Segundo a Carne
Para quem vive segundo a carne, isto é, de conformidade com os
impulsos inferiores, a estação de luta terrestre não é mais que uma série de
acontecimentos vazios.
Em todos os momentos, a limitação ser-lhe-á fantasma incessante.
Cérebro esmagado pelas noções negativas, encontrar-se-á com a morte a cada
passo.
Para a consciência que teve a infelicidade de esposar concepções tão escuras não
passará a existência humana de comédia infeliz.
No sofrimento, identifica uma casa adequada ao desespero.
No trabalho destinado à purificação espiritual, sente o clima da revolta.
Não pode contar com a benção do amor, porquanto, em face da apreciação que lhe é
própria, os laços afetivos são meros acidentes no mecanismo dos desejos
eventuais.
A dor, benfeitora e conservadora do mundo, é-lhe intolerável; a disciplina
constitui-lhe angustioso cárcere e o serviço aos semelhantes representa pesada
humilhação.
Nunca perdoa, não sabe renunciar, dói-lhe ceder em favor de alguém e, quando
ajuda, exige do beneficiado a subserviência do escravo.
Desditoso o homem que vive, respira e age, segunda a carne ! Os conflitos da
posse atormentam-lhe o coração, por tempo indeterminado, com o mesmo calor da
vida selvagem.
Ai dele, todavia, porque a hora renovadora soará sempre ! E, se fugiu à
atmosfera da imortalidade, se asfixiou as melhores aspirações da própria alma,
se escapou ao exercício salutar do sofrimento, se fez questão de aumentar
apetites e prazeres pela absoluta integração com o "lado inferior da vida", que
poderá esperar do fim do corpo, senão sepulcro, sombra e impossibilidade, dentro
na doite cruel ?
Emmanuel