Uma Classificação de Kardec
No Vocabulário Espírita, constante de O Livro dos Médiuns*
(capítulo XXXII), Allan Kardec classifica mediunato como missão providencial dos
médiuns, em nome dado pelo Espírito Joana D’Arc (capítulo XXXI, mensagem XII,
página 425 do mesmo livro acima referido), onde há um alerta sobre os perigos
dos elogios, felicitações ou adulações dirigidas aos médiuns. A mediunidade está
relacionada com a dedicação ao bem e amor ao próximo, em sua mais alta
expressão, na conquista da humildade e da convicção de serem instrumentos dos
espíritos benfeitores para o amparo aos necessitados, seja na área de
assistência espiritual em seu amplo sentido ou na área da produção intelectual,
por exemplo. Quando surge o fanatismo de se auto-intitularem dotados de missão
especial, escolhidos ou privilegiados, instala-se a obsessão (1) no grau
classificado pelo Codificador como fascinação.
O próprio Codificador elaborou três capítulos importantes, entre outros, na
questão da participação do médium na ocorrência dos fenômenos, no mesmo livro
citado no parágrafo anterior: o capítulo XIX – Papel dos Médiuns nas
Comunicações Espíritas, o capítulo XX – Influência Moral do Médium e o capítulo
XXI – Influência do Meio. Destacamos aos leitores, porém, preciosa página da
Revista Espírita (2), de julho de 1863, página 213. Trata-se de comunicação
assinada por Dante (3), que de maneira bem simples e objetiva define o objetivo
da mediunidade, bem como classifica a mediunidade correta, nos padrões
apresentados pela Doutrina Espírita. Transcrevemo-la parcialmente:
“Os médiuns e os espíritos
Ninguém poderá tornar-se bom médium se não conseguir despojar-se dos vícios que
degradam a humanidade. Todos esses vícios se originam no egoísmo; e como a
negação do egoísmo é o amor, toda virtude se resume nesta palavra: Caridade.
(...) Deus não só a gravou de modo indelével no coração do homem, mas a
sancionou por seu próprio fato, dando-nos o seu Filho por modelo de caridade e
de abnegação. Se ele deve ser o guia de cada um, seja qual for a sua condição
social, é sobretudo a condição sine qua non de todo bom médium. Todo homem pode
tornar-se médium; mas a questão não é ser médium; é ser bom médium, o que
depende das qualidades morais. (...).O objetivo de nossa missão é a vossa
melhora moral e o vosso dever é igualmente o vosso melhoramento. Mas não
espereis melhora de qualquer sorte sem a caridade.”
Atenta leitura do trecho indica que os equívocos na vivência mediúnica
originam-se no desconhecimento de seu nobre objetivo: instrumento de instrução e
amparo do plano espiritual em favor das criaturas humanas. E como o objetivo é
nobre, o meio utilizado e ensinado pelo Espiritismo é a caridade. Esta, segundo
os espíritos (4), é benevolência para com todos, indulgência para com as
imperfeições alheias, perdão das ofensas. Ora, seu uso na mediunidade, para
transformação desta no mediunato, requer adesão e vivência daquelas virtudes. O
mediunato, conforme definição do próprio Kardec, é missão providencial dos
médiuns em favor do esclarecimento humano, para libertação de vícios e defeitos
e crescimento moral, objetivo da Doutrina Espírita.
A dificuldade toda está na renúncia ao egoísmo que caracteriza o comportamento
humano. Porém, exemplos notáveis – alguns ainda encarnados no planeta – vivem o
apostolado do amor em favor da humanidade, como verdadeiros parâmetros a serem
seguidos. Confundida, mesmo entre os próprios espíritas, como prática de
curiosidade ou mero contato social com os espíritos, à mediunidade está
reservada a sublime missão educativa dos sentimentos humanos, para promover a
melhora moral do planeta. Os ensinos trazidos através dela, sua permanência
entre nós, os registros históricos de sua influência em toda a história humana e
as bênçãos que ela nos proporciona revelam ainda mais a Bondade Divina, que
apenas aguarda a decisão ou iniciativa humana de promover o bem e o progresso em
toda parte. E a mediunidade é valioso instrumento desta ação, através de médiuns
estudiosos, dedicados e compromissados com o dever de servir à nobre causa de
Jesus, o Mestre da Humanidade. Principalmente através da sublime virtude da
humildade.
*49ª edição IDE – Instituto de Difusão Espírita – de Araras-SP, de junho de
1999, tradução de Salvador Gentile.
(1) Vide capítulo XXIII de O Livro dos Médiuns.
(2) Edição da EDICEL – Editora Cultural Espírita – São Paulo(SP), de 1965,
tradução de Júlio Abreu Filho.
(3) Selecionada por Kardec de um jornal publicado em Palermo, na Sicília, em
italiano, com o título O Espiritismo, jornal de Psicologia experimental.
Referida comunicação foi obtida na Società Spiritista di Palermo.
(4) Questão 886 de O Livro dos Espíritos.
Orson Carrara