Não Há Morte
Depois que partiram do círculo carnal aqueles a quem amas, tens a impressão de que a vida perdeu a sua finalidade.
As horas ficam vazias, enquanto uma angústia que te dilacera e uma surda
desesperação que te mina as energias se fazem a constante dos teus momentos de demorada agonia.
Estiveram ao teu lado como bênçãos de Deus, clareando o teu mundo de venturas com o lume da tua presença e não pensaste, não te permitiste acreditar na possibilidade de que eles te pudessem preceder na viagem de retorno.
Cessados os primeiros instantes do impacto que a realidade te impôs, recapitulas
as horas de júbilo enquanto o pranto verte incessante, sem conforta-te, como se
as lágrimas carregassem ácido que te requeima desde a fonte do sentimento à
comporta dos olhos, não diminuindo a ardência da saudade. . .
Antes da situação, o futuro se te desdobra sombrio, ameaçador, e interrogas como
será possível prosseguir sem eles.
O teu coração pulsa destroçado e a tua dor moral se transforma em punhalada
física, a revolver a lâmina que te macera em largo prazo.
Temes não suportar tão cruel sentimento. Conseguirás porém superá-lo. Muito
justas, sim, tuas saudades e sofrimentos.
Não, porém, a ponto de levar-te ao desequilíbrio, à morte da esperança, à
revolta. . .
Os seres a quem amas e que morreram, não se consumiram na voragem do
aniquilamento. Eles sobreviveram.
A vida seria um engodo, se se destruísse ante o sopro desagregador da morte que
passa.
A vida se manifesta, se desenvolve em infinitos matizes e incontáveis
expressões. A forma se modifica e se estrutura, se agrega e se decompõe passando
de uma para outra expressão vibratória sem que a energia que a vitaliza dependa
das circunstâncias transitórias em que se exterioriza.
Não estão portanto, mortos, no sentido de destruídos, os que transitaram ao teu
lado e se transferiram de domicílio.
Prosseguem vivendo aqueles a quem amas.
Aguarda um pouco, enquanto, orando, a prece te luarize a alma e os envolvas no
rumo por onde seguem.
Não te imponhas mentalmente com altas doses de mágoas, com interrogações
pressionantes, arrojando na direção deles os petardos vigorosos da tua incontida
aflição.
Esforça-te por encontrar a resignação.
O amor vence, quando verdadeiro, qualquer distância e é ponte entre abismos,
encurtando caminhos.
Da mesma forma que anelas por volver a senti-los, a falar-lhes, a ouvir-lhes,
eles também o desejam.
Necessitam, porém, evoluir, quanto tu próprio.
Se te prendes a eles demoradamente ou os encarcera no egoísmo, desejando
continuar uma etapa que hora se encerrou, não os fruirás, porque estarão na
retaguarda.
Libertando-os, eles prosseguirão contigo, preparar-te-ão o reencontro,
aguarda-te-ão...
Faze-te, a teu turno, digno deles, da sua confiança, e unge-te de amor com que
enriqueças outras vidas em memórias deles, por afeição a eles.
Não penseis mais em termos de “adeus” e, sim, em expressões de “até logo mais”.
Todos os homens na terra são chamados a esse testemunho, o da temporária
despedida. Considera, portanto, a imperiosa necessidade de pensar nessa injunção
e deixa que a reflexão sobre a morte faça parte do teu programa de assuntos
mentais, com que te armarás, desde já para o retorno, ou para enfrentar em paz a
partida dos teus amores. . .
Quanto àqueles que viste partir, de quem sofres saudades infinitas e
impreenchíveis vazios no sentimento, entrega-os a Deus, confiando-os e
confiando-te ao Pai, na certeza de que, se souberes abrir a alma à esperança e a
fé, conseguirás senti-los, ouvi-los, deles haurindo a confortadora energia com
que te fortalecerás até o instante da união sem dor, sem sombra, sem separação pelos caminhos do tempo sem fim, no amanhã ditoso.
Joanna de Ângelis