Filigranas de Luz

Inclina teu ouvido, meu amigo, e escuta a melodia da terra, derramando a música da fartura!
A cana de bambu, esvaziada de vida, também se dobra em busca do chão, para enriquecer-se de melodia.
O teu pequeno sofrimento de soledade se mistura ao infinito sofrimento de soledade do mundo.
E enquanto aos teus ouvidos não chegue a acústica da grande dor, a tua dor não romperá a concha da acústica da felicidade de todos...
Toma da vara de bambu e sopra nela, qual uma frauta, e deixa que teu campo de tristeza cante a tua dor, na tristeza de todas as dores que não podem cantar!
E enche... enche com a melodia que teus ouvidos captem da abundância do chão, o vazio do teu coração deserto...
E verificarás, atônito, que o amor, quanto mais se doa mais se enriquece, e quanto mais se esvazia mais se embebeda de amplidão...
Encontrei-te um dia, amigo, e pediste para que eu cantasse.
A minha voz se perdia na sinfonia da Terra em festa, e eu não podia cantar!
Chamaste-me "amigo", e a voz da tua melodia deu melodia à minha voz, para que eu te chamasse "irmão".
Acompanhei com os olhos a abelha, ébria de zumbido, no festival sonoro que a Natureza cantava!
E a vi avançar em redemoinho de festa até a última flor de lótus, que derramava perfume.
Avancei precípete e arranquei a débil mensagem da vida perfumada, e saí a procurar-te, amigo, para recolher nas pétalas mimosas as tuas lágrimas, como o orvalho de um irmão, na intimidade da terra que nos dava o lótus, como a fartura no seu seio maternal.
E por isso, agora que o outono não mais nos pode atender, deixa-me segurar-te a mão, para cantar contigo, na tristeza do nosso caminho, a sinfonia da esperança, como abelhas do trabalho, embriagadas, na primavera, no festival das alegrias!


Rabindranath Tagore