Dar a César
Os fariseus constituíam um importante partido
político-religioso entre os judeus, ao tempo de Jesus, e cultivavam uma
religiosidade de superfície, baseada em exterioridades. O Evangelho os
apresenta, em várias passagens, em atitude hostil ao Mestre.
Indagado, certa feita, por eles, sobre a obrigação de pagar imposto aos romanos,
respondeu-lhes Jesus: "Daí a César o que é de César e a Deus o que é de Deus". A
pergunta fora capciosa pois esse tributo era detestado em Israel e, conforme a
resposta de Jesus, esperavam os fariseus indispô-lo com a autoridade romana
(caso aconselhasse o não pagamento do imposto) ou desacreditá-lo junto ao povo
(caso recomendasse o pagamento). Com aquela resposta Jesus surpreendeu e
desorientou os astuciosos interlocutores aproveitando ainda a oportunidade para
dar um ensinamento de caráter geral.
Devemos notar, desde logo, que não foi estabelecida uma opção - ou a César ou a
Deus - nem uma sucessão: primeiro a um, depois ao outro. As recomendações são
simultâneas, ficando evidente que o Mestre não via incompatibilidade entre as
exigências da vida social e as diretrizes religiosas, entre fé e cidadania.
Há, compreensivelmente, algumas diferenças. César, a autoridade humana,
estabelece leis e cobra impostos, oferecendo, em troca, um conjunto de condições
e serviços necessários à existência material (hospitais, escolas, órgãos de
segurança, justiça etc). Deus, nosso Pai, nos oferece a vida para que sejamos
felizes, respeitando e promovendo a felicidade do próximo.
César quase sempre impõe e o não atendimento às suas determinações se faz
acompanhar, imediatamente, de medidas punitivas diversas. Deus propõe, convida à
livre adesão às Suas leis que, seguidas, nos felicitam com a alegria e a paz e,
desrespeitadas, quando permitimos a instalação da desarmonia em nós mesmos,
ainda assim, nos ajudam a sanar as nossas deficiências, conduzindo-nos para a
felicidade.
Dada a nossa posição evolutiva, nunca foi tarefa simples - nem tampouco
impossível - conciliar as duas recomendações. No passado e ainda hoje parece
aceitável para muitos estabelecer uma compartimentação que permite buscar a
vantagem imediata no dia-a-dia, mesmo lesando interesses alheios e,
supostamente, atender a Deus comparecendo periodicamente a um templo, para
acompanhar prédicas e preces, fazendo, eventualmente, alguma doação material.
Não é isso, contudo, o que a religião preconiza, sabendo-se, aliás, que as
primeiras gerações cristãs compunham-se de pessoas comuns, que tinham conduta
social exemplar vivenciando o amor a Deus e ao próximo, como recomendara o
Mestre.
Comentando aquele ensinamento, observa o Codificador, "Esse princípio é uma
conseqüência daquele outro que manda agir com os outros como quereríamos que os
outros agissem conosco. Condena todo prejuízo material e moral causado aos
outros, toda violação dos seus interesses... Estende-se ao cumprimento dos
deveres contraídos para com a família, a sociedade, a autoridade, bem como para
os indivíduos em geral."
"O Evangelho segundo o Espiritismo" (capítulo 11, itens 6 e 7).
Textos do editorial "S.Xavier" do boletim SEI - Serviço Espírita de Informações
SEI 1702, de 11/11/2000.
S.Xavier