porém manteve-se fiel ao seu sonho, definido aos 30
anos com paixão e racionalidade: “a educação é a obra da minha vida, não
faltarei à minha missão... inimigo de todo charlatanismo, não tenho o tolo
orgulho de acreditar cumpri-la com perfeição, mas tenho ao menos a convicção de
cumpri-la com consciência”. Seu entusiasmo com o Espiritismo provém não da
descoberta científica da comunicabilidade da alma, mas da percepção de que este
conhecimento transformaria os conceitos humanos, desenvolvendo a moral. Sua obra
não se limita na ciência, religião ou filosofia, transcende-as ao tornar-se uma
obra educadora, busca convencer racionalmente, baseada em fatos vividos
cientificamente, com linguagem simples para ser acessível a todos. Outros
filósofos e cientistas espíritas não tiveram a envergadura educadora e o
engajamento social de Kardec.
Pergunto-me se poderemos completar a utopia de Kardec e transformar o
Espiritismo em uma eficiente ferramenta social de educação moral em nosso tempo.
Parece-me que precisamos ser mais apaixonados pela educação, mais comprometidos
em agir moralmente e em estimular a autonomia, a racionalidade e a atitude
científica do Homem.
Bibliografia:
O Livro dos Espíritos (Allan Kardec), Pestalozzi: educação e ética (Dora
Incontri), Textos Pedagógicos: Hippolyte Léon Denizard Rivail (Dora Incontri),
Allan Kardec: o educador e o codificador (Zêus Wantuil e Francisco Thiesen).
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Gustavo Leopoldo Daré