Maremoto: Lição ou Castigo?

A revista “VEJA”, em sua edição de 05 de janeiro de 2005, traz uma reportagem sobre o acontecimento que abalou a Humanidade com o maremoto do Oceano Índico, atingindo parte do litoral asiático e africano, ceifando a vida física de milhares de seres humanos.
A notícia da referida revista assim se inicia: “É próprio do instinto da espécie buscar um sentido para desastres naturais diante dos quais o homem se sente pequeno e indefeso. Na antiguidade, terremotos, erupções vulcânicas, furacões e pestes eram vistos como punições enviadas por divindades iradas.”
Graças aos ensinamentos da Doutrina Espírita, trazendo-nos o Cristo redivivo em toda a sua originalidade e grandeza, sabemos que nosso Criador se posiciona como “Pai Nosso” e não carrasco da Humanidade, capaz de castigar e exigir os mais horrorosos sacrifícios animais e humanos que lhe aplacassem a ira.
Em “O Livro dos Espíritos”, na questão 737, Kardec indaga com que objetivo Deus atinge a Humanidade por meio de flagelos destruidores. Respondem os Espíritos Superiores que é com a intenção de fazer avançar mais depressa essa mesma Humanidade, alcançando através dos flagelos uma ordem melhor das coisas em apenas alguns anos em aspectos que demandariam séculos. Consultar a questão de número 728 do livro citado.
Vão mais além os Espíritos participantes da Codificação quando na questão de número 739 de “O Livro dos Espíritos”, explicam que os flagelos modificam o estado físico de uma região para melhor, mudança essa que só é percebido pelas gerações futuras.
Dessa maneira, podemos entender que não somente o progresso moral é apressado pela dor da perda presente, mas também o progresso no seu sentido material, que na maioria das vezes escapa de nossa compreensão extremamente limitada pela visão da vida contida nos estreitos limites do berço ao túmulo.
Com a tragédia do maremoto no Oceano Índico, vemos países que despejaram bombas sobre o Afeganistão e o Iraque irmanados no sentido de socorrer os povos atingidos por tal calamidade. Foi preciso a dor, a perda momentânea de tantas vidas no seu sentido material, para que a fraternidade aflorasse acima das armas de guerra e dos sentimentos de orgulho e vaidade, autores dos conflitos fratricidas muito mais lamentáveis sob o ponto de vista moral para toda a Humanidade.
Na questão de número 738, pergunta Kardec em “O Livro dos Espíritos” se Deus não poderia empregar, para o aprimoramento da Humanidade, outros meios senão os flagelos destruidores.
Respondem os Espíritos: “Sim, e o emprega todos os dias, visto que deu a cada um os meios de progredir pelo conhecimento do bem e do mal. É que o homem não o aproveita; é preciso castigá-lo em seu orgulho e fazê-lo sentir sua fraqueza.”
Creio que com os conhecimentos proporcionados pela própria Doutrina, em nossos dias o termo “castigá-lo” poderia ser traduzido por “educá-lo”.
De posse do livre arbítrio e com os meios de distinguir o certo do errado, o mal do bem, o que temos feito em nossa política que deveria sempre governar pelo bem da maioria; com as crianças vítimas dos abusos sexuais; com os crimes impunes; com a desonestidade; com a corrupção; com a convivência no lar; com as nossas esposas e filhos; no trânsito, e vai por aí a fora até onde a imaginação de cada um queira questionar.
Apesar de dois mil anos de cristianismo, continuamos como maus alunos que necessitam aprender a lição da jornada evolutiva, e se teimamos em não ouvir a professora chamada amor, que convida, sofremos a visita da professora chamada dor, que intima à renovação.
Não fosse pelos ensinamentos proporcionados pela Doutrina dos Espíritos e seríamos arrastados à indignação pelas explicações absurdas de que Deus salvou alguns do maremoto no Oceano Índico e deixou milhares morrerem, como se houvessem preferidos e esquecidos perante o Pai de Amor que não faz distinção, mas dá a cada um segundo as suas obras.
Levantar hipóteses sobre os motivos das desencarnções em massa, ocorridas nessa tragédia, teria somente fim especulativo, porque não temos o devido conhecimento de causa do existir, em toda a sua amplitude, de cada vítima.
Uma coisa é preciso ficar muito claro: o Deus que nos criou, ao contrário do deus criado pelos homens, jamais recorre ao castigo, porque o Amor é incompatível com o ódio.
Recebemos, sim, lições que temos necessidade no atual estágio evolutivo em que nos encontramos, porque educar os filhos é função do pai que ama e deseja, ardentemente, que alcancemos a perfeição possível de ser atingida para sermos felizes para sempre...


Ricardo Orestes Forni - O Clarim