A Música e a Mediunidade
Na Terra a sinfonia é a forma mais alada da música. Quando ela
se une às palavras, assemelha-se à Vitória áptera, que rastejava sem poder
levantar vôo e planar no alto. A música, ligada a palavras, perde um pouco de
sua atração e de sua amplitude. No entanto a melodia nos acalenta, nos deleita,
nos encanta; ela grava em nossa mente motivos que gostamos de repetir e que nos
consolam das tristezas de cada dia. Porém essa música parece bastante pobre se
comparada às harmonias do espaço; para compreendê-las e experimentá-las, é
necessário que se possuam sentidos psíquicos bastante desenvolvidos.
Vimos mais de uma vez, nas sessões, lágrimas rolarem sobre a face de alguns
médiuns, que percebiam os ecos da sinfonia eterna.
O médium G. Aubert, apesar de ignorante em música, em completo estado de
automatismo toca no piano sonatas, árias inéditas e variadas, nas quais
reconhecem-se Beethoven, Bach, Chopin, Berlioz, etc. A maioria dos compositores
afirma que ouve nas horas de recolhimento vozes, sons, que não provêm da Terra.
Durante as célebres sessões dirigidas por Jesse Schefard, médium escocês, em
todas as grandes capitais e diante de várias cortes soberanas, da mesma forma
que nas do dr. San Angelo, em Roma, ouviam-se coros celestes e acordes de
numerosos instrumentos invisíveis. Solos permitiam que se reconhecesse a voz de
cantores ou cantoras, já falecidos.
A sra. de Koning-Nierstrass descreve uma de suas sessões nos seguintes termos:
"J. Schefard ficou hospedado em minha casa, em Haye, durante cerca de seis
semanas. Uma noite eu e alguns amigos estávamos reunidos. Tendo o médium se
levantado em meio-transe, pôs-se ao piano. Rappings (batidas) ressoaram por
todos os lados, luzes adejavam no cômodo como borboletas. De repente vozes de
homens e de mulheres encheram o ar. Era um coro que cantava uma espécie de
cântico; a Hosana e Glória a Deus foram ouvidos por todos nós. Ora era um coro,
ora vozes de mulheres, o soprano dominando todo o canto. Sentada próxima ao
médium, constatei que ele não havia aberto a boca. Dois dias após, uma de minhas
vizinhas me diz:
– Ah! Desfrutei do lindo concerto que houve uma noite em sua casa; que músicos,
e que belo coral fizeram-se ouvir!
"Perguntei-lhe:
"– A senhora ouviu uma voz de cada vez ou um coro?
"– Um coro – respondeu a senhora –; eu distinguia bastante distintamente o
soprano. Quem é que cantava tão maravilhosamente? "
Esse testemunho espontâneo destruía qualquer hipótese de alucinação. A respeito
da música dos espíritos, lê-se na introdução de Ensinos Espiritualistas, de
Stainton Moses, professor na Universidade de Oxford, a descrição de fenômenos
obtidos numa sala desprovida de piano, violino ou qualquer outro instrumento.
"Um som se produzia, excessivamente difícil de ser descrito. Assemelhava-se ao
suave som de um clarinete, aumentando de intensidade e novamente diminuindo,
descendo à primeira emissão abafada, às vezes também apagando-se em um longo
lamento melancólico. Não tendo jamais ouvido nada que se aproximasse desse som
realmente extraordinário, não posso dele dar senão uma descrição bastante
insuficiente: é importante observar que obtemos apenas notas isoladas, e na
melhor das hipóteses, cadências isoladas. Os agentes invisíveis atribuíam esse
fato à organização antimusical do médium."
Por outro lado, lê-se em Light, de 30 de abril, os seguintes relatos, que
mostram outra modalidade dessas manifestações, obtidas à cabeceira de moribundos
e percebidas por outros assistentes.
"Muitos livros foram escritos a respeito das visões dos moribundos e dos
acontecimentos extranormais observados no momento da morte. Dentre os mais
interessantes casos, pode-se citar o do pequeno cativo do Templo: Luís XVII.
Beauchesne conta que poucos instantes antes da morte do jovem príncipe
perguntaram-lhe se sofria muito.
"Ele respondeu:
"– Sim, sofro, mas não muito; a música é tão linda.
"Fizeram-lhe perguntas a respeito dessa música que ninguém ouvia, porém ele
insistia em dizer:
"É linda, eu a ouço! – e admirou-se por ninguém mais a ouvir.
"Há também o caso de Jacob Boehme, cuja partida da Terra foi acompanhada da mais
suave harmonia que ele apenas ouviu e proclamou sublime. Para Goethe, ao
contrários, os sons que percebia em seu leito de morte, quando ele exclamava:
“Luz, mais luz ainda!”, foram ouvidos por aqueles que se encontravam perto dele.
"Chegam-nos de toda parta da Inglaterra relatos dessas harmonias do Alto,
ouvidas por moribundos e freqüentemente por aqueles que os assistem.
"A sra. Leaning nos escreve: “Quando Lily Sewell morreu, sons harmoniosos foram
ouvidos, parecendo provirem de um canto do quarto, e isso durante os dois dias
que precederam sua morte. A criança não ouvir nada, mas seus pais, sua irmã e a
empregada os perceberam, e no terceiro dia, quando a criança morreu, o som
tornou-se mais suave, tornou-se semelhante ao de uma harpa eólica, saiu do
quarto, passou pela casa e afastou-se gradualmente”
"Um professor de Eton, na Inglaterra, em 1881, em um momento em que se
encontrava perto da mãe, ouviu, alguns minutos após a morte desta, uma suave
música de três vozes infantis cantando um hino de forma tão penetrante que
nenhum ser humano teria podido fazê-lo. Duas pessoas presentes, e o médico que
lá se encontrava, ouviram-na igualmente e abriram uma janela para ver se
descobriam de onde provinham aqueles sons maravilhosos.
"O dr. Kenealy conta assim a morte de seu jovem irmão: “Seu quarto dava para uma
grande e bonita vista, cercada por verdes colinas. Perto de seu leito várias
pessoas da família encontravam-se sentadas, assim como também o médico; era uma
voz melancólica e celeste de mulher, cujos tons não podem ser descritos. Isto
durou vários minutos; em seguida, fundiu-se, como as sinuosidades das ondas
sobre a areia, ora ainda ressoando, ora mal murmurando; em seguida veio o
silêncio. Quando o canto começou, a criança entrou em agonia e no último
murmúrio sua alma partiu!”
"Enfim anotamos o caso descrito por H. Rooske, de Guilford: “Há alguns anos
minha irmã e eu tivemos uma experiência que nos serviu de grande conforto na
vida. Nossa mãe encontrava-se perigosamente doente; o médico e a governanta
sabiam que seus sofrimentos chegavam ao fim. Uma noite em que minha irmã velava
por ela com a governanta, ouviu de repente o mais lindo, o mais majestoso dos
coros, cantado por vozes tão celestes como ela jamais ouvira. Virando-se em
direção à governanta, perguntou-lhe: `A senhora está ouvindo?' `Não estou
ouvindo nada', foi a resposta. Eu havia me deitado em um cômodo contíguo,
esgotado pelas longas vigílias e por cruéis inquietações; os sons celestes
despertaram-me de um sono profundo, saltei da cama e corri ao quarto de minha
mãe perguntando: `De onde vem essa música maravilhosa?' Repentinamente os sons
cessaram, e aproximando-nos do leito percebemos que a doce alma havia partido
com a divina harmonia.”
Vê-se, através destes fatos narrados, e como as lições do Esteta afirmam, que o
poder das vibrações sonoras revela-se sob mil formas. À medida que o homem vai
penetrando no conhecimento do universo e de sua estrutura íntima, a lei que o
rege, que é a da harmonia musical, aparece-lhe em seu princípio assim como em
seus maravilhosos efeitos. É através dela que é edificada e perpetuada toda a
arquitetura dos mundos, todas as formas da vida universal. Podemos perceber isto
através de uma simples experiência. Não é curioso, por exemplo, seguir sobre uma
placa de vidro ou de metal salpicada de areia, e posta em contato com um
instrumento de corda, as formas geométricas, os delicados e complicados desenhos
que resultam de cada nota e de cada acorde?
No estudo da arte não nos devemos deixar desgostar por causa de uma aridez
aparente e superficial. O exame atento, a firme análise de todo tema estético,
revela-nos atrativos insuspeitáveis e contribui para nossa iniciação à lei geral
do belo. Pode-se comparar esse exercício mental à escalada de uma montanha de
aspecto rude e íngreme, mas onde cada sinuosidade de terreno contém maravilhas
ocultas e de cujo altaneiro cume descobrimos o conjunto harmônico das coisas que
se descortinam ao nosso olhar.
Todo homem pode e deve interessar-se por essa questão, pois ela reserva alegrias
intelectuais bastante superiores a tudo o que os falsos prazeres lhe dão.
O mais humilde operário possui em seu pensamento uma possível via em direção à
compreensão do belo, e lá encontrará recursos sempre novos para o
aperfeiçoamento de sua própria obra. A arte da profissão é uma preparação para
uma arte superior. Cada um trabalha um tipo particular de beleza, porém dentro
de sua finalidade de ascensão todas as almas desabrocham numa radiosa concepção
da universal e eterna beleza.
A dissociação da matéria, o jogo das forças intra-atômicas fazem nasceu uma nova
ciência que se desenvolvendo abre para o espírito humano mais amplas
perspectivas sobre a obra do cosmo.
Reconhecer-se-á em breve o misterioso laço que une o pensamento, a vontade, à
vibração, e que faz desta o agente daquelas a fim de se constituírem as formas
inumeráveis que povoam a imensidão.
Em resumo, o som, o ritmo e a harmonia são forças criadoras. Se pudéssemos
calcular o poder das vibrações sonoras, medir sua ação sobre a matéria fluídica,
seu modo de agrupar os turbilhões de átomos, penetraríamos em um dos segredos da
energia espiritual.
No entanto, ao menos é preciso que observemos, na experiência que acabamos de
citar, as figuras geométricas traçadas pela voz humana ou pelo arco de um
violino sobre a placa de vidro recoberta por areia fina, para compreendermos,
por comparação, como o pensamento divino, que é a vibração mestra e a suprema
harmonia, pode agir sobre todos os planos da substância e construir as colossais
formas das nebulosas, dos sóis, das esferas, e fixar-lhes a trajetória através
dos espaços.
O espetáculo da vida universal mostra-nos por toda parte o esforço da
inteligência para conquistar e realizar o belo. Do fundo do abismo da vida o ser
aspira e sobe em direção ao infinito das concepções estéticas, à ciência divina,
à perfeição eterna, onde reina a beleza perfeita. O esplendor do universo revela
a inteligência divina, assim como a beleza das obras de arte terrestres revela a
inteligência humana!
Leon Denis