Rosas do Infinito
Em deslumbrante paisagem da Esfera superior, diversos mensageiros se
congregavam em curioso certame. Procediam de lugares diversos e traziam flores para importante aferição de mérito.
Na praça enorme, pavimentada de substância semelhante ao jade, colunas
multicores exibiam guirlandas de soberana beleza.
Rosas de todos os feitios e cravos soberbos, gerânios e glicínias, lírios e açucenas, miosótis e crisântemos exaltavam a Sabedoria do Criador em festa espetacular de cores e perfumes.
Envergando túnicas resplendentes, servidores espirituais iam a vinham, à espera
dos juizes angélicos.
A exposição singular destinava-se à verificação da existência de luz divina, nos
múltiplos exemplares que aí se alinhavam, salientando-se que os espécimes com
maior teor de claridade celeste seriam conduzidos ao Trono do Eterno, como
preito de amor e reconhecimento dos trabalhadores do bem.
Os julgadores não se fizeram esperados.
Quando a expectação geral se mostrava adiantada, três emissários da Majestade
Sublime atravessaram as portas de dourada filigrana e, depois das saudações
afetuosas, iniciaram o trabalho que lhes competia. Aquele que detinha mais
elevada posição hierárquica trazia nas mãos uma toalha de linho translúcido, o
único apetrecho que certamente utilizaria na tarefa de análise das preciosidades
expostas.
Cada ramo era seguido de pequena comissão representativa do serviço espiritual
em que fora elucidando.
Aproximou-se o primeiro grupo, trazendo uma braçada de rosas, tecidas com as
emoções do carinho materno que, lançadas à toalha surpreendente, expediram
suaves irradiações em azul indefinível, e os anjos abençoaram o devotamento das
mães, que preservam os tesouros de Deus, na posição de heroínas desconhecidas.
Logo após, brilhante conjunto de Espíritos jubilosos deitou ao pano singular uma
coroa de lírios, formados pelas vibrações de fervor das almas piedosas que se
devotam nos templos ao culto da fé. Safirinas emanações cruzaram o espaço e os
celestes embaixadores louvaram os santos misteres de todos os religiosos do
mundo.
Em seguida, alegre comissão juvenil trouxe a exame delicado ramalhete de
açucenas, estruturadas nos sonhos e nas esperanças dos noivos que sabem guardar
a Bênção Divina, e raios verdes de brilho intraduzível se projetaram em todas as
direções, enquanto os emissários do Todo-Misericordioso entoaram encômicos aos
afetos santificantes das almas.
Lindas crianças foram portadoras de formosa auréola de jasmins, nascidos da
ternura infantil, e que, depostos sobre a toalha miraculosa, emitiram alvíssima
luz, semelhante a fios de aurora, incidindo sobre a neve.
Depois, pequeno agrupamento de criaturas iluminadas colocou, sob os olhos dos
anjos, bela grinalda de cravos rubros, colhidos na renunciação dos sábios e dos
heróis, a serviço da Humanidade, que exteriorizaram vermelhas emanações, quais
se fossem constituídas de eterizados rubis.
E, assim, cada comissão submeteu ao trabalho seletivo as jóias que trazia.
O devotamento dos pais, os laços esponsalícios, a dedicação dos filhos, o
carinho dos verdadeiros amigos, a devoção de vários matizes ali se achavam
magnificamente representados pelas flores cuja essência lhes correspondia.
Em derradeiro lugar, compareceu a mais humilde comissão da festa.
Quatro almas, revelando características de extrema simplicidade, surgiram com um
ramo feio e triste. Eram rosas mirradas, de cor arroxeada, mostrando pontos
esbranquiçados a guisa de manchas, a desabrocharem ao longo de hastes espinhosas
e repelentes. Depostas, no entanto, sobre a mágica toalha, inflamaram-se de luz
solar, a irradiar-se do recinto à imensidão dos Céus.
Os três anjos puseram-se de joelhos. Inesperada comoção encheu de lágrimas os
olhos espantados da enorme assembléia. E porque alguns dos presentes chorassem,
com interrogações imanifestas, o grande juiz do certame esclareceu, emocionado:
-Estas flores são as rosas de amor que raros trabalhadores do bem cultivam nas
sombras do inferno. São glórias do sentimento puro, da fraternidade real, da
suprema consagração à virtude, porque somente as almas libertas de todo o
egoísmo conseguem servir a Deus, na escória das trevas. Os acúleos que se
destacam nas hastes agressivas simbolizam as dificuldades superadas, as pétalas
roxas simbolizam o arrependimento e a consolação dos que já se transferiram da
desolação para a esperança, e os pontos alvos expressam o pranto mudo e aflitivo
dos heróis anônimos que sabem servir sem reclamar...
E, entre cânticos de transbordante alegria, as rosas estranhas subiram
rutilantes do Paraíso.
Ó vós, que lutais no caminho empedrado de cada dia, enxugai as lágrimas e
esperai! As flores mais sublimes para o Céu nascem na Terra, onde os
companheiros de boa-vontade sabem viver para a vitória do bem, com o suor do
trabalho incessante e com as lágrimas silenciosas do próprio sacrifício.
Irmão X