Alteridade e Reforço Positivo
A educadora Ermance Dufaux nos esclarece que alteridade é: “O
estabelecimento de uma relação de paz com os diferentes. A capacidade de
conviver bem com a diferença da qual o outro é portador”.
Depois de duras penas estamos descobrindo que sempre convivemos com pessoas
diferentes. Assim foi há 50 anos, há 30 anos. Assim é hoje. E assim será amanhã.
Se quisermos ser felizes e produtivos, teremos que aprender a conviver com os
diferentes. E, indo mais longe, é preciso que saibamos que a riqueza da
humanidade está justamente na diversidade de opiniões e crenças. Antigamente, em
vez de analisarmos as diferenças humanas como o grande manancial da criatividade
e do desenvolvimento do ser, víamos como “o problema”.
Inclusive, por não pararmos para pensar sobre a realidade de que só convivemos
com pessoas diferentes, acreditávamos que era a atitude do outro a responsável
pela eventual dificuldade no relacionamento interpessoal. Agora a nova pedagogia
nos ensina que, como diz Ermance Dufaux, “A questão nunca é como convivemos com
o outro, mas, como convivemos com o que sentimos e o que pensamos em relação ao
outro”. Veja só: é o que “eu” penso e o que “eu” sinto que determina meu bom ou
mal relacionamento interpessoal. O lado altamente positivo desta questão é que a
“bola” do bom ou do mal relacionamento interpessoal está conosco, e não com o
outro. E esta alternativa é salvadora, pois eu não tenho capacidade para mudar o
outro, mas, se eu quiser, tenho plena capacidade para mudar minha forma de
pensar e de agir.
Há ambientes altamente conflitantes em que parte das pessoas convive muito mal e
parte convive bem. Qual é o segredo? O segredo – que não merece este nome – é
que aquela pessoa que convive bem, tem bons pensamentos e bons sentimentos. É o
que poderíamos chamar de uma pessoa “humana”. Aquela que sabe aceitar as pessoas
como são. Mesmo discordando delas.
Quando passamos a aceitar as pessoas como elas são, fica mais fácil enxergar
qualidades que antes não víamos. Quando não nos relacionamos bem com determinada
pessoa, damos ênfase às suas características negativas. Mas, se mudarmos para
melhor nossos pensamentos e sentimentos, então teremos interesse em melhor
conhecer essa pessoa. E como todo ser humano tem qualidades positivas, nossa
aproximação fará com que as enxerguemos. E enxergando essas qualidades, iremos
melhor compreender a pessoa e, por incrível que possa parecer, iremos descobrir
que temos a aprender com ela. Em conformidade com esse exemplo, uma das formas
de exercitarmos a alteridade é: conhecermos a diferença; compreendermos a
diferença e aprendermos com a diferença.
Outra forma de exercitarmos a alteridade é fazer com que toda a equipe olhe na
mesma direção. Exemplifico:
Helmut Maucher, quando Presidente da Nestlé, disse em entrevista que fazia
questão de passar pessoalmente aos seus liderados mais próximos que “(...) devem
compartilhar nossos valores, que incluem trabalho árduo, honestidade e
compromisso com a empresa. Precisam ser modestos. Devem ser pragmáticos e não
dogmáticos”. Esta preocupação em passar aos liderados o que se espera deles,
qual é a direção a seguir, nem sempre é comum nas empresas. Por exemplo, há
líderes que reclamam do problema de relacionamento na sua equipe, mas nunca
fizeram um reunião para, por exemplo, dizer: “Pessoal, tenho muito interesse que
cada integrante de nossa equipe seja solidário com o colega e que o cultivo da
amizade seja o nosso forte.”
Existe aquela frase que diz: “O que é que você não está procurando e reclama por
não achar?”. Isto é, na condição de líder, como eu posso reclamar dos problemas
de conflitos improdutivos da minha equipe, se não faço rotineiras reuniões para
reforçar o que espero de cada um dos meus liderados?
ATENÇÃO! MUITO IMPORTANTE:
Em sintonia com o estilo de liderança que foca “o pessoal” e “o resultado da
empresa”, dou a sugestão de adotar um dos discursos abaixo na comunicação com
seus liderados. É preciso que os discursos sejam sinceros. Alguns exemplos:
“O que espero de vocês é que sejam produtivos e que bem se relacionem. Pois, se
forem produtivos, mas não se relacionarem bem, a nossa convivência no trabalho
não faz sentido”.
Ou:
“O que espero de vocês é que sejam produtivos e que sejamos todos amigos. Pois,
se forem produtivos, mas se não formos amigos, a nossa convivência no trabalho
não faz sentido”.
Ou:
“O que espero de vocês é que sejam produtivos e que a afetividade faça parte do
nosso grupo. Pois, se forem produtivos, mas não se relacionarem bem, a nossa
convivência no trabalho não faz sentido”.
Obs.: Qualquer que seja o discurso a ser adotado ele precisa exalar verdade.
Isto é, jamais o discurso deve ser apenas da “boca prá fora”.
Atenção: Além de colocar seu coração enquanto fala a frase acima, é preciso
procurar vivenciar no dia-a-dia a mensagem que está passando ao seu pessoal.
Pois, de que valerá falar sobre a importância do relacionamento se o líder não
se relacionar bem com o seu pessoal? De que valerá ditar normas de conduta se o
líder não for um exemplo de boa conduta?
REFORÇO POSITIVO, IMPORTANTE TÉCNICA PARA EXERCITARMOS A ALTERIDADE
O fato de vivenciarmos a alteridade implica em sermos educadores. Pois todo bom
educador é alteritário. Portanto, a forma mais produtiva da convivência em
grupo, é nos considerarmos educadores.
Já é patente que todo bom líder é um educador e que todos bons pais são
educadores. No entanto, mesmo que ainda não sejamos líderes ou pais, é
importante também agirmos como educadores. Pois ser educador não tem a ver com
cargo ou função. Ser educador é escolha pessoal. E assim posicionando-nos, nos
colocamos como parte integrante e proativa do desenvolvimento dos grupos dos
quais fazemos parte, vivenciando a alteridade.
Mas, o que é um educador?
A resposta popular é que educador é o ser que tem por função educar as pessoas.
E este é o grande erro conceitual, já bem esclarecido pela moderna pedagogia.
O educador, que merece essa denominação, sabe que educar não é sua função. Ele
tem consciência de que não é ele que “educa”. Sabe que cabe a si a importante
função de criar ambiente favorável para a própria pessoa se auto-educar. Por
exemplo, um professor não educa seus alunos. Sua única função possível é
estimularem-nos a se auto-educarem.
Para melhor entendermos a função de um educador, pense num hábil jardineiro. Ele
aduba o jardim, planeja os canteiros, revolve a terra e, por fim, planta as
sementes no solo. Se o adubo é bom, se o planejamento foi bem feito e se a terra
foi bem preparada e irrigada, surgirá um belo canteiro, onde lindas e cheirosas
flores irão encantar o ambiente. O educador é o jardineiro. O educando é a
semente.
Não há jardineiro no mundo que consiga o milagre de fazer a semente desabrochar.
Esta função é da própria semente. Somente ela traz potencialmente essa condição.
Mas o jardineiro pode, conforme vimos, criar o ambiente ideal para ela – por si
mesma - desabrochar.
Não há líder, pais, ou pessoa no mundo que faça um ser humano crescer
interiormente. Esta função é da própria pessoa. Mas o educador pode criar o
ambiente ideal para o ser, por si mesmo, se auto-educar ou se auto-motivar (é
importante sabermos que também ninguém motiva alguém, é a própria pessoa que se
auto-motiva). Conscientes dessa realidade, podemos “sentir” o valor do reforço
positivo na convivência com o próximo. O reforço positivo é o preparo do solo do
jardim da alteridade.
A dose certa de reforço positivo.
Se o jardineiro colocar muito adubo e irrigar além do necessário, a semente
tende a apodrecer-se. Da mesma forma, o reforço positivo precisa ser usado na
dose certa, nem pouco, nem muito. O líder que elogia todos os dias seus
liderados, consegue menos resultados do que aquele que elogia esporadicamente,
pois neste caso o reforço passa a ter mais peso e valor.
Direitos e deveres.
O líder e o educador tem direitos e... deveres. E sobre esta questão reflitamos
sobre a frase que ouvi de um dos participantes de meus treinamentos: Quem tem o
direito de criticar, tem o dever de elogiar.
É comum líder e educador (que neste caso não merecem estes nomes) utilizarem-se
do seu direito, mas não do seu dever. Já ouvi pessoas dizerem: “Meu chefe
enxerga todos os meus erros, mas não vê meus acertos”.
E há chefes que em vez de aplicarem o reforço positivo, fazem o oposto: aplicam
o reforço negativo. Isto é, quando o funcionário faz algo bem feito ele diz:
“Você não fez mais do que sua obrigação. Você é pago para isto.”
Não nos esqueçamos de que o fato de aplicarmos o reforço positivo (nosso dever),
não pode anular nossa crítica (nosso direito). É fundamental que saibamos que
reforçar o positivo não necessariamente significa deixar de dizer onde a pessoa
está errando. A crítica construtiva, a crítica bem feita, sempre é bem vinda.
Reforçar o positivo significa dar ênfase principalmente aos acertos, mas, se
para maior eficácia no resultado ser necessário apontar os erros, isto deverá
ser feito.
A melhor forma de criticar alguém.
Nenhuma pessoa gosta de ser criticada. Repare que logo após a crítica, vem uma
justificativa do interlocutor. E quem justifica, explica, mas não resolve. Uma
técnica bem adequada para criticar, é a denominada “PNP”
(Positivo/Negativo/Positivo), isto é, ao necessitar criticar construtivamente
alguém: comece e termine dizendo coisas positivas; coloque a crítica entre as
coisas positivas. A seguir, um exemplo:
Primeira parte: reforçando o positivo.
“Você trabalha nesta empresa há dez anos, e sempre demonstrou ser um
profissional altamente competente. Me lembro do seu projeto para diminuir os
custos do seu setor o quanto foi útil para nossa empresa. Lembro-me também
quando há dois anos você melhorou o lay out da casa das máquinas, o que gerou
melhor produtividade”.
Segunda parte: a crítica.
Após o comentário anterior, o interlocutor abre a janela da mente, pois todo
mundo gosta de ser elogiado. Quando você perceber que a janela da mente está bem
aberta, coloque a crítica, com o peso que ela deve ter. Algo assim:
“Só que desta vez você cometeu um erro primário. Você mudou a função do seu
principal funcionário sem dialogar com ele. O seu proceder está gerando sérios
problemas no ambiente interno e a produtividade do seu grupo caiu
assustadoramente”.
Obs.: A crítica precisa ser completa, mas rápida. Pois a medida que você
critica, o interlocutor vai fechando a janela da mente, querendo justificar-se.
No entanto, antes dele justificar-se, você entra na terceira parte, a seguir.
Terceira parte: reforçando o positivo.
Nesta parte você conclui, dizendo: “Mas eu sei da sua inteligência. Tenho
consciência de sua competência. Você conseguirá dar volta por cima. Veja que
atitude você julga ser melhor adotar, para voltar ao bom ambiente interno que
você sempre primou”.
Atenção: A técnica “PNP” só funciona se você tiver o hábito de utilizar-se
rotineiramente do reforço positivo (obviamente na dose certa, sem exagero). Se
você não tiver o hábito de utilizar-se do reforço positivo, isto é, se você
elogiar apenas quando quer criticar, a técnica não funciona. Pois, quando você
começar a primeira parte da “PNP” o interlocutor não irá abrir a mente, e
pensará: “lá vem crítica!”.
Líder, o caçador de acertos.
A Talent é uma agência de propaganda que criou frases memoráveis como “Não é
nenhuma Brastemp”, “A diferença é que o Estadão funciona”, “Bonita camisa,
Fernandinho”, dentre outras. À frente dessa agência há um líder especial, Júlio
Ribeiro. É imensa sua capacidade de criar um ambiente interno altamente
favorável. No seu livro Fazer Acontecer, Editora Cultura, Júlio Ribeiro nos diz
que todo líder precisa ser um caçador de acertos. Leia seu recado: “Não se
esqueça de ser sempre um caçador de acertos, não de erros. É tolice apontar
constantemente os erros da equipe, esperando que com isso ela não erre mais. É
melhor estimular os acertos, para que o grupo fique desejoso de acertar sempre.
Uma equipe assustada, em vez de tentar fazer o que é o melhor para resolver os
problemas da empresa, passa a tentar adivinhar aquilo que o cliente quer. Quando
a equipe sabe que o seu trabalho é apreciado, passa a trabalhar bem, por simples
satisfação pessoal. É quando fica até a madrugada para tentar uma solução
melhor; é quando negocia uma vez mais um plano de mídia para conseguir condições
que nem o cliente esperava; é quando fica alegre por alguém ter gostado do
trabalho criativo”.
Um mestre no uso de palavras positivas.
O dentista Dr. Tom Mcdougal é um mestre no uso de palavras positivas. Ele diz:
“mudança de horário” em vez de “cancelamento”; “sala de recepção” em vez de
“sala de espera”; “combinar o tratamento” em vez de “pagar”; “esvaziar a boca”
em vez de “cuspir”; “preparar o dente” em vez de “passar o motor”; “pequena
picada” em vez de “injeção”; “sentirá um certo desconforto” em vez de “sentirá
dor”.
Muitas vezes não nos preocupamos em escolher as palavras certas na conversa com
o próximo. E colocar a palavra certa é fundamental, pois só assim poderemos nos
ver como educadores e comunicadores. Imagine um pai que, querendo que o filho
tenha melhor redação, diz a ele: “Você já estudou onze anos para escrever esta
porcaria?! No meu tempo eu trabalhava e estudava, você só estuda e nem sabe
escrever!!!”
Será que este pai comunicou-se com o filho? Não. Este pai desabafou! E desabafo
não é comunicação. É verdade que nenhum ser humano consegue ter controle
emocional em 100% do seu tempo. Assim, é normal errarmos na comunicação em 10
dias por ano. É normal de vez em quando desabafarmos, em vez de comunicarmo-nos.
Mas não podemos errar em 350 dias do ano!
Se quisermos ser comunicadores e educadores, precisamos ter especial cuidado na
escolha das palavras que saem de nossa boca.
Alkindar de Oliveira